O histórico Palácio Valadares, no Chiado, está no centro de uma polémica: condóminos acusam o Estado e o Grupo Pestana de avançarem com obras sem consulta, colocando em risco abóbadas centenárias para instalar uma Pousada de Portugal.
As denúncias dos proprietários
Um dos condóminos do Palácio Valadares, edifício urbano situado na Calçada do Sacramento, n.º 24 a 52, e Largo do Carmo, n.º 32, acusa o Estado e o Grupo Pestana de atropelarem a lei e ignorarem a salvaguarda do património.
“Apesar do título constitutivo do prédio prever a restrição de uso como Escola, o Grupo Pestana não contactou os condóminos para qualquer alteração. Nenhum de nós foi consultado”, denuncia o proprietário.
Segundo o mesmo, o projeto em análise na Câmara Municipal de Lisboa prevê a destruição de abóbadas históricas no rés-do-chão — uma zona que é parte comum do edifício — para instalar um elevador de saída de resíduos. “Não se compreende que a Câmara possa autorizar semelhante atentado, quando o edifício é classificado e integra o património municipal”, acrescenta.
Um percurso marcado por contradições
O Palácio Valadares, com inscrição anterior a 1951 e registado na Matriz Predial Urbana em 1988, tem uma área de terreno de 2.230 m² e uma implantação de 1.490 m². Transformado em propriedade horizontal, conta com 11 frações autónomas.
A fração correspondente ao 1.º, 2.º e 3.º andares foi transmitida ao Estado com a condição de se manter como estabelecimento de ensino. Mais tarde, passou da Parque Escolar para o Ministério das Finanças através de dação em pagamento (2012). Posteriormente, o Estado arrendou a fração ao Grupo Pestana por contrato de longa duração, prorrogável até 50 anos, para ali instalar uma Pousada de Portugal.
Obras sem licença e queixas ignoradas
Os condóminos dizem ter ouvido ruído de martelos e rebarbadoras nos últimos dias, indiciando que a obra já terá começado. No entanto, a licença ainda não foi aprovada.
“Foi feita uma queixa à fiscalização da Câmara Municipal no dia 25 de setembro, mas não houve qualquer resposta até agora”, relata a única moradora permanente do edifício.
Vários condóminos admitem avançar com uma providência cautelar (embargo de obra nova), caso a autarquia aprove o projeto. Contudo, alertam para os custos judiciais elevados, proporcionais ao valor patrimonial e financeiro do imóvel. “Este é o ónus que recai sobre nós: ter de defender em tribunal o património que o Estado não respeita. E o peso financeiro pode dissuadir os particulares de agir. É com isso que provavelmente contam”, lamenta o condómino.
Silêncio das entidades envolvidas
O Diário do Distrito tentou obter esclarecimentos junto da Câmara Municipal de Lisboa, do Ministério das Finanças, da Direção-Geral do Património Cultural, da Direção-Geral do Tesouro e Finanças e do Grupo Pestana.
Até ao momento da publicação, nenhuma entidade respondeu aos pedidos de informação, em especial a Câmara Municipal de Lisboa e o Grupo Pestana, diretamente visados pelas denúncias.