Alaa al-Najjar, médica pediatra no hospital al-Tahrir, em Nasser, estava a tratar vítimas no hospital quando os corpos dos seus filhos lhe foram entregues. Nove dos dez tinham sido mortos num ataque israelita, enquanto ela estava a trabalhar. O mais velho tinha 12 anos.

O marido e um dos filhos sobreviveram. Graeme Groom, cirurgião britânico voluntário no mesmo hospital que Alaa, foi quem operou a criança sobrevivente, um rapaz de 11 anos. À BBC, disse que era “insuportavelmente cruel” que esta mãe, que cuidava de outras crianças, tivesse perdido quase todos os seus filhos num único ataque.

O míssil lançado por Israel atingiu a casa da família. O exército israelita referiu que os ataques atingiram “vários suspeitos identificados” em Khan Younis e disse “estar a investigar danos causados a civis não envolvidos”.

Groom garantiu que o pai das crianças mortas era também médico no hospital e “não tinha ligações políticas ou militares, nem parecia ser proeminente nas redes sociais”. Terá ficado “gravemente ferido” com uma lesão na cabeça.


O cirurgião descreveu ainda que a criança que sobreviveu é “bastante pequena” para a sua idade. “O seu braço esquerdo estava praticamente pendurado, tinha vários ferimentos e lacerações. Uma vez que os seus pais são médicos, está entre um grupo privilegiado em Gaza, mas quando o colocamos na mesa de operações ele parecia muito mais novo.”

Groom acrescentou que o rapaz sobreviveu, mas “ainda não há certezas em relação ao seu pai”.

Youssef al-Najjar, familiar das vítimas, pediu “misericórdia”, em entrevista à agência noticiosa AFP: “Basta! Tenham misericórdia de nós. Pedimos a todos os países, à comunidade internacional, às pessoas, ao Hamas e a todas as facções para terem piedade de nós. Estamos cansados de sermos deslocados e de passar fome.”

Israel levantou esta semana um bloqueio de 11 semanas a Gaza, que impediu a entrada de ajuda humanitária em Gaza e fez com que pelo menos 29 crianças e idosos morressem à fome. O bloqueio levou as Nações Unidas a avisarem que 14 mil bebés poderiam morrer por falta de alimentos.




O bloqueio de 11 semanas provocou o caos e pelo menos 29 mortes
REUTERS/Ibraheem Abu Mustafa

Na quinta-feira, cerca de 90 camiões com produtos alimentares entraram em Gaza. Uma “colher de chá”, considerou António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, face às necessidades da população palestiniana. A organização referiu repetidamente que seriam necessários entre 500 a 600 camiões por dia para conseguir suprir as necessidades das 2,1 milhões de pessoas que vivem no enclave.

A escassez de recursos provocada pelo bloqueio israelita tem levado a cenários de caos, com pilhagens e milhares de palestinianos a amontoarem-se junto dos poucos sítios onde há alimentos.

Mais de 53 mil palestinianos e pelo menos 16 mil crianças foram mortas pelo exército israelita desde Outubro de 2023, depois do ataque do Hamas que vitimou 1200 pessoas e fez 251 reféns. Ao PÚBLICO, dois especialistas em genocídio afirmaram não ter dúvidas de que “estamos a ver o primeiro genocídio do seu género tão bem documentado em tempo real”.