O PSD está a tentar fechar acordos com o Chega para executivos camarários e de juntas em alguns dos municípios mais importantes do país. Em Gaia, o vereador do partido liderado por André Ventura confirma que foi abordado e irá reunir-se com equipa de Luís Filipe Menezes, enquanto em Sintra está a haver negociações, mas Marco Almeida nunca traçou linhas vermelhas. Mas há um problema: a Iniciativa Liberal fez parte de várias coligações e recusa estar em Executivos locais com o Chega — o que pode implicar com maiorias.

A última semana tem sido de agitação a nível local, principalmente em autarquias onde o PSD não tem maioria e pode contar com o Chega para completar o executivo — locais em que os vereadores desta cor política são peça-chave. Começando pelos assuntos que, à partida, estão tratados, nas duas principais câmaras do país a questão não se coloca, já que a governação em minoria surge como a solução: Carlos Moedas, que ficou a um vereador da maioria absoluta, tem mostrado que pretende manter a receita dos últimos anos, certo de que com oito representantes será possível “fazer muito mais”, já Pedro Duarte, que chegou a afirmar que “em termos autárquicos as linhas vermelhas não fazem sentido, recuou e garantiu que está “completamente fora de hipótese acordo de governação com o Chega”.

Mas a governação em minoria não agrada a todos e há casos, como Vila Nova de Gaia e Sintra, que podem mesmo recorrer ao Chega. E isso não é um obstáculo em termos nacionais. Fonte do PSD garante que “não é tema do Conselho Nacional porque o partido já disse tudo o que tinha a dizer sobre isso”. E a última posição pública é de Leonor Beleza, vice-presidente social-democrata, quando confirmou que não existe qualquer indicação geral para os autarcas do PSD fazerem essas escolhas, ficando essa decisão nas mãos de cada um: “Não há uma indicação geral sobre acordos de governação, sobre como eleitos devem proceder”, tendo em conta que as realidades são “eminentemente locais” e por isso os eleitos devem “encontrar maneira de governar”. Ou seja, o Chega não está excluído.

O Observador sabe que, num jantar com vereadores e eleitos nas juntas de freguesia de Gaia, Luís Filipe Menezes deu conta de que, até à tomada de posse, deveriam ser feitos os acordos necessários para governar em maioria. Na visão do novamente eleito presidente da Câmara Municipal de Gaia, é preciso a estabilidade governativa que só uma maioria permite e, por isso, deu orientações para que se alcancem esses entendimentos nas juntas de freguesia, já que o próprio será o responsável máximo por uma escolha na autarquia. A única linha vermelha definida, avisou, é o PS — o que deixa o caminho aberto para o Chega.

Em declarações ao Observador, António Barbosa, vereador eleito pelo Chega em Vila Nova de Gaia, confirmou que já foi abordado nesse sentido e que terá uma reunião com um elemento da equipa esta quarta-feira. E, contas feitas, este vereador seria fundamental para Luís Filipe Menezes, já que permitiria alcançar a maioria absoluta. A coligação vencedora conseguiu cinco vereadores, o PS o mesmo número e o Chega um, pelo que António Barbosa possibilitaria a tão desejada maioria com que Menezes quer governar.

Já no caso de Marco Almeida, que assegurou que não tinha linhas vermelhas nem poria limites, o Observador sabe que está a haver negociações, a começar pelas juntas, e que não há nenhuma cor política excluída, pelo que o Chega continua a ser uma possibilidade. As abordagens são todas no sentido de garantir a governabilidade das juntas, incluindo as do PS. Depois das juntas, haverá espaço para fazer o mesmo relativamente ao executivo da Câmara de Sintra.

Note-se que o caso da Câmara de Sintra é ainda mais flagrante, porque o Chega, além de servir para desempatar entre a coligação vencedora e o PS/Livre, tem três vereadores e não apenas um, como acontece na maioria dos locais. Rita Matias, que encabeçou a candidatura, é a primeira vereadora e, em entrevista ao Carpool do Observador, deixou duas certezas: o socialismo é uma linha vermelha nas negociações e o Chega “não vai ceder por tuta e meia” ao PSD. Na altura, deixou ainda um “aviso para dentro do Chega e para fora: a lógica da bolha política de Sintra, de trocas de favores, de promessas de cargos nas administrações A, B, C ou D não cola”.

No mesmo sentido, Rita Matias referiu que o Chega não iria deixar as negociações como uma “questão fechada ao nível local, quando [pode] fazer disto uma alavanca para mais reformas nacionais”. Agora, a direção nacional do Chega, sabe o Observador, deu indicações para que o partido não entre em acordos à esquerda, deixando em aberto as hipóteses de negociar com o PSD. Porém, existe uma task force de apoio aos autarcas e as decisões finais, pelo menos no que toca a aceitar pelouros ou acordos mais abrangentes, terão de ser aprovadas a um nível superior.

Se a Iniciativa Liberal parece poder respirar de alívio nos casos de Lisboa e Porto, o mesmo não se pode dizer sobre Vila Nova de Gaia e Sintra. Os liberais entraram em coligações encabeçadas pelo PSD e, agora, vão abandonar esses acordos caso haja acordos com o Chega.

Em reunião da Comissão Executiva, a IL “decidiu não aceitar a integração de vereadores do Chega nos executivos camarários onde a IL está integrada na governação em coligação com o PSD”. “A Iniciativa Liberal não participará em executivos de governação com o Chega, abdicando de qualquer cargo executivo conquistado eleitoralmente se o PSD decidir incluir o Chega nos executivos municipais”, pode ler-se no mesmo comunicado enviado após o encontro.

“A Iniciativa Liberal sempre disse que nunca integraria um governo com o Chega porque não se revê nas políticas que esse partido defende e reafirma neste momento que nunca cederá na defesa dos seus princípios e valores.”

No caso de Vila Nova de Gaia, Luís Filipe Menezes tem muito pouco a ganhar — se fechar um acordo com o Chega perde o vereador da IL e fica tudo igual, sem maioria. Pode sempre arriscar e tentar convencer a vereadora eleita pelos liberais, mas sem ela precisará do PS — e Menezes tem recusado a ideia de alinhar com os socialistas. Já em Sintra, Marco Almeida não tem o mesmo problema: se os liberais abandonarem a coligação, o Chega tem três vereadores e consegue a maioria absoluta na mesma. No fim do dia, será preciso perceber de quem é que o PSD, em cada sítio, vai abdicar.