A ausência de Luís Montenegro, que se fez representar por Nuno Melo em três debates (além do desta sexta, com o Livre, acontecerá domingo, 13, frente ao PAN, na SIC, e quarta-feira, 16, frente ao Bloco, na RTP, ambos às 21h00), levando Rui Tavares a retaliar e a colocar frente a frente ao líder do CDS a co-porta-voz, Isabel Mendes Lopes, marcou o arranque do debate e das desavenças entre o líder do CDS e a n.º2 do Livre.
O tema principal foi a Defesa, com Isabel Mendes Lopes a esclarecer que o Livre é pela permanência de Portugal na NATO — Rui Tavares tinha deixado uma ideia diferente no debate com Paulo Raimundo — e a tentar marcar as diferenças sobre o investimento no sector já que tinha à sua frente o ministro da tutela. Melo pediu que o porta-voz do Livre, Rui Tavares, trocasse o “fatinho de esquerdista pelo fatinho de historiador” para perceber a situação atual, e a líder parlamentar do partido respondeu-lhe que era ele quem parecia “viver em Marte”, num bate boca que incluiu Trump e os vices dos EUA e ainda uma confusão sobre Joacine Katar Moreira. Seguiram-se depois temas como habitação, parentalidade ou orçamento.
Rui Rocha e Paulo Raimundo mostraram depois as suas visões completamente diferentes sobre vários temas. Do lado da IL houve um ataque cerrado ao modelo do comunismo e ao programa do PCP, Raimundo contra-atacou com a “cartilha” liberal e até falou das apostas que perdeu sobre os temas que Rocha o confrontaria mais rapidamente. Depois houve habitação, claro, salários, impostos, saúde (com as PPP sobre a mesa e uma alusão a um slogan dos carroceis) e educação.
Quando se chegou à questão da Defesa, Rui Rocha não deixou de lembrar as posições do PCP sobre a Ucrânia, para indignação de Paulo Raimundo.
Este sábado também haverá dois debates. Às 21h00, na TVI, Pedro Nuno Santos (PS) debate com Inês Sousa Real (PAN) e, depois, às 22h00, na RTP3, estarão frente a frente Mariana Mortágua (Bloco) e Paulo Raimundo (CDU). Pode ver o calendário completo dos debates aqui.
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Tal como no ano passado, o Observador está a dar notas num “Vencedor é” — à semelhança do programa e podcast da Rádio Observador — dos debates, em que avalia quem ganhou. Assim, ao longo destes dias, um painel de avaliadores do Observador dará notas de 1 a 20 a cada um dos candidatos por cada um dos frente a frente. E explicará porquê. A média vai surgindo a cada dia, no gráfico inicial.
Alexandra Machado — Nuno Melo, ministro da Defesa que apareceu como líder do CDS, conseguiu que o debate ficasse quase metade do tempo na pasta que lhe convinha. Foram cerca de 12 minutos a discutir a defesa, o que seria o seu terreno fértil e ventos contrários para Isabel Mendes Lopes, do Livre (que ainda teve de puxar pelos galões em relação ao seu cargo no partido, face à desvalorização – completamente desnecessária– da sua presença feita por Nuno Melo). A defesa foi onde Nuno Melo esteve melhor (como era de esperar e a história da NATO é importante realçar) mas Isabel Mendes Lopes conseguiu ser mais direta sobre a posição do Livre em relação à NATO do que tinha sido Rui Tavares (especialmente no seu primeiro debate), mas não era com Rui Tavares que estava a debater. Saindo da sua área, Nuno Melo não cumpriu os mínimos, respondendo ao lado às perguntas que lhe foram colocadas, em particular no campo da habitação. Aí o Livre tinha um trunfo face ao Governo já que é sua a criação do Fundo de Emergência para a habitação que está por regulamentar (e que Nuno Melo garantiu que estava em fase de conclusão – que azar para o Livre). Isabel Mendes Lopes acabou por surpreender (um pouco), apesar de não ter conseguido contrapor a afirmação do oponente quando disse que o Livre viabilizou dois terços das propostas do Chega. Nuno Melo foi Nuno Melo. Era preferível que o debate tivesse sido entre Luís Montenegro e Rui Tavares.
Judite França — A ausência dos líderes dos partidos foi o ponto de partida do debate entre Nuno Melo e Isabel Mendes Lopes. A troca de acusações sobre quem faltou deixou cada um no seu canto, com Nuno Melo a mostrar os galões do CDS para dizer que o partido, por ser parceiro de coligação, merece também estar num frente a frente nesta ronda de debates. O presidente do CDS aproveitou ainda para recordar que a ERC – para o qual o Livre recorreu depois da troca de Luís Montenegro por Nuno Melo – não deu razão ao partido de Rui Tavares que decidiu amuar a enviar a líder parlamentar. Depois a discussão da Defesa, deu vantagem a Nuno Melo que é ministro da pasta. E aí levantou-se a dúvida que ficou no ar no debate entre Rui Tavares e o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo: afinal, o Livre quer sair da NATO? Isabel Mendes Lopes tirou dúvidas. O Livre não quer sair do Tratado do Atlântico Norte, mas não quer os Estados Unidos por companhia. E também na Defesa, Nuno Melo voltou a mostrar os galões, ou não andasse rodeado de militares, com o tom de quem conhece os dossiês. Mas o tom sobranceiro repetiu-se e depois de desfilar um conjunto de propostas com que o Livre não concorda — desde o IRS Jovem à garantia pública —levou Isabel Mendes Lopes a soltar um audível suspiro e a contestar, com toda a paciência, ponto por ponto os ataques de Nuno Melo. E, no fim, do debate, o mais memorável será mesmo aquele suspiro.
Luís Rosa — Num debate em que o tema da Defesa e da NATO ocupou uma parte relevante do tempo, Nuno Melo, ministro da Defesa em exercício de funções, deveria ter ganho com goleada contra uma adversária completamente desconhecida do grande público. Ganhou, mas foi à tangente. Isabel Mendes Lopes começou bem nos temas da Defesa — dominou bem os dossiês, conseguiu explicar a ideia do Livre para uma comunidade europeia de defesa e explorou com eficácia o facto da AD ser Governo e não poder atacar Donald Trump de forma aberta ou explícita. Isabel Mendes Lopes só perdeu o debate por não conseguir responder aos momentos de quase André Ventura — num tom muito mais civilizado, refira-se — de Nuno Melo que atacou com eficácia o Livre porque querer o fim da NATO. O ponto não é se isso é verdade ou mentira — o ponto é que é eficaz para o eleitorado de direita e para o eleitorado moderado porque explora o anti-americanismo histórico da extrema-esquerda. Mais eficaz foi recordar o período de Joacine Katar Moreira como a cara do Livre — colando com eficácia a imagem do radicalismo que caracteriza historicamente os partidos à esquerda do PS. Uma vez mais, foi eficaz do ponto de vista político — apesar de não corresponder necessariamente à verdade porque o Livre é um partido europeísta e favorável aos investimentos na defesa e ao apoio à Ucrânia, diferenciando-se bem do Bloco e do PCP. Isabel Mendes Lopes padeceu do mesmo problema que Rui Rocha no debate com Pedro Nuno Santos: não conseguiu explicar as propostas do Livre para a habitação. O irrealismo de construir 600 mil fogos públicos a longo prazo quando em vários anos o PS e o PSD só conseguiram construir poucas dezenas de milhares de casas. Uma última nota de Nuno Melo: é perfeitamente dispensável o tom paternalista que utilizou no debate com Isabel Mendes Lopes. Nem mesmo o eleitorado conservador deve apreciar esse tonzinho — fora de tempo e fora de moda.
Rui Pedro Antunes — Quem viesse de Marte, onde ambos os debatentes se acusaram mutuamente de viver, ficaria a desejar voltar para para a aridez do deserto vermelho. Entre CDS e Livre houve um debate de suplentes, que deve ter deixado a TVI, em sinal aberto, a desesperar pelo Big Brother para que a curva de audiências voltasse a subir. Os protagonistas estavam fora do estúdio. Nuno Melo esteve sempre a atirar a Rui Tavares (“fatinho esquerdista”; ou “preterido perante Joacine”; “não conseguiu escolher entre Trump e Hillary”). E Mendes Lopes atirou a Montenegro (“deturpador de regras de debates”; “arrastou país para eleições”; “escolheu sempre a Spinumviva”). Sobre o facto de os dois, suplentes, estarem ali, Nuno Melo foi hábil a lembrar toda a história do CDS, as autarquias e as presenças no governo nacional e nos dois regionais. Mas Mendes Lopes ripostou bem: “CDS não foi eleito na última vez que foi sozinho a votos e o Livre tem quatro deputados”, o dobro dos centristas. Nuno Melo conseguiu que Mendes Lopes dissesse que “o Livre não quer Portugal fora da NATO”, que é uma contradição com o que indiretamente Rui Tavares tem dito e que a própria disse neste debate. A co-líder do Livre respondeu com as dúvidas de Montenegro e Hugo Soares em escolher os adversários de Trump em detrimento do atual presidente dos EUA. Ainda assim, Nuno Melo usou da sua experiência política para sair por cima do debate. Isabel Mendes Lopes irritou-se ao pedir para o líder do CDS não a interromper, quando na verdade trata-se de um “debate” e não dois monólogos. Por isso e porque o eleitorado do CDS, se ainda existir, é muito provável que tenha gostado de ver Melo. O do Livre deve estar desgostoso por não ver o seu líder a “malhar” em Melo.
Alexandra Machado — Paulo Raimundo apareceu surpreendentemente solto e até mais seguro de si, aproveitando até para fazer piadas, embalado (ou não) pelo que tinha sido o desempenho (menos conseguido) de Rui Rocha no debate de quinta-feira. Mas o líder do PCP saiu zangado depois de Rui Rocha o confrontar com a Ucrânia. E aqui Paulo Raimundo acabou mal. O PCP assume, assim e até mais uma vez, que é um tema que gostaria de não ver abordado (mas com isso tem de conviver, porque tem de ser confrontado com isso), tal como optou por dizer graças quando confrontados com outros regimes comunistas (que é uma tática quando não se tem resposta). Apesar destes travões de língua para Paulo Raimundo, o líder do PCP tem-se saído, este ano, melhor nos debates do que em 2024. Raimundo tem a tarefa de manter o PCP no Parlamento. Não é fácil. Rui Rocha tem a tarefa de fazer crescer a IL no Parlamento. Não é fácil. Este debate não serve para convencer ninguém. São duas visões antagónicas da economia e do papel do Estado. Não se trata aqui de avaliar os modelos de cada um dos lados. Mas o desempenho em debate. Rui Rocha precisa de treinar mais. Paulo Raimundo devia ter estudado o programa da IL (fica mal dizer que não leu ou que não sabe se está lá determinada medida). Rui Rocha não conseguiu contra-argumentar na habitação, na saúde, e até nem respondeu quando questionado diretamente sobre o benefício dos CTT privados. Esteve melhor do que em relação ao confronto com Pedro Nuno Santos, mas pelo menos esta sexta-feira conseguiu pôr algumas explicações nas compensações aos 6 mil milhões de euros de corte de impostos que a IL propõe. As contas continuam a não bater certo, mas neste campo as do PCP então são mesmo de levar o país à bancarrota (como disse Rui Rocha). Em dois mundos opostos, Raimundo apareceu mais descontraído. Rocha ainda não apareceu.
Judite França — Pode ter ganho o debate, mas perdeu uma aposta: Rui Rocha falou da Coreia do Norte antes dos 15 minutos contra a expectativa de Paulo Raimundo. Com sentido de humor, e em resposta ao líder da Iniciativa Liberal, revelou que perdeu a aposta com os camaradas de partido. Achava que Rui Rocha só iria falar da Coreia do Norte, da Venezuela ou da Nicarágua só depois dos 15 minutos. Afinal, não: tinha o debate começado e já Rocha usava a “cartilha”, acusava Raimundo. Mas Raimundo é que começou, ao acusar o liberalismo de ter falhado em todo os países em que foi aplicado. Ora, a resposta só podia ser a comparação com os resultados do comunismo no mundo. Cada um esteve no seu quadrado — e nos antípodas ideologicamente na saúde ou habitação — mas o secretário-geral do PCP foi várias vezes ao quadrado do oponente para deixar críticas a que Rui Rocha não respondeu. Por exemplo nas privatizações. E mais uma vez, Raimundo puxou do humor. Rui Rocha disse ao secretário-geral do PCP que se enviasse o programa do PCP à troika, no dia seguinte “estavam cá”. Na resposta, o líder da CDU afirmou que não há dia seguinte porque a privatização dos CTT “arrasou com a entrega postal”. Foi só no final que Rui Rocha deu uma valente estucada no adversário. A propósito do investimento na defesa por causa da Ucrânia — e assim que ouviu falar em Ucrânia, Raimundo disse “já faltava esta…” —, o líder da IL aproveitou o desagrado do adversário para enumerar as votações do PCP no Parlamento sobre a Ucrânia. Nessa altura, começou a ouvir-se do outro lado da mesa um Paulo Raimundo irritado — “fica-lhe mal acabar o debate assim” — o que levou Rui Rocha a responder com uma tirada que ficou a ecoar: “Nos regimes comunistas é que as pessoas têm de estar caladas, e eu não vou estar calado”. Ainda assim, mesmo com um fim desastroso — o PCP ainda não resolveu a questão da Ucrânia porque ela é irresolúvel na cartilha comunista —, Paulo Raimundo continua a surpreender debate após debate: quem o viu e quem o vê.
Pedro Jorge Castro — Imagina-se a conversa entre Paulo Raimundo e os seus camaradas que o acompanharam, quiçá num Trabant da ex-RDA, até aos estúdios de Carnaxide para o debate com Rui Rocha.
Provocou-o o camarada condutor, em jeito de aviso subtil: “Vai uma aposta que o outro o vai atacar com os regimes comunistas que a reação teima em dizer que não funcionaram?”
Resposta de Raimundo, segundo o próprio: “Só nos segundos 15 minutos”.
Caricature-se o resto do cliché: talvez até pudessem ter apostado uma garrafa de vodka russo em como Rui Rocha também atacaria as posições do PCP sobre a Ucrânia.
O que é incrível é tudo isto ser previsível e, mesmo assim, Paulo Raimundo, tão elogiado por estar tão melhor nos debates, continuar sem uma resposta que satisfaça ao menos os seus camaradas, perante a improbabilidade de convencer o resto do mundo — e preferir contar a história da aposta e indignar-se com uma suposta desonestidade do adversário, para tentar disfarçar o que praticamente toda a gente viu: a insustentável posição do PCP nestas matérias.
Rui Rocha nem precisou de ir além do óbvio para vencer este debate entre duas visões da História. E esta noite até trouxe um quadrinho para tentar explicar com mais credibilidade onde vai buscar os 6,2 mil milhões de euros (quem não fez pause não conseguiu ler, mas parece um bocadinho menos inverosímil de alcançar).
Os seguidores de Rui Rocha podem ter achado que cumpriu, dizendo o básico, mas concentrou-se demasiado no opositor, em vez de tentar alargar a base e converter indecisos. Do outro lado, suspeito que Paulo Raimundo não só não tenha conseguido seduzir por aí além — como ainda tenha deixado alguns simpatizantes comunistas aziados com este final incompreensível.
Rui Pedro Antunes — Imaginemos um jantar de Natal em que o tio que deu meias iguais para todos e o tio que levou os miúdos a dar uma volta no Porsche começam a teimar. Paulo Raimundo e Rui Rocha foram fazendo provocações amigáveis para deleite de qualquer uma das suas famílias, fossem comunistas, fossem liberais. Os dois fizeram tudo para encaixar o outro no estereótipo, caricatura fácil. Rui Rocha atirou à ideologia lembrando, por exemplo a Coreia do Norte, que até fez Paulo Raimundo perder uma aposta com a sua equipa. A nível nacional, o liberal disse que a culpa do que se passa no país, incluindo na habitação, é do Estado. Raimundo respondeu o oposto, culpando, pelos problemas do país, os mercados e as privatizações — lembrando o caso dos CTT, quando Rui Rocha sugeriu que enviasse carta à troika para matar saudades. Paulo Raimundo está de facto mais como o arroz. Não vietnamita, mas soltinho. Entrou num autêntico PJEC, um Processo até de Jeronimização Em Curso, em que parece estar a encontrar um registo próprio e mais eficaz. Já Rui Rocha, depois de um debate desastroso com Pedro Nuno Santos, aproveitou para subir à tona da água. No fim do debate, em que Raimundo até parecia levar vantagem, Rui Rocha aproveitou já não ter réplica para lembrar os fretes do PCP a Putin na AR. Não foi bonito, como disse Raimundo, mas em Wall Street o que conta é ganhar. Ainda assim, como nenhum perdeu (nem ganhou votos), é justo o empate em duas prestações de satisfaz-mais.
Recorde aqui as notas dos debates:
Luís Montenegro-Paulo Raimundo e André Ventura-Inês Sousa Real
Pedro Nuno Santos-Mariana Mortágua e André Ventura-Rui Tavares
Pedro Nuno Santos-Rui Rocha e Mariana Mortágua-Inês Sousa Real