“Durante o mês de agosto tive uma semana muito difícil. Voltaram os pensamentos, sem causa, e estive muito perto de fazer uma asneira. Era muito sofrimento. Veja que cheguei a escrever duas cartas para os meus filhos… queria que eles soubessem que lutei muito.”

Estas palavras foram ditas ontem, durante uma consulta de psicologia, por alguém que sofre, mas que conseguiu pedir ajuda profissional.

Hoje, Dia Internacional da Prevenção do Suicídio, é essencial recordarmos que este é um problema de saúde pública de enorme gravidade e urgência. Todos os anos, mais de 700 mil pessoas morrem por suicídio em todo o mundo. Em Portugal continuam a ocorrer, em média, três suicídios por dia, com números que se mantêm mais elevados do que em qualquer outro país do sul da União Europeia. Por cada morte, centenas de familiares, amigos e profissionais de saúde são profundamente afetados.

O suicídio é evitável. A evidência científica demonstra que a prevenção salva vidas e tem um elevado retorno social e económico. Investir em programas de prevenção universais, em escolas e comunidades, é prioritário. A implementação de intervenções psicológicas específicas, como planos de segurança e terapias baseadas na evidência, previne tentativas e reduz significativamente o risco de morte.

Mas prevenir exige escolhas políticas claras. É urgente reforçar o número de psicólogos no SNS e nas escolas e dessa forma cumprir os rácios desejáveis: um psicólogo por cada cinco mil utentes no SNS e um por cada 500 alunos nas escolas. Sem profissionais suficientes não conseguimos identificar precocemente sinais de risco, intervir em situações de crise ou apoiar as pessoas que perderam alguém por suicídio. Não é aceitável que continuemos a falhar em garantir acesso a cuidados psicológicos atempados e de qualidade.

Neste contexto, é crucial destacar a criação da Linha de Prevenção do Suicídio, que entra em funcionamento hoje, e representa uma ação efetiva para o acesso a ajuda especializada e, por consequência, um passo determinante para a prevenção do suicídio. Disponibilizar um canal acessível, especializado e gratuito de apoio imediato pode salvar vidas, reduzir o isolamento e garantir uma ponte essencial para o acesso a cuidados psicológicos.

A prevenção do suicídio exige também políticas públicas que vão além da saúde. Promover medidas que mitiguem fatores de risco, como o desemprego, a pobreza, a solidão ou o acesso facilitado a meios letais. É fundamental investir em políticas sociais de proteção do rendimento, habitação digna, apoio psicossocial comunitário e em estratégias que promovam a coesão social.

O papel que os media desempenham é também decisivo. A forma como comunicamos sobre o suicídio pode salvar vidas ou, pelo contrário, aumentar o risco. É responsabilidade coletiva garantir uma comunicação responsável, baseada na ciência psicológica e que promova a literacia em saúde mental. Comunicar mensagens de empatia, esperança, e com recursos para solicitar ajuda são determinantes.

Prevenir o suicídio é uma responsabilidade coletiva. Requer coragem política, investimento sustentado e compromisso social. Mais do que números, falamos de vidas humanas que podemos salvar. Hoje, lembramos que cada morte é evitável e que o silêncio, o estigma e a falta de ação são inaceitáveis. É tempo de agir.

Alexandra Antunes é psicóloga especialista em Psicologia Clínica e da Saúde e em Educação. Psicóloga no Hospital Pedro Hispano (Unidade Local de Saúde de Matosinhos), é vice-presidente da Ordem dos Psicólogos Portugueses.

Mental é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com a Saúde Mental.
Resulta de uma parceria com o Hospital da Luz e com a Johnson & Johnson Innovative Medicine e tem a colaboração do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos e da Ordem dos Psicólogos Portugueses. É um conteúdo editorial completamente independente.

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