OBS: Não pude deixar de notar nos cartazes que têm afixados nas ruas. Há uma diferença substancial em relação a cartazes do Chega que se veem noutros concelhos. “Vamos Limpar a Amadora” ou “Tornar Faro Grande Outra Vez”, por exemplo. Aqui é diferente, os cartazes dizem “Vamos Mudar Albufeira” ou “Nós Resolvemos”. Esta diferença de tom foi propositada? É uma diferença que tem em relação aos restantes membros do partido?
RC: Todos os candidatos são pessoas diferentes. Eu tenho a minha maneira de pensar, de fazer política, os outros candidatos têm a maneira deles. E eu personalizei esta candidatura mais com o meu pensamento, com a minha visão relativamente a este concelho. É unicamente devido a isso. Cada um fez a sua análise do concelho a que era candidato, eu conhecendo bem o concelho de Albufeira como conheço, sabendo quais eram as necessidades, adaptei a minha campanha às verdadeiras necessidades das pessoas. Não estou a fazer qualquer crítica aos meus colegas, apenas a dizer que cada um personificou, personalizou a sua campanha. Eu personalizei desta maneira, da maneira que eu achava que era a mais correta.
OBS: O Rui Cristina acabou por vencer. Não foi o caso na maioria dos concelhos do país, para o Chega. Acha que isto pode ter feito diferença?
RC: Não sei. Ainda não pensei sobre o assunto, não refleti. Sei que me dediquei muito a esta campanha. Foram dias intensos, dias de proximidade, falando com as pessoas, ouvindo as carências. Isso é que eu sei. Dei tudo de mim a esta campanha.
Ainda que com um registo diferente dos cartazes do Chega no resto do país, linguagem menos populista e um foco maior em propostas concretas, nem todos estão convencidos. “Há bocadinho vinha para cá e vi ‘Problemas na Habitação: O Chega Resolve’”, diz Rosa. “Se calhar vou pedir uma casa”, ironiza. É uma das muitas jovens adultas a sofrer com a crise no setor.
“Isto é só o primeiro dia”, sublinha, “estou cá para ver”. Lembra que o partido trouxe várias promessas, e passou os últimos anos a criticar quem estava no poder – “mas agora vão ter de fazer”.
Bruno Monteiro, que assume admiração pelo papel desempenhado por André Ventura a nível nacional, não esconde apreço pelo executivo do PSD em Albufeira, liderado até aqui por José Carlos Rolo. Ainda assim, não tem dúvidas: “Se mudou é porque alguma coisa estava mal. É a democracia.” Também desconfia do impacto que o executivo camarário de Rui Cristina pode ter: “Eu antes conhecia-os. Assim fico um bocado desconfortável”. Acredita que a inexperiência pode ser o maior inimigo do Chega nesta nova fase do partido – “não tem unhas para agarrar” – e apela por isso ao diálogo com os sociais-democratas, para impedir bloqueios na Câmara Municipal. “Gostava que eles se entendessem”.
OBS: Já falou com José Carlos Rolo?
RC: O senhor Presidente da Câmara ligou-me logo na noite eleitoral, a parabenizar-me pela vitória, e eu agradeci-lhe.
OBS: E tem disponibilidade para trabalhar com ele ao longo destes próximos 4 anos? O Chega não conseguiu a maioria na Câmara Municipal, há disponibilidade para trabalhar com o PSD, que tem o mesmo número de vereadores?
RC: Não pensei nisso, ainda. Há uma coisa que me move: são as pessoas. Eu quero trabalhar para as pessoas, se vai haver ou não coligação é algo que eu não pensei. O que me move unicamente é assumir os compromissos que enunciei durante a campanha. Relativamente a coligações, é algo que neste momento não me passou pela cabeça. Vou começar a fazer uma análise macro, depois uma radiografia relativamente às maiores necessidades deste concelho e eu quero resolver os problemas das pessoas. É isso que me interessa neste momento.
OBS: O que lhe perguntava é se há disponibilidade no futuro, se põe a hipótese de, por exemplo, oferecer pelouros aos vereadores do PSD.
RC: É algo que ainda não pensei, muito sinceramente. Não equacionei, primeiro tenho de tomar posse, ver realmente em que estado é que se encontra esta Câmara Municipal, pedir para que seja feita uma auditoria financeira, para saber realmente o que foi feito e olhar para a frente. Depois é algo que eu decidirei mais à frente. Eu e a minha equipa.
E essa equipa, avisa Bruno Monteiro, tem de ser boa. “Senão, queimam-se já”. Há quem acredite que a tolerância para eventuais erros do Chega pode ser mais curta do que para as restantes forças políticas tradicionais. O partido pediu uma oportunidade, e tem agora um mandato para provar que a mereceu.
Numa mercearia na Baixa de Albufeira, Maria, de 58 anos, viu os resultados do Chega com surpresa. Como é unânime, espera que a mudança seja melhor. Gosta do autarca José Carlos Rolo (“uma boa pessoa”), mas acredita que os resultados podem servir de “chamada de atenção” para o PSD em Albufeira. “Isto não quer dizer que não voltem para lá daqui a quatro anos”, frisa, “mas alguma coisa tinha de mudar, e até pode ser saudável”.
Rui Cristina, eleito pelo Chega em Albufeira: “Aqui não haverá falhas”
Numa farmácia ali perto, uma funcionária da câmara (que não quis ser identificada) desabafa com a farmacêutica de serviço sobre os resultados da noite anterior. “Alguém tinha de fazer alguma coisa”, suspira. À saída, afirma que “era uma questão de tempo” até o Chega governar no Algarve. “Estava à espera porque nas últimas eleições eles já tinham tido um grande resultado. As pessoas não mostram descontentamento e depois calam-se logo a seguir”.
Ao contrário da maioria das pessoas com quem o Observador falou na segunda-feira – o que indica que as razões da mudança vão bem para lá desta questão em específico – esta mulher destaca os problemas com a imigração como potencial fator de crescimento do Chega em Albufeira. “Somos estrangeiros no nosso próprio concelho”, lamenta. Não sabe de cor o nome de Rui Cristina, mas ouviu-o o suficiente para o poder citar: “Este novo presidente diz que quer uma imigração regulada. E eu concordo”.
OBS: Já falou nos problemas da habitação e da saúde. Muitas pessoas que votaram em si esperam também políticas diferentes em relação à imigração. Como é que vai responder a esses apelos?
RC: Fica aqui bem claro, o Partido Chega não é contra a imigração. Nós queremos uma imigração controlada, regulada. Nós queremos é saber que quem entra neste país vem para trabalhar. Queremos saber qual é o seu cadastro. Não queremos cá criminosos. Queremos pessoas de bem. Como os portugueses também: emigraram nos anos 60, nos anos 70, nos anos 50, para fora de Portugal. Nós íamos para fora do país para trabalhar. É o que nós queremos aqui. Nós sabemos que há falta de mão de obra aqui na hotelaria, na restauração, e sabemos que alguma dessa mão de obra é necessária. Queremos é que venham para trabalhar e que respeitem rigorosamente a nossa cultura, da mesma maneira que os portugueses respeitaram quando foram além-fronteiras.