Era 1935, e Erwin Schrödinger já estava farto de ler bobagens. Menos de uma década havia se passado desde o nascimento da mecânica quântica moderna, mas o mundo já estava cheio de delírios pseudofilosóficos sobre o que a realidade realmente era. Foi então que Erwin descobriu decidiu nos contar sobre seu gato.

O Gato de Schrödinger

Um gato, uma caixa opaca selada e, além disso, um recipiente com gás venenoso. O recipiente em questão é controlado por um dispositivo de abertura que só funciona se uma partícula radioativa decair dentro de um determinado período de tempo. Após esse período, a probabilidade de o gato estar morto é de 50%, e a probabilidade de ele estar vivo também é de 50%. “Se não abrirmos a caixa, o gato estará vivo e morto ao mesmo tempo”, diz a versão padrão desse “paradoxo”. Ou, em outras palavras, poderíamos ficar tranquilos: enquanto não abríssemos a caixa, o gato não estaria realmente morto. Segundo muitas interpretações, na verdade, a pessoa que abrisse a caixa seria a “responsável” pela morte do gato.


(Imagem: Fuzzy Guerdes/Flickr)

Um grupo de pesquisadores da Universidade de Berkeley (Califórnia, Estados Unidos) tinha suas questões sobre o assunto. Há alguns anos, sabia-se que faltava uma peça-chave para a compreensão do processo de desintegração molecular. Ou seja, “a capacidade de partículas individuais de decair é bem conhecida” (este é, por exemplo, o fato físico por trás do carbono-14); só que, de acordo com o que sabíamos sobre física, esse não poderia ser o caso. As partículas não deveriam ter decaído.

Entre 1984 e 1985, John Clarke, Michel H. Devoret e John M. Martinis realizaram uma série de experimentos com um circuito elétrico fechado usando supercondutores e mostraram que, bem, Schrödinger estava errado. A intenção do experimento mental com o gato era “demonstrar o absurdo dessa situação, já que as propriedades especiais da mecânica quântica geralmente desaparecem em escala macroscópica. As propriedades quânticas de um gato completo não podem ser demonstradas em um experimento de laboratório”.

Entretanto, como os três pesquisadores conseguiram demonstrar que as propriedades muito estranhas do mundo quântico também podem ser vistas em um sistema maior, nada disso é tão claro. Isso é bem explicado por pessoas como Anthony Leggett, vencedor do Nobel de Física de 2003, porque, embora “um sistema macroscópico composto de vários pares de Cooper ainda seja muitas ordens de magnitude menor que um gatinho”, a chave do experimento é que “há fenômenos envolvendo um grande número de partículas que, como um todo, se comportam exatamente como a mecânica quântica prevê”.

Um Nobel por “matar” a teoria do gato

“Você ficaria incrivelmente surpreso se a bola aparecesse de repente do outro lado da parede. Na mecânica quântica, esse tipo de fenômeno é chamado de tunelamento, e é precisamente o tipo de fenômeno que lhe deu a reputação de ser estranho e contraintuitivo”, explicou o comitê do prêmio. Foi exatamente isso que esses pesquisadores mostraram que poderia acontecer no nível macroscópico.


Exemplo de um tunelamento quântico (Imagem: Brasil Escola/Reprodução)

Mas esses cientistas fizeram algo mais do que contradizer o famoso “Gato de Scrödinger”. E não estamos falando apenas de lançar as bases que nos permitiram criar o sistema tecnológico que conhecemos hoje: dos transistores nos microchips de computador que vemos em todos os lugares à criptografia quântica. Estamos falando também de apagar a barreira que separava o mundo do muito pequeno do mundo que conhecemos hoje.

Ao longo do caminho, eles “mataram” a teoria do experimento do gato mas, pela brecha que abriram, um pouco da melhor ciência que temos se infiltrou. Esse feito de John Clarke, Michel H. Devoret e John M. Martinis rendeu a eles o Prêmio Nobel de Física de 2025.

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