A ciência está em constante busca por novidades que transformem o cuidado com o câncer, especialmente quando falamos daqueles tumores que mais atingem os brasileiros – como os de mama e de próstata, responsáveis por cerca de 150 mil novos casos por ano no País. Pois eles seguem no centro das atenções, motivando pesquisas que podem mudar a forma de prevenção ou tratamento.

No último Congresso Europeu de Oncologia, realizado entre os dias 17 e 21 de outubro, em Berlim, especialistas de todo o mundo apresentaram estudos que trazem resultados promissores e inéditos para a prática clínica. Dois trabalhos, em particular, chamaram atenção: um revela um novo tratamento que amplia a sobrevida de homens com câncer de próstata avançado, e outro explica como a amamentação oferece proteção duradoura contra os tipos mais agressivos de câncer de mama.

A ciência busca caminhos para a prevenção, detecção precoce e tratamento do câncer Foto: ImageFlow/Adobe Stock

Câncer de próstata: radiofármaco muda cenário terapêutico

Um dos trabalhos mais aguardados do congresso foi o que avaliou o uso de uma nova medicação radioativa, o Lutécio-177-PSMA, capaz de se ligar de forma seletiva às células tumorais da próstata e liberar nelas uma dose letal de radiação. Essa abordagem combina o princípio da terapia direcionada com o poder destrutivo da radioterapia, mas de modo muito mais preciso e sistêmico, representando um avanço importante no campo dos radiofármacos.

O estudo, que envolveu mais de 1.140 pacientes com câncer de próstata metastático sensível à castração (tratamento que reduz ou bloqueia os níveis de testosterona), comparou dois tipos de tratamento: o uso de terapia hormonal padrão (oral ou injetável) isoladamente, e a combinação da hormonioterapia com essa medicação endovenosa radioativa. Os resultados foram expressivos: os pacientes que receberam a combinação apresentaram uma redução de 28% no risco de progressão da doença ou de morte, em comparação com aqueles tratados apenas com os anti-hormônios.

O que torna esse achado particularmente relevante é o fato de ser a primeira evidência robusta do benefício dos radiofármacos já na linha inicial de tratamento de pacientes com doença metastática, e não apenas em fases avançadas e refratárias, como vinha sendo feito até então.

Isso indica que a estratégia pode prolongar a resposta ao tratamento, retardar a progressão e oferecer ganhos expressivos em qualidade de vida, com menos necessidade de outras terapias mais tóxicas.

O poder da amamentação contra o câncer de mama

Entre os trabalhos sobre câncer de mama, um estudo se destacou pela originalidade e relevância dos resultados. Pesquisadores australianos investigaram os mecanismos imunológicos que explicam por que a gravidez e a amamentação reduzem o risco de desenvolvimento de câncer de mama, especialmente o tumor triplo negativo, um dos subtipos mais agressivos e de pior prognóstico.

Embora a relação entre amamentação e proteção contra o câncer de mama já fosse bem documentada, a razão biológica para isso permanecia pouco compreendida. Os resultados mostraram que mulheres que amamentaram apresentavam maior quantidade de linfócitos CD8, células fundamentais do sistema imunológico que reconhecem e destroem células cancerígenas. Além disso, esses linfócitos apresentaram uma característica de memória imunológica de longa duração, persistindo por anos após o período de lactação. Essa “memória” pode atuar como uma vigilância contínua do tecido mamário, ajudando o organismo a identificar e eliminar células potencialmente malignas antes que formem um tumor.

Essas descobertas representam um novo paradigma na compreensão da imunidade relacionada ao câncer de mama. Mostram que o histórico reprodutivo e o ato de amamentar não apenas modulam o risco da doença, mas também reprogramam o sistema imunológico de forma duradoura. Isso pode abrir caminho para estratégias preventivas e terapêuticas que busquem reproduzir esse mesmo tipo de proteção imunológica em mulheres que não puderam ou não desejaram amamentar.

Os resultados desses estudos e de outros diversos trabalhos apresentados no congresso evidenciam a relevância da pesquisa científica como instrumento de transformação no cuidado do câncer.

Ao mesmo tempo em que terapias cada vez mais precisas ampliam as chances de controle da doença em pacientes com doença avançada, novos conhecimentos em biologia tumoral e imunologia ajudam a revelar caminhos para prevenção e detecção precoce.

Esses estudos reforçam a importância de investir em pesquisa e em acesso à inovação, garantindo que os avanços científicos cheguem de forma equitativa a todos os pacientes, melhorando os desfechos do tratamento oncológico.