O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, afirmou hoje que o Brasil tem “muito a aprender” com o modelo português de descriminalização de drogas. Para ele, o país abordou o tema de forma corajosa, a partir de duas perspectivas: uma que diz respeito a um problema de saúde pública e o outro a segurança pública.
“No Brasil hoje, nós damos ênfase, quase que absoluta, ao aspecto de segurança pública. Tanto o uso quanto o tráfico de drogas é um problema de segurança pública. Portugal, em um momento a meu ver de grande lucidez, fez essa diferenciação”, afirmou Lewandowski. “Reconheceu (Portugal) que o problema das drogas é, talvez predominantemente, um problema de saúde pública. Então coloca a prevenção à frente da repressão”.
“É claro que o tráfico tem que ser reprimido, com muita energia. Mas o uso de pequenas quantidades ou até mesmo o porte pode merecer um outro tratamento que envolve uma serie de políticas públicas”, explicou.
A declaração foi dada durante evento na sede da pasta, com a participação do médico João Goulão, diretor do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (Sicad). Ele é um dos idealizadores do modelo português que descriminalizou todos os tipos de drogas.
Goulão chefia o Sicad que recebe usuários flagrados com pequenas quantidades de substâncias. A legislação portuguesa interpreta pequenas quantidades como um ilícito administrativo e os usuários são tratados como doentes ao invés de criminosos.
“Existe um abismo enorme entre a situação do Brasil presente e os avanços que foram logrados em Portugal. Portugal tem uma lei que descriminalizou a droga, todos os tipos de drogas, portanto, a partir disso é possível fazer uma política social de prevenção e, eventualmente também, de repressão fazendo essa distinção entre usuário e traficante”, afirmou Lewandowski.
Ele passou a manhã desta terça no Supremo Tribunal Federal (STF), na companhia de Goulão, que falou aos ministros da Corte sobre a experiência portuguesa com a descriminalização.
Ao falar sobre o Brasil, o ministro Lewandowski avalia que a discussão avançou “muito pouco” em relação ao tema.
“Nós caminhamos muito pouco. O que nós temos de concreto é uma decisão do STF relativa apenas à cannabis, ao porte de 40 gramas de cannabis, as outras drogas foram excluídas”, comentou.
“Essa decisão do STF provocou uma reação enorme do Congresso Nacional, que imediatamente se mobilizou — hoje nós temos um Congresso eminentemente conservador no sentido de apresentar uma emenda à constituição que proibindo o uso de qualquer tipo de droga. Essa questão não avançou”, complementou.
Em junho, o STF conclui o julgamento sobre a descriminalização do porte de maconha no país para uso pessoal. A Corte estabeleceu que a pessoa com até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas não será punida com sanções penais, mas a droga será apreendida e a pessoa ficará sujeita a sanções administrativas, como medidas educativas ou advertência. A lei atual, de 2006, já previa a aplicação dessas medidas, mas não definia uma quantidade objetiva para estabelecer quem poderia ser considerado apenas usuário.
