O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, afirmou recentemente que a Europa se tornou “irrelevante” no processo de paz no Médio Oriente, refletindo a marginalização da União Europeia nas negociações cruciais sobre Gaza. Após o cessar-fogo mediado pelos EUA, Qatar, Egito e Turquia, salientou a publicação ‘Euronews’, surge agora a questão sobre se o bloco europeu conseguirá recuperar influência e desempenhar um papel significativo na reconstrução e estabilidade do território palestiniano.
União Europeia reforça apoio à reconstrução de Gaza
A Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, manifestou total apoio da UE ao plano de paz, garantindo que o bloco contribuirá com fundos para a reconstrução da região e disponibilizará todos os instrumentos necessários para apoiar o processo. Von der Leyen anunciou também a criação de um grupo especial de doadores destinado a coordenar e financiar a reconstrução em grande escala, reunindo esforços internacionais num único mecanismo para assegurar transparência e eficiência no uso dos recursos.
Além disso, Bruxelas planeia reiniciar uma missão civil de controlo do posto fronteiriço de Rafah, entre Gaza e o Egito, em apoio ao acordo de cessar-fogo, uma medida que pretende consolidar a segurança e facilitar a entrega de ajuda humanitária essencial. Com grande parte das infraestruturas destruídas, especialistas estimam que a recuperação poderá demorar décadas e custar milhares de milhões de dólares. Um relatório conjunto da UE, Banco Mundial e Nações Unidas projetava custos de 53 mil milhões de dólares, com necessidades imediatas nos primeiros três anos avaliadas em 20 mil milhões de dólares.
Limitações da influência europeia
Apesar destes esforços, a União Europeia enfrenta um cenário complicado. Netanyahu destacou a irrelevância europeia durante as negociações, apontando que a presença da UE nos mecanismos de implementação do plano de paz é mínima. A segunda fase do plano americano prevê a criação de um órgão de governação em Gaza, excluindo o Hamas, o envio de uma força multinacional e o desarmamento da organização, mas sem referência direta a países europeus.
A supervisão e implementação do plano ficará sob um Conselho de Paz liderado pelos Estados Unidos, com a participação de peritos internacionais e palestinianos. Entre os nomes citados, não há representantes da UE, o que reforça a perceção de marginalização do bloco europeu no processo político do Médio Oriente. A Força Internacional de Estabilização, que será destacada para Gaza, contará principalmente com Egito, Qatar e Turquia, deixando a Europa de fora do cenário de influência direta.
Oportunidade e desafios para o bloco europeu
Especialistas sublinharam que a União Europeia ainda pode exercer influência através da ajuda económica e humanitária, especialmente se conseguir alinhar os seus fundos com os esforços internacionais de reconstrução e governança local. Rym Montaz, do grupo de reflexão Carnegie Europe, defendeu que este é o momento para o bloco maximizar a sua capacidade de moldar o fim da guerra e estabilizar politicamente a região. Liel Maghen, do Instituto Mitvin, acrescentou que a criação de um fundo específico para Gaza permitiria integrar os recursos europeus no plano de reconstrução e garantir uma aplicação eficiente dos fundos.
No entanto, a crítica permanece: sem presença direta nas negociações e sem participação ativa no conselho de governação de Gaza, a Europa corre o risco de ver os seus esforços de reconstrução limitados em impacto político. A eficácia da ajuda poderá depender tanto da gestão financeira quanto da capacidade do bloco em negociar espaço político num território dominado por atores externos.
A União Europeia enfrenta um paradoxo: possui recursos financeiros significativos e expertise humanitária, mas continua à margem do processo decisório que determinará a governação e a paz em Gaza. Para recuperar relevância, o bloco deverá não apenas canalizar fundos de forma eficiente, mas também assumir uma posição diplomática mais ativa nas negociações multilaterais. Só assim a Europa poderá traduzir os investimentos na reconstrução em influência política duradoura no Médio Oriente, evitando repetir a marginalização destacada por Netanyahu.