De T-shirt vermelha e calças pretas, Delta Freitas, 50 anos, não para, — é a dona da cozinha. “Aqui ninguém entra, só eu”, graceja a proprietária do Pura Vida Regional. O restaurante abriu há dois anos e meio, na urbanização de Vila Chã, freguesia da Mina de Água, em Lisboa.

Madeirense do Funchal, Delta já está no continente há 25 anos, quando fugiu de um casamento que acabara de terminar. “Sempre sonhei ter um restaurante e pensei que só faria sentido se fosse de comida madeirense”, diz a empresária, orgulhosa das suas raízes.

Delta não é, porém, uma novata no setor. “Nunca tinha tido um negócio meu, mas antes fui responsável por uma cadeia de restauração rápida. Por isso, já estava totalmente por dentro da gestão de um restaurante, controlo de custos e atendimento ao cliente”, explica à New in Amadora.

O Pura Vida Regional em Vila Chã.

“Como moramos aqui perto, em Alfornelos, surgiu esta oportunidade aqui, em Vila Chã. É um bairro tranquilo, com um poder de compra um bocadinho mais alto, achámos que seria uma boa escolha”, afirma, justificando o uso do plural com o facto de ter refeito a sua vida afetiva já no continente, de onde nasceu a sua única filha, hoje com dez anos.

O Pura Vida continua a crescer, mas, garante a proprietária, “está a correr muito bem”. “Já temos uma série de clientes fidelizados, que vêm de Setúbal, Santarém, da zona de Lisboa. Gente que vem, gosta e repete, o que é a melhor notícia para nós, e gente nova que vem à descoberta”.

Metade da clientela da casa é madeirense ou tem ligações à Madeira. “Mas há muita gente que não tem, e que foi aqui que comeu os primeiros pratos típicos madeirenses, até porque não há no continente, tirando os centros comerciais, muitos exemplos de comida madeirense”.

Delta define o negócio como um restaurante familiar. “Os nossos clientes gostam da proximidade do nosso atendimento e da qualidade da comida”, assegura.

Os bestsellers da Madeira

Quinta-feira, 9 de outubro, 14 horas. A sala interior do restaurante — também há esplanada — está ainda bem composta. Sobram três mesas vazias, e uma delas, percebe-se, já foi usada.

“São duas espetadas e um espada com banana”, pede, pela janelinha da cozinha Paula Costa, colaboradora do restaurante, que faz o atendimento às mesas. “Está cá desde o início, mas já trabalhamos juntas há mais de 20 anos”, conta à NiA.

Delta parece uma máquina — nunca para. O espaço da cozinha é pequeno, mas a cozinha está toda preparada. Enquanto a frigideira está em lume forte, sem nada lá dentro, passa por ovo e farinha dois lombos de peixe-espada, que vão finalmente a fritar. Numa outra frigideira, mais pequena, abre uma banana madeirense, parte-a ao meio longitudinalmente, e põe as duas metades a grelhar.

“Trata-me do bolo de caco, por favor”, pede a proprietária à colega. Dois minutos depois, ele lá surge, quentinho, com manteiga de alho. É lá que Delta faz repousar um bife acabado de grelhar, um ovo estrelado bem-passado e umas batatas fritas caseiras, ainda a ferver. “Temos um cliente que adora o nosso prego madeirense”, justifica.

O peixe-espada com banana frita está pronto. O molho de maracujá é servido à parte, com legumes estufados acompanham a iguaria. Seguem-se as espetadas em pau de louro, o ex-libris da gastronomia madeirense.

“Os nossos bestsellers são a espetada em pau de louro (15€), claro, o espada com banana (14,5€) e o bife de atum com milho frito (13,5€), que é também muito apreciado”, revela a madeirense. Para si, a escolha é óbvia: “o meu prato favorito é a espetada em pau de louro, comida à mão, com o molho a escorrer para o bolo do caco”, diz. “Já marchava agora uma”, confessa.

Primeiro susto aos três anos

O milho frito, uma pasta de polenta cozinhada e depois frita, não pode faltar numa boa cozinha da Madeira, e no Pura Vida também não. “Cuidado que está a ferver”, avisa, enquanto nos estende um pedaço de milho frito. Confirma-se a temperatura elevada, mas o sabor está todo lá.

Delta sempre gostou de cozinhar. “O meu fascínio começou cedo. Sempre fui muito curiosa e olhava para a minha mãe, avós e tias, que cozinhavam ainda à moda antiga e tudo aquilo me fascinava. Lembro-me que tinha para aí sete ou oito anos e íamos a uma zona mais a norte da ilha fazer pão embrulhado em folha de couve. Aqueles sabores, aqueles cheiros, não me saem da cabeça”, recorda à NiA.

O milho frito não pode faltar.

Diz a sabedoria popular que “a curiosidade matou o gato”, mas, neste caso, escaldou. “Tive um incidente na cozinha quando tinha três anos, portanto, o meu fascínio pela cozinha começou cedo. Antes do milho ir a fritar, é cozinhado numa papa. A curiosidade levou-me a pôr lá o dedo e queimei-me. E não foi apenas o dedo, mas já passou”, brinca. “Serviu de exemplo, mas podia ter ficado traumatizada. Felizmente não aconteceu, e adoro cozinhar”, assegura.

Os pedidos continuam a surgir da sala de refeições. “É sempre assim, nunca paramos”, diz. Aos fins de semana servem 60, 70 refeições por dia, divididas entre almoços e jantares. “Mas tudo depende se temos festas de grupo ou não. Já tivemos 40 pessoas só de um grupo. Ao dia de semana, também corre bem, mas são menos. Estamos com uma pessoa de baixa, portanto nesta fase, durante a semana só trabalhamos almoços. Mas a ideia é voltarmos aos jantares também”, revela, acrescentando que o Pura Vida encerra ao domingo.

A empresária é uma mulher orgulhosa das suas raízes. “E a nossa filha que nasceu cá, também. A maioria da minha família está lá na Madeira, vamos lá muito e ela adora. Aliás, agora nas férias de verão, ela esteve cá a ajudar-me no restaurante, porque queria conhecer as coisas por dentro. Ela é uma apaixonada pela ilha”.

No Pura Vida só entram produtos da Madeira. “Temos a poncha à regional, que é leve, mas se me pedirem a mais forte, de limão ou de tangerina, também temos. A cerveja oficial é a Coral, mas temos outras marcas nacionais engarrafadas, para quem preferir. E, claro, temos Brisa Maracujá”, enumera.

A loja Produtos da Madeira, ali perto, no Casal de São Brás, é um dos fornecedores de Delta. “Eles são excelentes, têm produtos de grande qualidade, também são madeirenses, pessoas cinco estrelas, gostamos muito deles. Aliás. Até acho que vocês já fizeram lá uma reportagem”, diz. Confirma-se.

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