Os pais devem evitar que os pré-adolescentes utilizem smartphones e redes sociais. É a conclusão de uma nova investigação. O estudo, divulgado em julho, concluiu que o uso de smartphones antes dos 13 anos pode prejudicar a saúde mental das crianças.

A utilização de smartphones por crianças menores de 13 anos foi associada a pensamentos suicidas, pior regulação emocional, menor autoestima e distanciamento da realidade, especialmente entre as raparigas, de acordo com o estudo, publicado no Journal of the Human Development and Capabilities.

Para cada ano antes dos 13 anos em que uma pessoa teve acesso a um smartphone, a sua saúde mental e bem-estar têm maior probabilidade de ser menores, concluiu o estudo.

Isso acontece provavelmente porque as crianças que utilizam smartphones antes dos 13 anos, acedem mais às redes sociais e sofrem mais de distúrbios do sono, cyberbullying e relações familiares negativas, de acordo com o referido estudo. Os dados são baseados em autoavaliações numa investigação com quase dois milhões de pessoas, em 163 países.

Crianças que usaram smartphones antes dos 13 anos enfrentaram distúrbios do sono, cyberbullying e relações familiares negativas, de acordo com um novo estudo. (Elva Etienne/Moment RF/Getty Images)

Os resultados foram tão alarmantes que os investigadores apelaram a restrições globais para impedir que crianças com menos de 13 anos utilizassem smartphones e redes sociais.

“Isto exige medidas urgentes, para limitar o acesso de crianças com menos de 13 anos a smartphones, bem como uma regulamentação mais matizada do ambiente digital a que os jovens estão expostos”, afirma a autora principal do estudo, Tara Thiagarajan, fundadora e cientista-chefe da Sapien Labs, a organização sem fins lucrativos que realizou o inquérito.

Enquanto investigações anteriores se concentraram em como o uso de smartphones está relacionado com a ansiedade e com a depressão, este estudo analisou sintomas que não são normalmente estudados, incluindo regulação emocional e autoestima, e descobriu que são muito significativos, diz Tara Thiagarajan, que reside em Arlington, Virgínia.

Os resultados foram autorrelatos, o que significa que não foram verificados de forma independente pelos investigadores. Além disso, o estudo não consegue identificar que tipos de utilização do telemóvel levaram a esses resultados e não consegue explicar como eles podem mudar à medida que as tecnologias evoluem, diz Tara Thiagarajan.

 

Aguente até aos 16 anos para usar as redes sociais

Ainda assim, esta investigação certamente convenceu-me de que é uma péssima ideia dar smartphones a crianças antes dos 13 anos. Quando falo com pais em escolas, grupos de pais e outros espaços comunitários, sugiro não deixar as crianças usarem as redes sociais até aos 16 anos. Uma investigação sólida, realizada no Reino Unido mostra que o uso das redes sociais durante a puberdade está associado a uma menor satisfação com a vida um ano depois.

O psicólogo social Jonathan Haidt também sugeriu esperar até os 16 anos para deixar as crianças usarem as redes sociais em seu livro best-seller “The Anxious Generation: How the Great Rewiring of Childhood Is Causing an Epidemic of Mental Illness” (“A geração ansiosa: como a grande reestruturação da infância está a causar uma epidemia de doenças mentais”, numa tradução livre para português).

Embora possa parecer quase impossível esperar tanto tempo, isso não será difícil se conversarmos com os pais dos amigos dos nossos filhos e concordarmos coletivamente em não permitir que eles usem aplicativos sociais até essa idade.

Em todas as minhas palestras pelo país como especialista em como as redes sociais afetam mulheres e meninas, ainda não encontrei um único pai ou responsável que tenha dito estar feliz com o uso das redes sociais pelos seus filhos. Em vez disso, preocupam-se que os seus filhos sejam privados de oportunidades sociais se não estiverem nas redes sociais. É por isso que envolver os pais dos amigos deles é fundamental.

O grupo Wait Until 8th criou um compromisso que os pais podem assinar coletivamente, prometendo não deixar os filhos usarem smartphones até o final do oitavo ano. Outros grupos criaram compromissos semelhantes.

“Verifique se existe algum na sua comunidade e, se não existir e for importante para si, considere criar um”, aconselha Melissa Greenberg, psicóloga clínica do Princeton Psychotherapy Center, em Nova Jérsia, que não participou no estudo. “Mesmo que as pessoas não falem sobre isso, podem ficar aliviadas se você iniciar a conversa.”

Além disso, “os pais poderiam procurar escolas para os seus filhos com políticas mais rígidas em relação ao uso de smartphones no recinto escolar” ou pressionar por melhores políticas nas escolas dos seus filhos, diz Tara Thiagarajan.

Mas os investigadores alertam que os pais não podem resolver esses problemas individualmente sem soluções sociais. Afinal, mesmo que eu não permita que as minhas filhas usem as redes sociais antes dos 16 anos e convença os pais dos amigos delas a fazer o mesmo, isso não vai impedir que elas sejam expostas a essas aplicações por outras crianças em locais como o autocarro escolar ou eventos após a escola.

Os pais ainda podem fazer mudanças se os seus filhos já tiverem smartphones, garante Kara Alaimo. (StockPlanets/E+/Getty Images)

É por isso que os pais “também poderiam ter uma voz mais ativa nos debates sobre regulamentação”, considera Tara Thiagarajan.

 

Converse com seus filhos

Se já deixou seu filho usar um smartphone antes dos 13 anos ou está apenas preocupado com os resultados, “não entre em pânico”, diz Melissa Greenberg.

“Se está preocupado, mas não nota nenhum destes sintomas no seu filho, ainda pode conversar com ele para que saiba que algumas pessoas lutam contra a ansiedade, a baixa autoestima e emoções intensas”, diz. “Pode dizer-lhe que há ajuda disponível caso ele precise e convidá-lo a procurá-lo se estiver com dificuldades ou precisar de apoio”.

Se notar esses sintomas no seu filho, procure um profissional licenciado que possa ajudar, aconselha a psicóloga.

 

É normal fazer mudanças

O que acontece se o seu filho já tiver um smartphone? “Pode sentir-se preso ao ler coisas como esta, porque sente que não pode voltar atrás”, reconhece Melissa Greenberg. Isso não é verdade. “Não tenha medo de mudar de rumo se sentir que o que já fez não está a funcionar para o seu filho ou para a sua família”, sublinha.

Os pais podem pensar em opções como usar controlos parentais, mudar para um telemóvel tradicional ou excluir aplicações ou recursos, acrescenta ainda Melissa Greenberg.

É claro que as crianças podem não reagir bem a essa mudança, mas não deixe que isso o impeça de agir se achar que isso seria benéfico para elas, diz ainda.

Os pais podem usar este roteiro, sugeriu Melissa Greenberg: “Quando lhe demos o seu smartphone pela primeira vez, havia coisas que não sabíamos sobre como isso poderia afetá-lo. Há muitos cientistas e médicos que estão a fazer investigações sobre os efeitos que os smartphones estão a ter nas crianças, e estamos a aprender muito mais do que sabíamos antes. Temos de fazer algumas mudanças porque queremos ter a certeza de que estamos a fazer o que é mais saudável para si”.

Se as crianças ficarem zangadas, seja compreensivo com as preocupações delas, aconselha. “Os adultos nem sempre respondem da maneira mais madura quando lhes tiram algo ou pedem que mudem um hábito e não podemos esperar que as nossas crianças o façam”, constata Melissa Greenberg.

A psicóloga sugere que os pais conversem sobre as suas próprias dificuldades em usar o smartphone da maneira correta, como uma forma de (literalmente) conectar-se e reconhecer que é difícil para todos nós resistir à atração deles.

O que pode fazer agora que sabe que pode ser bastante perigoso permitir que crianças pequenas usem smartphones? Se o seu filho ainda não tem um, comece a conversar com outros pais da sua comunidade para concordarem coletivamente em não deixar os vossos filhos terem um telemóvel até que sejam mais velhos.

Manter os nossos filhos longe dos smartphones pode ser uma das decisões mais inteligentes que os pais podem tomar.

 

NOTA DO EDITOR: Se está com problemas de saúde mental ou conhece alguém que esteja, procure ajuda. Deixamos alguns contactos úteis:

  • SOS Voz Amiga – 213 544 545; 912 802 669; 963 524 660; 930 712 500  
  • Linha SNS 24 – 808 24 24 24 (opção 4) – Aconselhamento psicológico 24 horas por dia. 
  • Linha Nacional de Prevenção do Suicídio – 1411
  • Conversa Amiga – 808 237 327 ou 210 027 159 (Atendimento diário das 15h00 às 22h00). 
  • Telefone da Amizade – 222 080 707 (Atendimento diário das 16h00 às 23h00). 
  • Voz de Apoio – 225 506 070 (Atendimento das 21h00 às 24h00, com contacto por email sos@vozdeapoio.pt). 
  • Vozes Amigas de Esperança de Portugal – 222 030 707 (Atendimento diário das 16h00 às 22h00).  

 

Kara Alaimo é professora associada de comunicação na Fairleigh Dickinson University. O seu livro “Over the Influence: Why Social Media Is Toxic for Women and Girls — And How We Can Take It Back” (“Acima da influência: por que as redes sociais são tóxicas para mulheres e meninas — e como podemos recuperá-las”, numa tradução livre para português), que foi publicado em 2024.