“Demónio vingativo”, de “personalidade tóxica”, um “predador”. É assim que Gabriel Mithá Ribeiro escolheu falar de André Ventura, num artigo de opinião publicado, nesta sexta-feira, no Observador, intitulado “André Ventura: Os 7 pecados mortais do predador narcísico”. No texto, o ex-deputado do partido de extrema-direita justifica a sua saída da Assembleia da República com, entre outros factos, o ter ficado de fora do governo-sombra anunciado por Ventura e atira com duras palavras contra o líder do Chega, que chega mesmo a comparar com José Sócrates.
Escreve Mithá Ribeiro que o líder do Chega “abusa de poder”, tem traços narcísicos (expressão que usa 21 vezes) e que é “o principal traidor da essência política do seu partido”. Em sete pontos, o ex-parlamentar também detalha a decisão de se desvincular do Chega.
Num primeiro ponto, acusa o líder do partido de “desprezo pelo ideal reformista”. Mithá Ribeiro começou por clarificar a diferença entre o programa do partido, referente ao que ele é, e o programa eleitoral, sobre o que o partido quer fazer. De seguida, acusou Ventura de ter “arruinado o projecto”, nunca o ter defendido publicamente e de apresentar “a sua lista de supermercado”, como alternativa, referindo-se às “100 Medidas de Governo”.
O homem que liderava o Gabinete de Estudos do partido também acusa o actual líder da oposição de inconsciência moral, negligência cívica, frieza, soberba, irresponsabilidade e imaturidade. Uma das denúncias mais frequentes é o facto de considerar Ventura narcisista e de este manter uma posição autoritária na liderança do partido. No artigo, conta um episódio em que procurou falar de racismo “à revelia da vontade do André” e terá sido aconselhado a não o fazer novamente “por causa do risco de ser uma nova Joacine”.
Mithá Ribeiro terá ficado a saber através da comunicação social que foi afastado da coordenação do Gabinete de Estudos, depois de ter assumido uma posição de discordância para com André Ventura. Foi nesse momento que considerou que não “fazia sentido continuar vice-presidente” de quem o “defenestrava”. E considerou “violada a [sua] condição soberana de deputado”, assumindo aquele momento como “o escalar da caçada psicológica pelo indomável predador narcísico”.
O governo-sombra de André Ventura — anunciado em Maio como “um governo alternativo pronto para qualquer momento em que os portugueses sejam chamados às urnas” e que viria “fiscalizar a actividade do Governo nas várias áreas” — foi claramente a última gota da relação de Mithá Ribeiro com o Chega e o seu líder.
O ex-deputado fala desse governo alternativo como “aquilo que seria o milagre-Ventura”, mas “não foi”, e que este se assemelha mais ao “resultado de um jantar ocasional de amigos”. Para além disso, acredita que a lista é “a repetição do mesmo perfil de ministros dos últimos cinquenta anos, todos sem evidências empíricas vividas”, nomeadamente ao nível da Educação, pasta que queria e para a qual foi preterido face a Alexandre Franco de Sá.
Mithá Ribeiro fala ainda do Chega como um partido “cada vez mais disfuncional no sentido patológico do termo” e de André Ventura como alguém que “não compreende a essência ideológica do seu próprio partido”, que “prefere prejudicar uma sociedade inteira a correr o risco de expor o seu ego ao desconhecimento de determinada matéria” e que entregar poder a alguém assim é “construir um muro de betão contra o uso social da razão”.
Mithá Ribeiro foi eleito deputado na XV, XVI e XVII legislaturas, todas as vezes pelo círculo de Leiria, tendo sido reconduzido como secretário da mesa da Assembleia da República em Junho passado, depois das eleições legislativas antecipadas. No Verão de 2022, saiu da vice-presidência do partido, depois de ter sido afastado do cargo de coordenador do Gabinete de Estudos do Chega por André Ventura. Já em Setembro último, três dias depois de ter sido anunciado o governo-sombra, renunciou ao mandato de deputado, tendo sido substituído por Rui Fernandes.