O dia de hoje [21 de julho] fica marcado pelo regresso de um grande evento no mundo do golfe ao Algarve e com forte impacto no turismo da região. Que importância tem para a região do Algarve conseguir captar estes investimentos e de que forma é que estes investimentos alavancam a região do Algarve, não só a nível interno, mas também a nível externo?
Este conjunto de investimentos no Algarve nos últimos temos, nomeadamente e por força desta entrada em força de fundos internacionais, é um contributo fantástico para o que é um dos nossos desafios do presente e objetivos para o futuro e que acaba por ser a qualificação da nossa oferta. Ou melhor, a requalificação da nossa oferta.
Do ponto de vista do posicionamento global é um reflexo do que tem sido este crescimento exponencial do mercado norte-americano nos últimos anos, reforçado por um conjunto de ações promocionais que estamos a fazer, tanto a nível nacional como internacional, mas muito em particular a nível regional.
Aliada a esta captação de grandes eventos, do ponto de vista do posicionamento global do Algarve, é extraordinária a visibilidade que nos dá. Quando falamos em grandes eventos internacionais, como o MotoGP, que acontece no Autódromo em novembro, as Superbikes, que vão acontecer em março do próximo ano, a Volta ao Algarve em bicicleta, o facto de recebermos, pela primeira vez, um torneio da PGA Tours em Portugal, acaba por ser também inovação e um reforçar desse abrir de portas a um mercado norte-americano, que conforme via no outro dia, a nível nacional, já é o terceiro mercado externo. No Algarve já é o sexto. Ainda me recordo que, quando dava umas entrevistas há dois anos, era o 10.º ou 11.º mercado para o Algarve. No mês passado [junho] passou a ser o sexto mercado. Isto em dois anos e a continuar a crescer.
Aliás, quando falamos do mercado norte-americano, falamos dos EUA e Canadá, é preciso lembrar as ligações mais antigas, como a Air Transat, nomeadamente, com o Canadá, reforçadas no ano passado com a abertura da rota para os Açores, com Ponta Delgada, e que passou a servir também de stopover para os norte-americanos virem para o Algarve e, agora, com mais força e com mais permanência, claramente, com o voo da United.
Mas ainda nesta ótica da captação deste evento, isto também é uma forma de mostrar uma diversificação da oferta turística do Algarve. Deixa de ser só Sol e Praia?
Exatamente. Claro que o Algarve ainda é muito visto como um destino de Sol e Praia, mas também de golfe. E efetivamente aquilo que tem sido a nossa aposta nos últimos anos, tem sido não só na perspectiva da diversificação dos mercados emissores, mas também na diversificação daquilo que é a nossa oferta, em termos de segmentos que as pessoas podem experienciar aqui na região.
Creio que é uma aposta que já tem, provavelmente, uma década e, hoje, estamos a colher os frutos dessa aposta. Hoje o turismo de natureza tem um peso muito grande dentro daquilo que é a nossa atividade turística na região, com todo um conjunto de ações e estratégias definidas para potenciar este segmento. Começa desde logo pela estruturação da oferta, com a criação das Rotas, da Via Algarviana, da Rota Vicentina, da nossa Ecovia do Litoral, um conjunto de experiências turísticas associadas a esse turismo de natureza que nos permite dar a conhecer um outro Algarve, não tão conhecido por parte de quem nos visita. O tal Algarve interior, um outro Algarve que as pessoas têm para descobrir.
O importante é acrescentarmos esta diversidade que permita contribuir para o alargamento da estada média. Ou seja, as pessoas podem vir usufruir das nossas praias, podem vir jogar golfe, mas também podem conhecer o interior da região, conhecer aquilo que são as nossas culturas mais artesanais, muito escondidas pela serra, experimentar toda a nossa gastronomia, os nossos vinhos, os nossos doces, onde é possível encontrar muito da nossa identidade, a nossa marca, a nossa autenticidade, alavancar o que são os nossos produtos endógenos.
Já estamos na segunda parte do ano. Como tem estado a comportar-se a região do Algarve até agora e o que é esperado deste verão?
A expectativa é extremamente positiva e digo sempre isto com base nos feedbacks que tenho por parte dos empresários, nomeadamente e em particular, do setor da hotelaria. As expectativas para este verão são ligeiramente superiores às do ano passado. Aliás, ainda a semana passada [2.ª semana de julho] estava com o diretor de um hotel de 5 estrelas, com preço bastante considerável, e estava a 92%, que é, mais ou menos, a média neste momento de ocupação na nossa região.
E o ano 2025 na sua totalidade, será um ano superior a 2024?
Mais do que recordes, número de turistas, número de dormidas, estamos, acima de tudo, focados naquilo que é a alavancagem dos proveitos. E é com muito agrado que vemos os proveitos a crescerem numa percentagem superior àquela que os indicadores apontam.
Porque ter mais dormidas não quer dizer mais valor?
Exatamente, mais hóspedes não quer dizer que tenhamos mais valor. Neste momento estamos com um desempenho claramente consolidado, estamos a crescer 1,5% em hóspedes, estabilizámos nas dormidas, mas acima de tudo estamos a crescer em proveitos a 5% a 6% e é uma tendência que esperamos ver continuada até ao final do ano.
O nosso objetivo é continuarmos a crescer numa forma sustentável e sustentada perante aquilo que é a capacidade do destino e mantermos a qualidade das experiências para quem nos visita.
A “narrativa” de verão
Têm surgido algumas vozes a referir que o Algarve está caro e que, por outro lado, não tem acompanhado o aumento dos preços com a qualidade do serviço. Como responde o presidente do Turismo do Algarve a essas vozes críticas?
Temos oferta para todas as carteiras. E, portanto, perante aquilo que é uma aposta que na qualificação das nossas experiências, dos nossos serviços, das nossas infraestruturas, isso vem acompanhado, obviamente, de um aumento do custo da experiência.
Há essas vozes críticas, mas depois também há dados que as desmistificam. Por exemplo, na apresentação da BTL 2026, salientei o “Post Office Report” do Reino Unido, já de 2025, que coloca o Algarve em primeiro lugar, no que diz respeito à relação qualidade-preço do serviço e da experiência turística que é oferecida.
Por outro lado, reafirmo, temos oferta para todas as carteiras. Desde o Alojamento Local ao hotel 5 estrelas, todos os turistas, sejam eles nacionais ou internacionais, encontram uma oferta adequada àquilo que são as suas capacidades financeiras.
O que não se pode esperar, obviamente, é de vir para um hotel 5 estrelas por 100 euros a noite.
Por isso, perante a aposta na qualificação que estamos a fazer, é natural e de salutar que haja este elevar também de preços a nível da região. Agora, tem de ser uma elevação de preços acompanhada precisamente daquilo que é a qualidade dos serviços.
Ainda a propósito da questão dos preços altos, um dos maiores grupos hoteleiros que temos a operar na região, partilhava comigo um benchmark, feito em junho, e quando comparamos o que é comparável, porque por vezes cai-se no erro de comparar realidades que não são comparáveis, os preços são favoráveis ao Algarve. Vou dar um exemplo, que aliás tem sido surgido nos últimos tempos: é mais barato ir passar uma semana à República Dominicana do que vir uma semana para o Algarve. A oferta da República Dominicana não tem nada a ver com a oferta do Algarve. A grande maioria das pessoas que vão para a República Dominicana, chegam, entram no resort e ficam dentro do resort até ao dia em que saem. Ora, esse não é o tipo de experiência que o Algarve propicia nem pretende propiciar.
Portanto, rejeito essa crítica de que estamos muito caros ou que temos um serviço desajustado de acordo com aquilo que é a qualidade.
O nosso objetivo é continuarmos a crescer numa forma sustentável e sustentada perante aquilo que é a capacidade do destino e mantermos a qualidade das experiências de quem nos visita
Desde o fim da pandemia que os preços dos bens têm subido. Naturalmente, que o empresário, seja ele da hotelaria ou da restauração, foi obrigado a “acomodar” essas subidas de preços. Pergunto se essa subida já estagnou ou vai continuar?
Creio que não haverá margem para subir muito mais. Aliás, os próprios hoteleiros dizem-me isso. A aposta tem de ser, claramente, naquilo que é a elevação da qualidade dos serviços.
Fala-se muitas vezes na questão dos proveitos, dos milhões de proveitos associados à atividade turística. Mas o facto de subirem os proveitos não quer dizer que suba o resultado líquido das operações e das empresas. Sim, os empresários foram obrigados a “acomodar” essas subidas de preços, mas também creio que as motivações que levaram a esse aumento das matérias-primas e dos custos de produção vão-se esgotar.
Recordo que, no pós-pandemia, toda a gente justificava um aumento de preços por causa das matérias-primas. Depois foi a guerra, as taxas de juros. Bom, a pandemia está arrumada, as taxas de juros estabilizaram, temos ainda as guerras. Mas também acho que por aí não vai haver motivação para continuar a subida de custos, a não ser no fator dos recursos humanos e onde, claramente, tem de haver uma reflexão mais efetiva daquilo que são os proveitos do turismo e as condições de vida dos trabalhadores.
À conquista de mercados
O Algarve continua a ser a região mais dependente de mercados externos …
Relativamente.
Mas em dormidas o principal mercado é o Reino Unido?
Certo. Mas em hóspedes, em 2024, o nosso principal mercado foi o nacional, o que também vem contrariar a narrativa de que o Algarve está caro e que está divorciado dos portugueses e que os portugueses não vão para o Algarve passar férias.
A verdade é que, chegados a junho, como costumo dizer, o Algarve “leva na cabeça”. Ou é porque está caro, porque está barato, porque está cheio ou está vazio, porque tem estrangeiros a mais ou tem portugueses a menos. Na região já dizemos, quando surgem as primeiras notícias em junho, “está a começar”. Já sabemos que é uma espécie de “desporto nacional”. Felizmente, mais uma vez, os factos vêm contrariar essas teorias e muitas vezes vêm fora de tempo.
Depois temos a história do INE e a reflexão que temos de fazer aos números. Ainda me lembro, em 2024, juntamente com o Hélder Martins [presidente da Associação de Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve – AHETA] passámos os dois o verão todo, nas televisões, nos jornais, a dar entrevistas, a contrariar essa ideia de que os portugueses não vêm para o Algarve, que há um divórcio dos portugueses com o Algarve, porque está muito caro. Durante todo o verão ouviram-me dizer, vamos aguardar pelos dados oficiais. E a verdade é que quando tivemos os dados oficiais do final de setembro, que só são disponibilizados em novembro, já não interessam a ninguém, já não é notícia.
Depois há números que não são contabilizados, com o AL inferior a 10 camas, e sabemos o peso que isso tem, nomeadamente, na operação nacional, e já nem falo nas segundas residências, que também não são contabilizadas. A verdade é que os números contrariam, felizmente, essas narrativas.
Repito, em 2024, o nosso principal mercado, em hóspedes, foi o mercado nacional e foi o segundo em termos de dormidas, apenas ultrapassado pelo Reino Unido.
E o que fazer para diversificar esses mercados? A América do Norte está a subir, mas há mercados que estão mais difíceis.
É continuarmos, basicamente, a fazer o trabalho que temos feito. Se há coisa que me agrada bastante é que, de facto, nestes dois anos de mandato conseguimos concretizar todas as rotas para o aeroporto de Faro que tínhamos previsto. Isto só foi possível graças a um trabalho conjunto entre nós, o Turismo Portugal e o aeroporto de Faro. Quando aumentamos capacidade para o Reino Unido, ainda bem que o fazemos, porque continuamos a receber mais turistas do Reino Unido. Mas há uma forte aposta naquilo que é a diversificação. Atingido o objetivo dos EUA, estamos com um foco também muito grande no Norte e Centro da Europa, aliás também eles potenciados com rotas que já conseguimos concretizar para este ano e algumas novidades que vamos ter para breve.
Continuamos a almejar também novas ligações, nomeadamente transatlânticas. Nunca escondi, e já partilhei por algumas ocasiões, que era muito bom para a região termos uma ligação direta ao Brasil. Essa é uma das nossas presentes apostas. Se recuar três ou quatro anos, éramos nós a ir atrás das companhias aéreas para ver o interesse de voarem para o Algarve. Hoje, é com muito agrado que nesses encontros já são as companhias aéreas que vêm ter connosco para estudar a possibilidade de lançarem rotas diretas para o aeroporto de Faro.
E o aeroporto de Faro tem capacidade para alavancar esse crescimento?
Algumas das companhias aéreas que vêm ter connosco para estudar a possibilidade de fazer uma ligação com Faro, já é na perspectiva de verem que não têm a possibilidade de expandir em Lisboa. E, portanto, não havendo possibilidade de expandir em Lisboa, feliz e finalmente, apetece-me dizer, veem Faro como alternativa. Até porque, infelizmente, parece que os aeroportos em Portugal são só Lisboa e Porto. E, muitas vezes, em alguns fóruns, lá levanto o braço a dizer que também existe Faro.
Posso partilhar que recentemente tivemos uma reunião do Conselho Consultivo do aeroporto de Faro, por força até inclusivamente dos 60 anos do aeroporto, e foi-nos apresentado pela VINCI o plano de expansão ao nível do plano diretor do aeroporto 2030-3032. É, de facto, de salutar esta disponibilidade e esta intenção da VINCI investir no aeroporto de Faro, percebendo, precisamente, que tem aqui um potencial de crescimento que não tem, eventualmente, noutros aeroportos.
Outro aspeto importante é o trabalho que estamos a fazer, com resultados efetivos, de alargarmos rotas de verão para rotas todo o ano. Felizmente, também muitas destas novas rotas que temos anunciado, novos voos diretos, iniciam no verão IATA, mas muitos deles, até ainda antes de chegarmos ao final da operação, a companhia informa que, natural e normalmente, com uma redução de frequências, a expansão da rota para o ano inteiro.
O nosso objetivo é continuarmos a crescer numa forma sustentável e sustentada perante aquilo que é a capacidade do destino e mantermos a qualidade das experiências de quem nos visita
Mobilidade sobre carris
Baixando agora de altitude, que importância deveria ser dada à ferrovia?
Ui! Nem de propósito, ainda recentemente tivemos uma reunião com o Turismo de Portugal em que precisamente estamos a ver de que maneira, ainda que não tenhamos as competências ou não tenhamos as condições para tal, podemos trabalhar a questão da mobilidade, nomeadamente a mobilidade sustentável, a mobilidade ligeira ao nível das diferentes regiões.
De facto, aqui no Algarve, quando se fala em ferrovia, o que é que posso dizer? Tivemos a linha totalmente eletrificada, na semana das eleições legislativas. Às vezes veem-me falar de Alta Velocidade para o Algarve e respondo, temos linha eletrificada há menos de um mês! Claro que seria ótimo haver uma ligação de Alta Velocidade, é fundamental, mas isso integra-se dentro de um déficit de investimento infraestrutural na região, que infelizmente vivemos há décadas.
Mas quando aponta a ferrovia, fala na região ou de ligações a Lisboa e/ou Espanha?
Falo nos dois níveis, porque são os dois muito baixos. Quando só em 2025 temos concretizada a eletrificação de uma linha, onde temos automotoras com décadas, estamos à espera das novas agora para operar na linha eletrificada, temos uma ligação com Lisboa através de Alfa Pendular e de Intercidades, e que, para circular na região, é preciso mudar de comboio, penso que não preciso de dizer mais nada. Do ponto de vista regional, seria fantástico não só a nível turístico, mas também da mobilidade dos residentes e dos trabalhadores na região.
Não há um trabalhador ou um residente na região que utilize a ferrovia para se deslocar, porque os horários são desequilibrados, a localização das estações, muitas delas estão fora dos centros urbanos, e falta a intermodalidade necessária entre a ferrovia e a rodovia para que sirva de alternativa quer para residentes, quer para turistas.
Temos dois ou três desafios que estão presentes em todos os fóruns de discussão que há na região: mobilidade e habitação. São dois desafios enormes, não só da região, mas do país.
Temos uma solução providenciada pela nossa CIM, pela AMAL, que de facto veio colmatar uma falha ao nível do transporte intercidades ou interconcelhos, a carreira rodoviária VAMUS, que faz a ligação entre os diferentes concelhos da região. Posso partilhar que é um best-seller nos nossos postos de turismo. Quando essa carreira foi lançada, a AMAL veio falar connosco para termos os bilhetes à venda nos nossos postos de turismo.
Ora, 40% ou 50% das questões que nos são colocadas na nossa rede de 21 postos de turismo, que gerimos em articulação com os municípios, versa sobre transportes. Como vou deste concelho para outro? Como é que vou visitar aquela infraestrutura? E a VAMUS, de facto, veio preencher um espaço.
A concessão está a terminar no final do ano e já participámos em várias reuniões com a AMAL para prepararmos o próximo caderno de encargos para tentarmos dar alguns contributos em termos de ajustes do que poderá ser a próxima concessão para dar respostas às necessidades da região, nomeadamente e em particular, para os trabalhadores do turismo.
Sabemos que é um desafio, temos grande parte da atividade turística, dos nossos empreendimentos, das nossas infraestruturas turísticas, localizada junto à costa, onde é impossível os trabalhadores encontrarem alojamento. Existe uma falta de resposta dos transportes públicos para transportar estes trabalhadores para a costa.
Da terra para o ar
Ainda relativamente à mobilidade e à conectividade, tivemos o início do processo de reprivatização da TAP. As regiões de turismo foram ouvidas?
Não.
Mas deviam ter sido?
Acho que sim. Aquilo que é o papel fundamental da TAP e o contributo que dá para a atividade turística, quero crer que certamente o Turismo de Portugal terá sido ouvido. Mas porque não também as Entidades Regionais de Turismo? Sabemos que, ainda que com um diferente peso, a TAP tem um contributo extremamente relevante para aquilo que é a atividade das regiões, não só do ponto de vista turístico, mas do ponto de vista da conectividade.

Foto: Frame It
Enquanto presidente do Turismo do Algarve, preocupa-o este dossier?
Não vou dizer que me preocupa, mas gostaria de o ver concretizado. E, infelizmente, no nosso país, todos os dossiers levam muitos anos para serem concretizados. O nosso país perde muito tempo a tomar decisões, a estudar soluções, a desenvolver procedimentos, fazendo com que, muitas vezes, aquilo que é uma necessidade para hoje, seja apenas uma realidade usufruível por parte de residentes ou visitantes, daqui a 10 ou 20 anos.
Entendendo que o Estado deve manter uma posição maioritária na TAP, mas, acima de tudo, pretendo ver este processo concluído o mais rápido possível, porque também me é dito que o desenvolvimento de novas operações por parte da TAP tem estado sempre condicionado por este processo.
Desde que entrei em funções e tive a oportunidade de reunir logo nos primeiros tempos com a TAP, nomeadamente, no sentido de perceber qual o trabalho que poderíamos fazer com a TAP para que esta aumentasse o seu nível de operação aqui no aeroporto de Faro, que ronda os 2% …
Compreende-se ser tão pouco?
Para mim é incompreensível, até a partir do momento em que se fala tanto em coesão territorial e daquilo que é a importância da TAP como companhia de bandeira nacional e a relevância tanto do ponto de vista da ligação interna como do ponto de vista de ligações externas. Seria de esperar que a TAP tivesse uma operação mais forte e mais presente aqui no Algarve. Creio que poderá vir a acontecer.
Aliás, nestes dois anos já concretizámos uma nova ligação ao Funchal, precisamente com a TAP, mas almejamos mais.
As ligações internas são importantes não só do ponto de vista do turismo interno, mas do ponto de vista do turismo de negócios, da mobilidade de residentes dentro do nosso território. Gostava muito de ver reforçadas as nossas ligações com o aeroporto de Lisboa, com o aeroporto do Porto, que hoje só é assegurada pela Ryanair. Até aqui dizem-me que não é possível, tendo em conta a reestruturação da companhia, mas com este processo de reprivatização em curso, espero que se conclua o mais rapidamente possível para que a TAP tenha condições de desenvolver a sua operação a full power.
Relacionado com a esta questão do serviço aeroportuário, o novo sistema de controlo de fronteiras também tem gerado algumas críticas. Que impacto tem no Algarve?
O impacto, para já, não é só no Algarve, é em todo o país, porque é um problema que se tem vindo a verificar em todos os aeroportos nacionais. Aliás, recordo-me que o aeroporto do Porto, historicamente, nunca tinha tido problemas com as entradas, e agora, com a introdução deste novo sistema, isso está a acontecer.
É incompreensível como se implementa todo um novo sistema de controlo de entradas sem a devida articulação com os diferentes agentes do setor e sem a devida preparação do ponto de vista logístico, de softwares e hardwares associados.
Recordo-me que, no encontro da CTP no ano passado, em Mafra, num painel em que estavam o José Luís Arnaut e o Francisco Pita [presidente do Conselho de Administração da VINCI e Chief Operating Officer da ANA – Aeroportos de Portugal, respetivamente] dizerem, atenção que quando vier o novo sistema isto vai correr mal.
O primeiro impacto de quem nos visita não é positivo?
Não, não é positivo. Felizmente, creio que as coisas ultimamente têm estado a melhorar.
Aqui na região, para tentar mitigar um pouco a situação, expandiu-se a infraestrutura com a montagem de uma tenda extra, precisamente para tentar divergir aquilo que é um fluxo muito grande de turistas que chega naquelas slots preferenciais.
O feedback que tenho é que a situação tem estado a melhorar todas as semanas, mas os tempos terão de ser aceitáveis dentro daquilo que são as experiências que as pessoas esperam vir a ter na região. Mas a este propósito, não deixo de partilhar um episódio pessoal. Há cerca de três semanas, em Barcelona, estive uma hora e meia no check-in para deixar a bagagem. Portanto, muitas vezes quando se fala desta situação, não é uma realidade só portuguesa.
Também não posso deixar de partilhar que há muita contrainformação. Já apanhámos vídeos e fotografias a serem partilhados nas redes sociais num determinado dia e fomos ver e as fotografias e os vídeos têm dois anos.
Em 2024, o nosso principal mercado foi o nacional, o que também vem contrariar a narrativa de que o Algarve está caro e que está divorciado dos portugueses e que os portugueses não vão para o Algarve passar férias
São as tais narrativas que se gosta de alimentar?
E que temos de saber lidar com elas. Há também uma questão relacionada com a falta de pessoal do ponto de vista da polícia nas fronteiras. Tenho de elogiar o esforço que os nossos agentes na região têm feito, perante aquilo que é a falta de meios e de reforços.
Portanto, é necessário reforçar os meios que temos na região não só no período de verão, mas durante todo o ano, até porque vamos tendo atividade durante todo o ano.
Uma nova estratégia
A nível nacional esperava-se a apresentação da “Estratégia Turismo 2035” (ET2035), foi adiada. O que gostaria de ver nessa ET20235 e o que não gostaria de ver repetido na nova visão para o turismo em Portugal?
A primeira é mais fácil. Gostaria de ver aquilo que comentámos e trabalhámos muito, e creio que a estratégia vai refletir isso no final, que é não ver um foco tão grande no que é desempenho em termos de números de turistas, número de hóspedes, número de dormidas, mas, de facto, um foco maior naquilo que é o contributo do setor para as comunidades locais e para a vida dos residentes e dos trabalhadores no setor do turismo. Podemos falar em muitos milhões de euros gerados pela atividade turística, mas se esses milhões não se refletirem naquilo que é uma conciliação, uma melhoria e um contributo adicional para a vida dos locais, dos residentes e das condições para os trabalhadores, alguma coisa está mal.
É preciso mostrar mais esse contributo, até por parte do próprio setor?
Precisamente. Acho que aí temos tido um déficit da parte do próprio setor. O setor não tem tido capacidade, não obstante fazê-lo, de demonstrar às comunidades locais, aos territórios, aquilo que tem sido efetivamente o seu contributo. Acho que o setor não tem tido a capacidade de demonstrar isso, ou não temos tido a capacidade de o comunicar de uma forma percetível às nossas comunidades locais e aos nossos residentes. Dou o exemplo com a taxa turística e onde é aplicada. Há tempos referia que a solução pode passar tão simplesmente por colocar uma placa a indicar que este museu foi recuperado com dinheiro da taxa turística, este jardim está impecavelmente mantido por conta do dinheiro da taxa turística. Isto seria uma forma das pessoas, as nossas comunidades locais e os nossos residentes, terem uma perceção mais prática.
Portanto, coisa simples?
Sim, pode ser uma coisa tão simples. Como poderia falar das reuniões que temos por causa dos testes das águas com a APA, capitanias, municípios, associações. Por isso, sim, por vezes há uma certa incapacidade do setor demonstrar aquilo que é o nosso impacto.
Por isso, cada vez mais temos, nós setor do turismo, de mostrar os benefícios que este universo traz para a economia, comunidades locais, residentes e trabalhadores. A “Estratégia Turismo 2035” também tem de ter muito esse foco, aliás, amplamente discutido durante as sessões preparatórias.
Nunca escondi que era muito bom para a região termos uma ligação direta ao Brasil. Essa é uma das nossas presentes apostas
E o que não espera ver na ET2035? Uma maior autonomia das ERT?
Isso sem dúvida. Haver um maior reconhecimento daquilo que é a nossa capacidade de agir sobre um território, a nossa capacidade de mobilizar os agentes, isso é óbvio. Acho que isso é indiscutível e conseguimos demonstrá-lo, nomeadamente e mais uma vez aqui sinto-me à vontade, porque estamos a falar do Algarve em que, em última instância, tudo diz respeito a turismo.
Das coisas que dá mais gozo no desempenho destas funções, é precisamente essa capacidade que temos de intervir, não só uma intervenção que vai muito para além da atração de turistas e da criação de oferta turística, mas uma capacidade de intervirmos naquilo que é a gestão do território, naquilo que é a criação da melhoria das condições de vida dos próprios residentes e dos próprios locais e termos noção que muito daquilo que fazemos também é usufruível por parte dos residentes e dos locais. Para além do contributo para a economia, dos empregos, do PIB. Aguardamos ansiosamente pela alteração da Lei 33, na qual o nosso secretário de Estado, no anterior Governo, assumiu um compromisso mais imediato.
E que também foi crítico da mesma antes de exercer o cargo no Governo?
Ele foi autor da proposta da alteração. Não precisamos de lhe dizer aquilo que é necessário ser feito. Esperamos ansiosamente pela concretização dessa alteração da lei para que, no fundo, venha conferir maior eficácia e eficiência à nossa ação, que é tudo aquilo que não temos neste momento.
Tudo aquilo que fazemos ou tentamos fazer a nível de ERT, obriga-nos a um conjunto de procedimentos e de autorizações, para além daquilo que são as implicações das cativações, da falta de reforço de verba do Orçamento de Estado (OE). Inclusive, na desadequação daquilo que é o tempo de resposta a muitos dos anseios ou das necessidades do território e dos agentes privados.
É frustrante quando tenho um empresário a vir ter comigo com um desafio e percebo que para conseguir dar uma resposta precisava de seis meses de antecedência. E afinal, só vou ter um mês ou dois. E depois as comunidades também não percebem esse atraso e perguntam porque não é feito. Nas ERT temos o conhecimento, a capacidade de juntar atores da região, de agregar vontades e os agentes à volta de um objetivo comum. E não temos dúvidas, como também é reconhecido, nomeadamente e em particular, quer pelo secretário de Estado, quer pelo Turismo de Portugal, que poderemos executá-las melhor e de uma forma muito mais eficaz e eficiente se o fizermos do ponto de vista regional em vez de ser feito centralizado em Lisboa.
Também há o anseio pelo reforço de verbas do ponto de vista do Orçamento de Estado. Estamos neste momento já a trabalhar no documento para o próximo ano, temos de o ter carregado nas plataformas no dia 1 de agosto, e, perante aquilo que sei, a indicação é que, mais uma vez, vai voltar a não haver reforço da verba a nível do OE.
Se, por um lado, tenho de reconhecer e elogiar aquilo que tem sido a disponibilidade e o trabalho desenvolvido pelo e com o Turismo de Portugal, em que, aí sim, tem existido uma disponibilidade e um reforço de verbas, em particular do ponto de vista da promoção externa, do ponto de vista do OE continuamos com a mesma verba desde 2013.
Mas há uma porta aberta para essa alteração?
Volto a dizer o que disse no ano passado: ou é feito agora ou então dificilmente veremos algum avanço. Até porque há um conjunto de vontades e de conhecimentos práticos e uma articulação entre todos, do ponto de vista das diferentes regiões, do Turismo de Portugal e do secretario de Estado.
Esperamos ansiosamente pela concretização dessa alteração da Lei 33 para que, no fundo, venha conferir maior eficácia e eficiência na nossa ação, que é tudo aquilo que não temos neste momento
Pessoas e casas
Continua a ser difícil atrair recursos humanos para trabalhar no turismo no Algarve?
Tem sido um desafio, claramente, do ponto de vista não só da atração, como também da retenção daquilo que são os nossos talentos. Não obstante ser um desafio, creio que já não é tão grave como há dois ou três anos. Também é possível registar com agrado, fruto de uma aposta dos empresários, para retribuir melhor os seus trabalhadores e, acima de tudo, manterem as equipas durante todo o ano. Longe vão os tempos em que só tínhamos três ou quatro meses de atividade turística na região.
Contudo, continua a ser, claramente, um desafio, porque se queremos aumentar a qualidade dos serviços, temos de ter mais e melhores trabalhadores, mais qualificados. Tenho de destacar o que tem sido o esforço do Turismo de Portugal, nomeadamente, com as três escolas de hotelaria e turismo na região, mas também, em particular, pela nossa própria ERT, que no ano passado em conjunto com o Turismo de Portugal criámos um programa de formação específico denominado “Competências Futuro Algarve” cujo processo de construção se iniciou, precisamente, com uma auscultação a todos os empresários da região para perceber quais eram as necessidades de formação. Estamos, neste preciso momento, a realizar um novo processo de auscultação às empresas para que haja uma adequação da oferta à procura, e contamos lançar em setembro um novo programa de formação “Competências Futuro Algarve”, que irá decorrer de setembro 2025 até abril 2026.
Nesta matéria, seria importante a região ter espaço para aumentar a sua capacidade formativa, não obstante termos três escolas de hotelaria e turismo extremamente reconhecidas e com alta qualidade de formação na região. Mas creio que seria relevante as universidades quer públicas, quer privadas, estarem capacitadas para aumentar o grau formativo na região.
E depois há trabalho, mas não há habitação?
Esse é outro dos desafios que atravessa não só o nosso setor, mas que é global, nacional. Sabemos que é um problema que não se resolve de um dia para o outro e que revela uma falta de estratégia nas últimas décadas e que faz com que estejamos a viver uma emergência.
O setor privado tem de ter uma palavra?
Sem dúvida, não pode ser só o setor público a resolver o problema da habitação. O setor público tem a obrigação de criar condições para que o setor privado consiga dar um contributo forte para esta falta de habitação no nosso país e, em particular, na região do Algarve. Não é voltarmos a construir sem regras, como foi feito nas décadas de 80 e 90 do século passado.
Não podemos estar à espera que sejam só os municípios a construir casas nos próximos anos. O setor privado tem de ter terrenos a custos acessíveis, licenciamentos céleres. Não podemos estar 10, 20 anos à espera de uma aprovação de um hotel ou de um prédio para habitação.
Falámos de turismo desportivo, de gastronomia, de negócios. Falta o MICE. Que importância tem este segmento para o Algarve?
Muita, e por isso tem sido claramente uma das nossas apostas nos últimos anos, com a captação de eventos corporativos, de grandes congressos, nomeadamente e em particular, para o período fora da época alta. O segmento MICE tem dado, claramente, esse contributo para trabalharmos fora da época alta. E é vantajoso para todos. É vantajoso para a região recebermos esses encontros fora da época alta, porque permite-nos ter atividade durante todo o ano. Para os promotores desses eventos também é vantajoso virem fora da época alta, porque encontram melhores condições do ponto de vista dos serviços para organizarem os seus eventos. E depois, nada como a experienciação do território. Esse tipo de eventos permite, também, propiciar essa experienciação do território aos participantes que, muitas vezes, já trazem família, e se não trouxerem, será certamente um potencial turista do futuro.
Sabemos da importância da conectividade aérea para captarmos estes eventos corporativos e, nesse sentido, é uma conjugação de esforços que só pode ter resultados positivos na região. E por isso também é com muito agrado que temos cada vez mais congressos, mais eventos cooperativos a acontecer na nossa região.
Nacionais e internacionais?
Nacionais e internacionais. Mas aqui talvez até com um foco mais internacional. Porque, de facto, esta descoberta de Portugal e do Algarve, em particular, por tantos mercados internacionais, tem sido evidente e um forte contributo para esta atividade do MICE.

É no “The Els Club Vilamoura”, desenhado por Ernie Els, que decorrerá o “Portugal Invitational”, de 31 de julho a 2 de agosto de 2026, contando com 78 jogadores, incluindo membros do World Golf Hall of Fame e do PGA TOUR Champions, assim como membros do Legends Tour – Foto_ Frame It
O Algarve será “Destino Nacional Convidado” da BTL 2026. O que está ou vai ser preparado?
O Algarve vai demonstrar a sua relação de proximidade com o mercado nacional e reforçar essa mesma ligação, contrariando as tais narrativas cíclicas que vamos tendo todos os anos. Acima de tudo, vamos apresentar e reforçar aquilo que são as novidades para 2026 e o nosso posicionamento junto do mercado nacional.
Existe um déficit de oportunidades para os destinos regionais e nacionais se promoverem dentro do mercado nacional e a BTL, de facto, é o sítio para o fazermos, para nos apresentarmos não só aos mercados internacionais, mas também ao mercado nacional.
O Algarve está logo ali ou já aqui para qualquer português que queira visitar a região, seja num fim de semana, num feriado, num fim de semana prolongado, ou até aproveitar preços mais baratos que temos fora da época alta e em que continuamos a propiciar as mesmas condições de visita à região.
O que falta fazer no resto do mandato?
Ah, falta fazer muita coisa. Hoje atingimos mais um objetivo. De facto, ao nível daquilo que era a captação dos grandes eventos internacionais, voltarmos a ter um grande evento de golfe. Vamos, claramente, continuar a trabalhar para captar mais eventos internacionais acrescentando diversificação à nossa oferta. Aliás, hoje também foi mencionado o trabalho que está a ser realizado para voltarmos a ter um grande evento equestre aqui em Vilamoura, também fruto de um investimento e de uma parceria com o grupo Arrow.
E como referiu o secretário de Estado do Turismo, Comércio e Serviços, Pedro Machado, diversifica mercados.
Completamente. O mercado equestre é muito diferente do mercado do golfe. Sabemos que o MotoGP para o mercado norte-americano não é o mais importante, ao contrário do espanhol, por exemplo, mas sabemos da importância que a PGA tem para os norte-americanos.
Queremos continuar a apostar naquilo que é o reforço da nossa conectividade aérea. Almejo ver um reforço, obviamente, do posicionamento da TAP e da operação da TAP no nosso aeroporto. Almejo ver um reforço, do ponto de vista da conectividade aérea, para outros destinos com os quais não estamos ainda ligados e que, de facto, nos potenciam esta diversificação de mercados.
E, acima de tudo, almejo que continuemos a fazer o trabalho que temos feito, no sentido de posicionarmos o Algarve como um destino sustentável, que mantém a sua autenticidade, que sejamos mais eficazes do ponto de vista daquilo que é a consciência e a sensibilização das nossas comunidades e dos nossos residentes, para perceberem o contributo que o setor dá.
Na questão do “overtourism”, em junho fiz uma viagem e tive a experiência de Barcelona, de visitar Capri., Florença e questionei-me se, em agosto, no Algarve, existirá algum local com tantas pessoas como aqueles. Não existe.
Muitas vezes quando se fala de “overtourism”, não se faz ideia do que se está a falar e, acima de tudo, não se valoriza aquilo que temos. São as tais narrativas. Não quer dizer que não sejam alertas e também pelo facto de não termos um problema hoje não que não possamos ter no futuro. Mas voltando ao mandato, de facto, pretendo que haja uma melhor perceção por parte das nossas comunidades e por parte do nosso território, daquilo que é o contributo do turismo para esta região.
A comunidade local no Algarve valoriza o turismo?
Tem de valorizar. O que seria do Algarve sem turismo? Contudo, pontualmente, ainda encontramos pessoas que, pasme-se, dizem que o turismo só traz coisas más para a região. É preciso, de facto, esclarecer, é preciso que estas pessoas tenham, efetivamente, uma consciência informada, crítica certo, mas informada sobre aquilo que é o contributo do setor e aquilo que o setor faz pela região.
E aqui, recordo a célebre frase do nosso decano, Vítor Neto: “Não há turismo a mais, há as outras atividades a menos”. E não esqueçamos que o turismo alavanca outros setores. Quando estamos a promover os nossos produtos endógenos, promovemos a agricultura, quando damos a conhecer o território, proporcionamos o surgimento de novos negócios e de novos serviços.
E é bom que isso continue a acontecer na região. Não nos esqueçamos do que aconteceu com a pandemia, quando deixámos de ter turismo de um dia para o outro e os impactos que teve nos negócios, nas pessoas. E não foi há muito tempo.