Letitia James, a procuradora-geral de Nova Iorque, foi nesta quinta-feira, 9 de Outubro, formalmente acusada de fraude bancária e declarações falsas, semanas depois de o Presidente norte-americano, Donald Trump, ter exigido à procuradora-geral dos Estados Unidos, Pam Bondi, que tanto a magistrada como o antigo director do FBI, James Comey, fossem levados à justiça.

James, a procuradora, é acusada de ter falsamente declarado uma segunda habitação como residência primária, beneficiando de condições especiais no crédito à habitação reservadas a residência própria e permanente, que lhe terão valido uma poupança de 19 mil dólares.

A procuradora nova-iorquina, responsável pelo processo judicial que terminou em 2024 na condenação, por fraude, de Trump e dos seus filhos e empresas do ramo imobiliário, reagiu entretanto nas redes sociais e declarou que a acusação que enfrenta é “nada mais do que a continuação da instrumentalização desesperada do sistema de justiça pelo Presidente”.

“Estas acusações não têm fundamento, e as próprias declarações públicas do Presidente tornam claro que o seu único objectivo é a vingança política a qualquer custo. As acções do Presidente são uma violação grave da nossa ordem constitucional e suscitaram duras críticas de membros de ambos os partidos”, acrescenta James.

No processo de 2023, a família Trump e as suas empresas foram declaradas culpadas de mentir sobre o valor do seu património, inflacionando-o para obter empréstimos vantajosos junto de bancos e ocultando-o para pagar menos impostos, lesando o Estado e as instituições financeiras em centenas de milhões de euros. Os arguidos foram temporariamente proibidos de exercer qualquer actividade comercial em Nova Iorque. Em 2024, durante a campanha presidencial, Trump tinha já declarado que James “devia ser presa e punida”.

Perseguição a adversários

A acusação agora movida contra James é semelhante à que enfrenta Lisa Cook, governadora da Reserva Federal e outro alvo da ira de Trump, que pretende alterar a composição do regulador bancário e financeiro norte-americano.

Ambos os casos partiram de averiguações conduzidas por uma agência federal de regulação do crédito à habitação, actualmente liderada por Bill Pulte, um aliado de Trump que tem recorrido às redes sociais para dirigir acusações contra adversários do Presidente, e foram investigados pelo procurador Ed Martin, outra figura próxima de Trump que, no início do ano, ficou conhecido por ameaçar processar críticos do republicano e de Elon Musk nas redes sociais, incluindo políticos democratas. É contudo a procuradora Lindsey Halligan, ex-advogada de Trump de 36 anos, a assinar a acusação contra James.

James e Cook fazem parte de uma lista de indivíduos tidos como críticos de Trump, ou que no passado protagonizaram polémicas e processos contra o republicano, e que agora enfrentam acusações criminais movidas a pedido do Presidente. Nesta semana foram também formalizadas acusações por perjúrio e obstrução ao Congresso contra Comey, o antigo director do FBI que em 2017 abriu uma investigação às suspeitas de conluio entre o regime russo e a campanha eleitoral de Trump. Comey acabou por ser demitido nesse ano por Trump, por ter recusado arquivar o inquérito e por ter negado um pedido de juramento de fidelidade pessoal ao Presidente.

John Bolton, antigo embaixador e ex-conselheiro de segurança nacional de Trump, entretanto tornado seu crítico, é também por estes dias alvo de investigações à suspeita de posse e divulgação indevidas de documentos confidenciais. Outros alvos na mira do Departamento de Justiça são o senador democrata californiano Adam Schiff, o ex-director da CIA John Brennan e a procuradora distrital da Georgia Fani Willis, responsável pelo processo, entretanto arquivado, em que Trump foi acusado de tentar manipular resultados eleitorais.

Na quarta-feira, Trump sugeriu ainda a detenção do governador do Illinois, J.B. Pritzker, e do mayor de Chicago, Brandon Johnson, pela oposição destes a uma intervenção militar na cidade. É contudo a acusação contra Letitia James que se destaca de momento, pelo facto de ser a primeira desta vaga a ser formalizada contra uma alta responsável judicial em funções.

“É este o aspecto da tirania”, declarou em comunicado, citado pelo New York Times, o senador democrata de Nova Iorque, e líder da minoria democrata no Senado, Chuck Schumer. “O Presidente Trump está a utilizar o Departamento de Justiça como o seu cão de ataque pessoal”, acrescentou, em reacção à acusação contra a procuradora-geral do seu estado.