Gian Piero Gasperini deixou a Atalanta, onde esteve nove anos, e assinou pela Roma em junho – Foto: IMAGO
Gian Piero Gasperini deixou a Atalanta, onde esteve nove anos, e assinou pela Roma em junho – Foto: IMAGO
Claudio Ranieri admitiu que não simpatizava com ele, mas era o perfil de treinador de que o clube precisava. Adaptou-se ao estilo defensivo, mas impôs o seu modelo. Desde Maradona que não se via a Serie A assim
Em Roma, sê romano. O adágio popular pulula pelas cabeças de todos os que jogam, treinam e gritam por um dos dois grandes clubes da capital italiana que nos últimos anos, por força de orçamentos mais espartanos, tem promovido um futebol (ainda) mais defensivo. José Mourinho, que venceu uma UEFA Conference League pela Roma e foi à final da Europa League, já explicou que foi a melhor forma de conseguir competir com adversários mais gastadores.
Essa foi a lógica que levou os donos norte-americanos do emblema a retirarem Claudio Ranieri da reforma, corria o mês de novembro de 2024. Com dois objetivos: estancar feridas, tirar a equipa de lugares perigosos e preparar a sucessão, já como conselheiro principal de Dan Friedkin.
No campo, correu tudo bem e melhor do que se esperava: a Roma terminou em 5.º lugar, a um ponto do acesso à Champions; fora de campo, Ranieri tomou uma decisão arrojada: em junho foi buscar um treinador cujo estilo de jogo está nos antípodas do ranierismo e que era considerado pelo próprio e pelos adeptos como «antipático». Mas era justamente o que os giallorossi precisavam, como sublinhou o agora advisor: «Um homem que está sempre irritado, que quer sempre melhorar, que é honesto e diz as coisas na cara, mesmo que às vezes de forma bruta.»
Mas a mente de estratega de Gasperini não se esgota na obra de autor que promoveu em nove anos na Atalanta: a capacidade de se adaptar e «sair da zona de conforto», como o próprio fez referência na sua apresentação, é outra forma de inteligência. É isso que se tem assistido nos primeiros capítulos da nova história: o técnico de 67 anos não prescinde da marcação homem a homem e da pressão asfixiante que influenciaram a nova geração de treinadores italianos (como Francesco Farioli) mas não eliminou a força motriz de tração atrás que vinha de Ranieri. Um modo híbrido que está a trazer resultados.
Os números mostram-no: apenas dois golos sofridos e só sete marcados em seis jogos na Serie A, 15 pontos conquistados em 18 possíveis e liderança partilhada com o Nápoles, coisa que não sucedia desde 1989/90, no tempo de Maradona nos azzurri do Sul de Itália.
Vitórias magras, portanto (só com o Verona triunfou por mais de um golo), mas seguras. Muita solidez nas transições defensivas, equipa sempre equilibrada e uma «nova mentalidade» dos jogadores na forma de procurarem os espaços ofensivos.
A proeza ganha maior expressão quando se analisa a lista dos melhores marcadores: os pontas de lança Artem Dovbyk e Evan Ferguson somam apenas um golo marcado em conjunto e o extremo Matías Soulé é o artilheiro, com três golos, o culpado pelo menor tempo de utilização de Paulo Dybala, que aos 31 anos revela dificuldades em adaptar-se ao 3x4x2x1 de altíssima intensidade.
Há 12 anos (10 de novembro de 2013) que a Roma não ocupava o primeiro lugar do campeonato e todos na cidade percebem que Gasperini é o grande responsável pela mudança. «Tem uma ética de trabalho excecional», diz o patrão, Dan Friedkin. Afinal, está a trabalhar com um esquema tático que tinha de trás e o plantel não teve muitas mexidas. Leon Bailey, contratado ao Aston Villa, lesionou-se com gravidade no primeiro treino, pelo que a grande contratação acabou por ser a permanência de Lorenzo Pellegrini, que estava de malas aviadas mas foi convencido pelo treinador a ficar – e foi ele a decidir o dérbi com a Lazio, a 21 de setembro, apontando o único golo do jogo.
Sem muitas opções no banco é provável que seja uma questão de tempo até a Roma começar a vacilar, tendo já na próxima jornada um grande teste frente ao Inter, no Olímpico. Mas por enquanto os romanos vão degustando uma sensação rara. Em fim de semana sem campenato é o melhor dolce far niente que se pode ter.
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