A ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, diz esperar que haja “boa vontade política” no Conselho Europeu desta quinta-feira, para que a UE “seja ambiciosa no clima”. Mas há ainda grande desacordo entre os 27 Estados-membros sobre a meta climática para 2040, com indícios de que um eventual compromisso sobre a meta será feito com um mecanismo para a enfraquecer, avança a Reuters.
“Há assuntos que alguns países trouxeram para o Conselho de Ministros do Ambiente que extravasam as competências, como os auxílios de Estado à indústria, o desenvolvimento industrial. Não são questões ambientais, são questões de política industrial, de financiamento, sobre as quais é necessário que haja uma boa vontade política ao nível europeu para se ser ambicioso no clima”, disse a ministra portuguesa da tutela, Maria da Graça Carvalho, citada pela agência Lusa.
A pedido de seis Estados-membros − França, Eslováquia, Hungria, Letónia, Polónia, República Checa −), os líderes europeus vão discutir a meta de redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2040, no Conselho Europeu, o órgão presidido por António Costa.
Segundo a Reuters, o Conselho Europeu desta quinta-feira poderá chegar a acordo para avançar com o objectivo de redução de 90% das emissões de gases com efeito de estufa até 2040, assumido pela Comissão em Fevereiro.
Escapar ao compromisso
Mas o projecto, que deverá ser aprovado na próxima reunião de 4 de Novembro, mesmo antes do início da conferência anual da Convenção das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (COP30, no Brasil, de 10 a 21 de Novembro), inclui uma “cláusula de revisão” que permitirá escapar ao compromisso assumido e até enfraquecer esta meta climática no futuro.
Países como a Polónia argumentam esta cláusula de revisão é necessária, no caso de as tecnologias limpas não se desenvolverem como previsto, ou de as condições económicas dificultarem os investimentos necessários para atingir a meta climática europeia.
Alguns líderes exigem ainda garantias de que as suas indústrias não sejam forçadas a reduzir as suas emissões mais rapidamente para compensar cenários em que as florestas degradadas absorvam cada vez menos carbono, segundo o documento citado pela Reuters.
Declaração de intenções
Diplomatas europeus disseram à agência Reuters que mesmo estas alterações não foram suficientemente longe para alguns governos, que querem enfraquecer ainda mais o objectivo para 2040. Pedem, por exemplo, que seja possível créditos de carbono estrangeiros, para cobrir mais do que a percentagem de 3% da meta, proposta em Julho.
Seguindo a recomendação científica, a Comissão assumiu o compromisso de reduzir em 90% as suas emissões líquidas de gases com efeito de estufa até 2040 − ou seja, a quantidade de dióxido de carbono, sobretudo, libertado para a atmosfera, a que se subtrai a quantidade absorvida, por exemplo pelas florestas.
Há assuntos que [alguns países] trouxeram para o Conselho de Ministros do Ambiente que extravasam as competências, como os auxílios de Estado à indústria, o desenvolvimento industrial. Não são questões ambientais, são questões de política industrial, de financiamento
Maria da Graça Carvalho
Em Setembro, contudo, o Conselho da UE, onde estão representados os ministros dos Estados-membros, chegou a consenso apenas sobre uma “declaração de intenções”, onde se comprometeram a cortar as emissões de CO2 entre 66,3% e 72,5% em comparação com os níveis de 1990.
A meta fixada para 2040 vai ter influência nos compromissos de redução das emissões que estão mais próximos de nós – a meta de 2035, que a UE, enquanto signatária do Acordo de Paris, se comprometeu a rever este ano. O impasse já fez com que a UE não cumprisse a sua obrigação de entregar as metas climáticas para 2035 até Setembro, para poder leva-las à COP30. Com o impasse na decisão sobre 2040, os compromissos para 2035 estão empatados.
Países como a Polónia argumentam a cláusula de revisão é necessária, no caso de as tecnologias verdes não se desenvolverem como previsto: energia eólica Wind Float I, em Setúbal
José Manuel Ribeiro/Reuters
Perspectiva da competitividade
Alguns governos europeus temem o impacto na sua competitividade e indústria da transição de uma economia baseada na queima de combustíveis fósseis para uma economia assente em energias renováveis e tecnologias mais sustentáveis, para alcançar a neutralidade carbónica (quando se emitir tantos gases de estufa como aqueles que são retirados da atmosfera).
“Portanto, os líderes da UE vão abordar a questão climática a partir de uma perspectiva onde pesa muito a competitividade, apelando à descarbonização como um vector para a renovação da indústria, o que é uma notável mudança da abordagem”, lê-se num documento de análise da agenda do Conselho feito pelo EPRS, o think tank do Parlamento Europeu.
É por isso que, na véspera da cimeira desta quinta-feira, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, enviou uma carta aos líderes europeus dizendo que a mudança para uma economia limpa é a oportunidade da Europa para reanimar as indústrias em declínio e reduzir a dependência das importações chinesas.
“Cada megawatt-hora e cada tonelada de matéria-prima que poupamos na produção de bens e serviços para nós e para o resto do mundo torna-nos mais competitivos e mais independentes de fornecedores externos”, disse Von der Leyen nessa carta, citada pela Reuters.
“Esta é uma grande oportunidade comercial para a Europa. Aproveitá-la exige firmeza e uma vontade incessante de enfrentar os nossos concorrentes, a começar pela China”, lê-se no documento, datado de 20 de Outubro.
Os países da UE estão profundamente divididos quanto às suas ambições em matéria de clima e ambiente. Bruxelas já reduziu neste ano numerosas políticas de sustentabilidade, numa tentativa de conter a resistência política, tanto dos governos da UE como dos parceiros comerciais, incluindo os EUA e o Qatar.
Antes da cimeira, a Comissão Europeia prometeu isentar os pequenos agricultores da sua lei contra a desflorestação e alterar um futuro regime de preços do carbono para os combustíveis dos transportes, este último a pedido de países como a República Checa e a França. Bruxelas está também a considerar enfraquecer a sua proibição de motores de combustão em 2035, após pressão da Alemanha e da Itália. com agências