Quando amigos visitam Paris, muitas vezes me pedem para acompanhá-los num passeio de um dia. A maioria já visitou a Catedral de Chartres, o Castelo de Fontainebleau e a casa de Claude Monet com suas ninfeias em Giverny.
“E agora?”, me perguntam.
“Vamos para Lens”, sugiro.
“Nunca ouvi falar nisso” é a resposta usual.
Mas faça uma viagem até Lens, apenas 1h10 em trem de alta velocidade ao norte de Paris, perto da fronteira com a Bélgica, e você encontrará um posto avançado do Louvre, um moderno museu de arte em vidro e aço com algumas das melhores obras de arte da sede – gratuito, fácil e sem multidões.
No Museu Louvre-Lens, obras não seguem ordem cronológica: visitantes exploram com liberdade Foto: Dmitry Kostyukov/NYT
“Os americanos poderiam pensar num museu numa cidade industrial como Detroit, com a criatividade arquitetônica do Guggenheim e uma coleção digna do Metropolitan (ambos em Nova York)”, disse Annabelle Ténèze, diretora do museu. A cidade também tem fachadas art déco para ver, vestígios da Primeira Guerra Mundial para descobrir e terrils (montes de resíduos da mineração de carvão) para escalar.
Legado de guerra e carvão
Lens, com uma população de 30 mil habitantes, era um centro industrial em expansão depois que o carvão foi descoberto lá em 1849. Aí a Primeira Guerra Mundial se abateu sobre a cidade, deixando algumas das piores destruições na frente de batalha francesa. A artilharia pesada arrasou a maior parte do lugar; metade da população morreu ou fugiu. A cidade foi reconstruída. Muitas novas estruturas foram terminadas com fachadas art déco, que permanecem até hoje.
No norte da França, centro de Lens reúne fachadas com arquitetura art déco Foto: Dmitry Kostyukov/NYT
Então veio a Segunda Guerra Mundial. Durante os bombardeios dos Aliados em 1944, centenas de pessoas morreram e mil prédios foram destruídos. O carvão perdeu valor e as minas fecharam em 1986. Devastada e decadente, Lens era um lugar improvável para a primeira filial regional do Museu do Louvre.
Mas, em 2012, ele foi aberto.
Uma visita a Lens começa na estação de trem, uma joia da arquitetura art déco, feita de concreto armado e em formato de locomotiva a vapor. Os murais de mosaico nas paredes internas da estação contam a história das indústrias ferroviária e da mineração. Do outro lado da rua, ficava o cinema Apollo, numa construção art déco, recentemente restaurada para virar hotel e restaurante.
Murais de mosaico na estação de trem contam a história das indústrias ferroviária e da mineração Foto: Dmitry Kostyukov/NYT
Comece sua visita com uma caminhada de 25 minutos até o Museu Louvre-Lens, que fica em um parque paisagístico de 50 acres com campos de flores silvestres, árvores e passarelas ao longo de rotas que antigamente transportavam carvão e um caminho de concreto curvo que evoca um jardim japonês.
Ou faça como eu e passeie pelo centro da cidade, uma miscelânea arquitetônica repleta de fachadas art déco. Na praça principal fica a Maison Claude Jeanson, uma casa de chá e confeitaria de 85 anos com mesas com tampo de pedra e cadeiras almofadadas. As especialidades incluem croissants crocantes de amêndoa, maçãs caramelizadas e elaboradas esculturas artesanais de chocolate de obras de arte famosas (€ 3,60, ou cerca de R$ 22,50, por um café e um croissant).
Museu do Louvre em Lens
Distante 1,6 km a oeste do centro da cidade, o Louvre-Lens, projetado pelo escritório de arquitetura japonês Sanaa, é um laboratório para o que os museus de arte podem se tornar. Situa-se sobre uma elevada pilha de resíduos da mineração, onde antes ficava a mina de carvão nº 9. Para se integrar à paisagem e ao céu chuvoso, os arquitetos construíram cinco estruturas baixas, em cinza e prata.
O centro do museu – a Galerie du Temps (Galeria do Tempo) – exibe a coleção permanente, com entrada gratuita. Um espaço de 3 mil m², com paredes de alumínio e pisos de pedra clara, assume a forma de um “Rio do Tempo”, curvo, móvel e cronológico, que permite aos visitantes navegar pelas obras como quiserem. A galeria alimenta o Pavillon de Verre (Pavilhão de Vidro), destinado a exposições temporárias, que dá acesso aos jardins, repletos de plantas sazonais e esculturas modernas.
A arte na Galerie du Temps abrange dezenas de civilizações e estilos, da pré-história aos tempos modernos. As obras não são exibidas geograficamente, como no Louvre, em Paris, mas em arranjos multidisciplinares, em constante mudança, em ordem cronológica flexível.
Em 2024, o Louvre-Lens renovou seus espaços, substituindo a maioria das obras que estavam em exposição. O museu principal, em Paris, emprestou mais de 200 obras-primas, incluindo meia dúzia de esfinges egípcias antigas e a série de pinturas As Quatro Estações, de Giuseppe Arcimboldo. Obras de arte de outros museus, como uma escultura de um touro em calcário de 18 mil a.C., enriquecem o espaço.
‘As Quatro Estações’, de Giuseppe Arcimboldo, estão entre as obras emprestadas pelo Louvre de Paris Foto: Dmitry Kostyukov/NYT
Exposições temporárias – às vezes mais ousadas e inventivas do que as organizadas pelo Louvre de Paris – exploraram tópicos como a evolução das imagens de guerra até as mesas de jantar do poder na França.
‘Terrils’: resíduos da mineração
Após o almoço – seja na cafeteria do museu ou no moderno restaurante com fachada de vidro L’Atelier du Cerisier, na área do museu – siga de bicicleta ou táxi 3 km a noroeste até a entrada na base dos terrils, montes de resíduos da antiga mineração de carvão. Em 2012, a Unesco declarou toda a bacia de mineração de carvão da região Patrimônio Mundial da Humanidade. Uma década depois, as pilhas de resíduos em Lens surgiram como atração turística sustentável. De longe, parecem pretas, mas, ao se aproximar, é possível ver o verde da grama e de plantas que crescem ali.
Como os terrils absorvem o calor do sol, criando uma condição quente e seca, ecologistas plantaram arbustos e flores, incluindo orquídeas, rosas silvestres e espécies como a tasneira-do-cabo-sul-africana. Há videiras de uva chardonnay; o vinho que elas produzem, embora ainda não seja muito, é chamado de brincadeira como “charbonnay” (charbon é a palavra francesa para carvão).
‘Terrils’, montes de resíduos da mineração de carvão no século 19, são Patrimônio da Humanidade Foto: Dmitry Kostyukov/NYT
Durante uma das minhas visitas, fiz uma caminhada de uma hora até o topo dos dois terrils, que têm mais de 180 metros de altura. Eles se tornaram um lugar de observação de pássaros e, às vezes, aulas de música, arteterapia e meditação. A trilha é pavimentada em grande parte, mas se torna pedregosa, mais íngreme, ventosa e mais difícil à medida que se sobe. Quem for subir deve usar calçados para caminhada e jaqueta corta-vento, além de levar garrafas de água e binóculos.
A 180 m de altura, montes de antigos resíduos da mineração servem para observação de pássaros e até meditação Foto: Dmitry Kostyukov/NYT
A vista de 360 graus inclui as ruínas restauradas da vila dos trabalhadores e da operação da mineração de carvão, Lens e seu enorme estádio de futebol e, à distância, um memorial canadense às vítimas da Primeira Guerra Mundial, em Vimy Ridge.
Lembrança da Primeira Guerra Mundial
Os que têm interesse na Primeira Grande Guerra podem seguir 6,4 km a oeste do Museu Louvre-Lens até a colina chamada de Notre Dame de Lorette. A basílica inspirada no estilo art déco e o maior cemitério de guerra francês homenageiam os cerca de 42 mil soldados da França que morreram na região de Nord-Pas-de-Calais. Descendo a colina, há um pequeno centro de visitantes e sobre história. Nas proximidades, também fica o Anel da Memória, monumento internacional com os nomes de quase 580 mil soldados que morreram na região entre 1914 e 1918.
Basílica inspirada no art déco e maior cemitério de guerra francês homenageiam 42 mil soldados da França Foto: Dmitry Kostyukov/NYT
Localizado 6k ao sul, está o Memorial Canadense com monumento em Vimy, uma homenagem aos 66 mil soldados canadenses que morreram na França durante a Primeira Guerra Mundial. Os visitantes podem caminhar por trincheiras reconstruídas.
Antes de retornar a Paris, não deixe de parar no bar La Loco, em frente à estação de trem, para saborear a cerveja local Ch’ti, tirada da torneira, e as batatas fritas, que, segundo eles, são as melhores do mundo. Um pedido médio – cerca de 900 grama de batatas fritas por € 4 – é servido quentinho e espalhado na sua frente sobre uma folha de papel manteiga. Se estiver sem tempo, leve para a viagem, o lanche perfeito para o trem.
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