Portugal deverá ser o primeiro país a legislar para impor uma moratória sobre a actividade mineira no fundo do mar: cinco propostas que prevêem interditar a mineração pelo menos até 1 de Janeiro de 2050 vão a discussão nesta quinta-feira na Assembleia da República, e há bastante consenso nos textos apresentados pelo PSD, PS, Livre, Bloco de Esquerda e PAN.

“Prevêem todas o mesmo tipo de alteração na lei de ordenamento de espaço marítimo, têm todas a mesma data, portanto não vemos razão para que qualquer uma chumbe”, comentou ao PÚBLICO Catarina Abril, da Sciaena, uma organização ambientalista focada no ambiente marinho.

Na proposta do Livre, “há ainda a perspectiva de poder alargar o prazo da moratória por mais dez anos, para lá de 2050”, salientou a deputada Isabel Mendes Lopes. “Espero que as propostas sejam aprovadas na generalidade e desçam à comissão para serem articuladas numa proposta conjunta para ser votada rapidamente e se tornar lei”, declarou.


Há bastante unanimidade de que sairá daqui uma lei



Hugo Oliveira


“Acredito que se queira pedir alguns contributos escritos no processo de especialidade, mas não estou a ver a necessidade de, num contexto de grande consenso, atrasarmos o processo”, comentou o deputado socialista Miguel Costa Matos. A legislação da moratória poderá estar pronta dentro de “dois, três meses”, previu.

Cinco partidos estão agora de acordo para não deixar avançar a exploração mineira em águas portuguesas. “Hoje não há ainda conhecimento suficiente do impacto, tanto económico, como ambiental, da mineração em mar profundo. Há bastante unanimidade de que sairá daqui uma lei”, assegurou o deputado do PSD Hugo Oliveira.

O consenso é maior do que em Outubro de 2023, quando uma proposta do PAN foi aprovada com os votos do PS, Bloco e Livre, depois de os Açores terem aprovado uma moratória regional. Mas não avançou porque o Governo do PS caiu e houve eleições antecipadas.

Agora, Portugal pode dar um passo mais à frente. “A defesa desta moratória em águas internacionais é feita por Portugal e outros 31 países. Mas a nível nacional, nenhum país aprovou uma lei do género da que o PAN propôs”, disse ao PÚBLICO Inês de Sousa Real, do PAN.

A exploração mineira do fundo do mar é atraente porque em algumas áreas encontram-se nódulos com minérios necessários para a transição energética. Mas desconhecem-se os efeitos de levar grandes máquinas para ecossistemas que quase não foram explorados. Daí o princípio da precaução.

No caso de Portugal, há preocupação porque a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA, na sigla em inglês) emitiu três licenças exploratórias em águas internacionais mas muito próximas dos Açores a empresas da Polónia, Rússia e França. “É muito perto, julgo que cerca de 200 metros para fora da Zona Económica Exclusiva Portuguesa”, explicou Catarina Abril. Os impactos não ficariam circunscritos: entrariam pelas águas portuguesas.

A ISA tem a responsabilidade tanto de cuidar do património comum que são os fundos marinhos como de criar condições para a sua exploração. Está a desenvolver um código mineiro, e só depois as empresas poderão avançar na mineração em águas internacionais.

“Mas se uma empresa avançar, seja em que sítio for, dá um sinal verde para todas as outras, até para as que estão ao largo das regiões periféricas”, como os Açores, salienta Catarina Abril, para explicar a importância da moratória portuguesa.