Paulo Portas, no seu comentário habitual de domingo à noite, disse não existirem elementos suficientes para “uma previsão tão negativa” por parte de Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, que esta semana veio alertar o Governo para a possibilidade de o país regressar a uma situação deficitária em 2025, com um défice de 0,1% do PIB.
Portas destaca que a posição do Governador é “inédita”, já que o Governo “prevê que no próximo ano haja um superávit de 0,3%”. “Esta posição é diferente da que teve a Comissão Europeia, o FMI, a OCDE, a UTAO, o Conselho de Finanças Públicas e, portanto, nesse sentido, a posição do Governador é inédita”.
“Eu, como acho que Portugal tem uma adição antiga e perigosa a défices, não acho com certeza que 0,1 seja nenhum caso de transtorno, mas há um dano reputacional entre fazer um caminho de superávit ou ir para défices”, constata o comentador.
No mesmo tema, Paulo Portas referiu ainda que a posição do Banco de Portugal – que prevê também que a dívida portuguesa caia muito mais rápido no próximo ano – é “estranha”. “Se a dívida vai descer mais do que o Governo diz e vai descer vários pontos mais, segundo o Banco de Portugal, se não há alterações no emprego e no desemprego, e se não há detalhes sobre a receita e a despesa, como é que é possível haver um gap de 0,4?”, questiona-se.
Portas considera ainda que “objetivamente os dados não apontam para esta previsão mais negativa”. “Se me dissesse, vem uma recessão na Europa, isso acreditaria, porque nós temos um nível de despesa tão rígido que não conseguimos aguentar uma queda do crescimento e da receita”. “Mas não é o caso, ele prevê que nós vamos crescer mais, que a dívida vai descer mais e, portanto, não há elementos suficientes, a meu ver, para sustentar uma previsão tão negativa”.
“Elon Musk não quer uma guerra comercial com a China, Mas Xi Jinping está a prepar-se para ela”
No panorama internacional, Paulo Portas expôs uma verdade pouco sabida relativamente à dependência que a Tesla, de Elon Musk, tem com a China. É que metade dos veículos da marca do homem mais rico do mundo são feitos no país de Xi Jinping. “Os Tesla estão em perda de mercado na China, que é o segundo mercado mais importante para Elon Musk”, refere o comentador, apontando para uma grande necessidade que o também dono do X enfrenta.
Musk depende, “como de pão para a boca”, “de uma autorização por parte do governo chinês para poder fazer os táxis e os carros não tripulados, ou conduzidos por inteligência artificial”. “Os chineses já deram à Huawei e à BYD, mas não deram a Musk. E ele não quer outra coisa”.
Musk, de resto, foi um dos grandes apoiantes de Trump na corrida presidencial deste ano e irá agora chefiar um departamento de eficiência do novo governo que tomará posse em janeiro. Ao mesmo tempo que a Tesla depende de fornecimentos da China” para conseguir que as suas fábricas nos Estados Unidos façam a assemblagem de algumas das suas unidades”, a China, por seu lado, “pretende concorrer diretamente com ele, e portanto subsidiar elevadamente, o negócio do Starlink”, afirma Paulo Portas.
Assim, Trump tem como conselheiro – “talvez um dia como adversário, porque é provável que choquem” – , “um homem cujos interesses são muito dependentes da China”. A China é, de resto, o “teste verdadeiro à política externa e económica de Donald Trump”. O presidente eleito convidou, aliás, Xi Jinping para a sua tomada de posse, dando “a ideia de que ele quer uma espécie de celebração mundial da sua reeleição”. Mas, até ao momento, não obteve qualquer resposta.
“O que eu sei é que Elon Musk não quer uma guerra comercial com a China, porque senão é ele um dos principais prejudicados”, prossegue Portas, destacando que, “aparentemente a China está a preparar-se para essa guerra”. Com que armas? “Só para ter uma noção, os Estados Unidos já tarifam os carros elétricos da China em 100%, portanto custam o dobro. Agora ponha-lhe 60% e veja onde é que isto vai do ponto de vista da escalada”.
Europa irá atravessar novo dilema sobre refugiados
No programa “Global”, Portas voltou a analisar a queda do regime de Bashar al-Assad, vincando que o acontecimento levou milhares de refugiados sírios a tentar regressar, especialmente através da Turquia. Contudo, Portas alertou para o encerramento progressivo das portas na União Europeia para novos pedidos de asilo, uma tendência que considera “compreensível” face ao receio de um novo êxodo caso a situação na Síria se degrade. “Parece-me uma medida justificada neste sentido”, afirmou, referindo-se à suspensão de pedidos de asilo por parte de cerca de 10 países europeus.
Ainda assim, é necessário um equilíbrio ético na forma como a UE lida com os refugiados, apontou. “O que já não parece um discurso que torne a Europa legível fora dela é que se tratem as pessoas da mesma maneira que se tratavam com o regime de Assad. E, portanto, deportem-se agora que há uma mudança de regime”, afirmou.
Portas destacou ainda que a Europa aprendeu lições importantes com a crise migratória de 2015, que viu milhões de refugiados atravessarem as suas fronteiras. Hoje, refere, há uma preocupação crescente com a gestão de um “efeito de atração”, uma política de portas abertas que, segundo o comentador, não é sustentável.
“Objetivamente, o que a Europa aprendeu com a crise de 2015 é que não pode ter uma política de portas demasiado abertas”, sendo, o presidente turco Recep Erdoğan, “que tem muito mais sírios no seu território do que a Europa, e que a Europa paga para que fiquem na Turquia e não passem a fronteira”. “Esse fez um discurso, eu diria, mais sedutor para aqueles que quer enviar de volta para a Síria, que é dizer, eu vou abrir um corredor especial para sair e vou incentivar as saídas”. “É um discurso diferente, é um dos seus objetivos principais”.