Num resultado apertado mas simbólico, uma maioria de eurodeputados rejeitou, esta quarta-feira, um parágrafo de uma resolução parlamentar que expressava apoio ao acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul. A decisão antecipa um debate aceso no Parlamento Europeu sobre um pacto que divide opiniões desde a sua assinatura, em dezembro de 2024.
A votação por levantamento de mãos em Estrasburgo revelou que 269 eurodeputados votaram contra o trecho, enquanto 259 votaram a favor, uma diferença de apenas 10 votos. A secção contestada da resolução, inserida na estratégia política da UE para a América Latina, elogiava a conclusão das negociações do acordo.
“Mais uma vez, o Parlamento Europeu expressa o seu ceticismo relativamente ao acordo comercial com o Mercosul”, afirmou o eurodeputado francês Pascal Canfin (Renew) num post no LinkedIn. “O sinal político é muito claro: há mais eurodeputados com dúvidas profundas sobre os méritos deste acordo do que aqueles que querem a sua adoção imediata.”
A Comissão Europeia, que liderou mais de duas décadas de negociações, submeteu o acordo à ratificação do Conselho e pediu o consentimento do Parlamento Europeu a 3 de setembro. No entanto, persiste a incerteza sobre se a última etapa deste processo avançará sem obstáculos.
O acordo liberaliza o comércio entre os países do Mercosul — Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai — e a UE, reduzindo tarifas em diversos produtos, incluindo alguns agrícolas. Esta situação tem gerado preocupações significativas entre agricultores europeus, que receiam competir em desigualdade com produtores latino-americanos.
No Parlamento, um grupo de eurodeputados prepara uma resolução para solicitar ao Tribunal de Justiça da UE que suspenda a aprovação do acordo. Entre as preocupações está o risco de incumprimento por parte dos países do Mercosul em relação às normas fitossanitárias e ambientais europeias.
A eurodeputada espanhola Irene Montero (The Left), que impulsionou a votação desta quarta-feira, sublinhou em declarações à Euronews: “Este acordo abandona a agricultura e a pecuária, prejudica o ambiente, alimenta o desflorestamento e abre o tapete vermelho às multinacionais extractivas. Vamos continuar a lutar para garantir que este acordo não seja ratificado e para travar o perigo que representa para o ambiente e para o nosso setor primário.”
Os defensores do pacto sublinham que este cria uma área de livre comércio de 700 milhões de pessoas, representando uma oportunidade estratégica para a UE. Argumentam que o acordo é essencial para enfrentar a concorrência chinesa nos países do Mercosul e diversificar parceiros comerciais, especialmente num contexto em que os Estados Unidos aumentam barreiras tarifárias ao seu mercado.
A secção rejeitada da resolução destacava que o acordo seria um “verdadeiro divisor de águas na relação entre as duas regiões”. Acrescentava ainda que seria o maior acordo comercial alguma vez assinado pela UE em termos populacionais, abrangendo mais de 700 milhões de cidadãos, e “o mais significativo em termos de impacto económico”.
Da mesma forma, o texto salientava o “valor geopolítico” do pacto como “uma ferramenta essencial para avançar os interesses estratégicos da UE no atual contexto internacional”.