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Patriarca de Lisboa, D. Rui Manuel Sousa Valério nunca foi ao Brasil, mas tem fortes ligações com o país. “Todas as famílias portuguesas tiveram ou têm alguém que já viveu ou vive no Brasil. É o meu caso”, diz. Nos anos de 1920, com Portugal devastado pela gripe espanhola (pneumônica) e pela Primeira Guerra Mundial, Francisco Saraiva Sousa, avô do religioso, viu, do outro lado do Atlântico, uma oportunidade para reconstruir a vida. Naquela altura, porém, ele já estava casado com Júlia e tinha dois filhos. E a possibilidade de se afastar da família lhe causava imensa dor. Contudo, movido pela esperança, ele partiu da pequena Urqueira, Ourém, em direção ao Rio de Janeiro.

Vários anos se passaram, mas Francisco conseguiu atingir seu objetivo. Com a vida financeira recomposta, ele retornou para Portugal, para junto da família. Nos anos de 1950, foi a vez de António, um dos filhos de Francisco, refazer o caminho do pai. No Brasil, no entanto, estabeleceu-se em São Caetano do Sul, São Paulo, onde viveu até morrer. “Lá tenho meus primos, portanto, uma geração que está presente no Brasil”, diz D. Valério, que comandou, segunda-feira (14/04), na sede da embaixada brasileira em Lisboa, a cerimônia que relembrou os 525 anos da primeira missa rezada no Brasil.

O representante da Igreja Católica ressalta que, em 2001, esteve muito perto de conhecer a terra onde o avô deu a volta por cima. “Já como missionário, estava no Consulado do Brasil para tratar de minha ida ao país, mais precisamente para João Monlevade, em Minas Gerais, mas recebi um telefonema do meu superior avisando que tinha outros planos para mim” conta. “Então, sou um missionário em falta com o Brasil, mas ainda irei conhecer o país, está na agenda”, garante.

Com laços tão profundos entre portugueses e brasileiros, o patriarca de Lisboa vê com muito bons olhos o movimento inverso ao feito pelo avô e pelo tio tantos anos atrás: o fluxo de cidadãos do Brasil cruzando o Atlântico em busca de uma vida melhor em terras lusas. Para ele, “brasileiros em Portugal não podem ser vistos como imigrantes, pois são irmãos que estão em sua própria terra”. E acrescenta: “A ligação entre Brasil e Portugal é única. É uma ligação baseada na fé, no sagrado. Estamos unidos umbilicalmente do ponto de vista espiritual”.

D. Valério diz que também há uma forte ligação entre Portugal e França, mas, nesse caso, o vínculo está concentrado na questão econômica. “Estamos falando de portugueses que foram para a França em busca de melhores salários, de melhores condições de vida. Com o Brasil, a relação vai além disso, e vem de muito antes”, assinala.

Países de oportunidades

Na avaliação do religioso, Brasil e Portugal têm como característica comum não se curvarem diante das dificuldades. “Ao longo dos tempos, os dois países passaram por altos e baixos, cada um com as próprias histórias, de forma independente, mas sem pender para a tragédia”, ressalta. “São países que nunca perderam a esperança, com portas abertas para novas oportunidades, novos caminhos”, enfatiza.

São essas possibilidades que levaram, ao longo de décadas, portugueses a tentarem a sorte no Brasil e, agora, se registra uma comunidade brasileira cada vez mais presente em Portugal. Dados de 2023, compilados pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE), apontam que 513 mil brasileiros viviam em território luso. Com a atualização dos números pela Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), acredita o Governo do Brasil, a comunidade brasileira em Portugal deve passar de 700 mil cidadãos.

O patriarca de Lisboa enxerga, nos dois países, disposição para ampliar os laços umbilicais. Não por acaso, em fevereiro, quando esteve no Brasil para a XIV Cimeira Luso-Brasileira, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, conclamou as empresas e os brasileiros a se instalarem em Portugal. O país precisa de investimentos e de mão de obra para sustentar o crescimento econômico que, em 2024, foi de 1,9%, o dobro da média observada na União Europeia, de 0,9%. “Há algo que pertence ao âmbito do essencial que une essas duas nações, fazendo com que sejam quase um projeto único”, diz D. Valério.

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