O partido do espanhol Carles Puigdemont, que lidera o Junts, confirmou que irá romper com o Governo de Pedro Sánchez, após semanas de tensões e falta de avanços no cumprimento do chamado “acordo de Bruxelas”, assinado no final de 2023. Fontes próximas do ex-presidente da Generalitat catalã tinham dito, nas últimas horas, que a decisão estava “praticamente tomada” e seria submetida a referendo interno entre os militantes – algo que já aconteceu, pelo que a decisão é oficial.
Na cidade francesa de Perpinhã, muito perto da fronteira com a Catalunha, Puigdemont reuniu o seu núcleo duro antes da reunião da direção alargada desta segunda-feira – e o ambiente é de rutura, segundo fontes citadas pela publicação espanhola ABC. Perpinhã é o ponto mais próximo que Puigdemont admite para se reunir com os seus aliados sem arriscar ser preso em Espanha, já que continua fugitivo da justiça espanhola desde 2017.
Nesta segunda-feira, fontes citadas pelo El Confidencial confirmam que a rutura vai acontecer – embora não se vá avançar, pelo menos para já, para uma moção de censura.
Um dirigente do partido, citado pelo mesmo órgão de comunicação social, tinha afirmado: “O tempo do diálogo acabou. E se estamos nesta situação, é culpa do PSOE”.
O principal motivo do descontentamento é a falta de progressos na oficialização do catalão na União Europeia, após um comunicado conjunto com a Alemanha ter sido desmentido por Berlim. Apesar das tentativas do ex-primeiro-ministro José Luis Rodríguez Zapatero e de Pedro Sánchez de mostrar empenho — incluindo contactos diretos com o chanceler alemão —, o Junts considera que não há sinais concretos de mudança antes da próxima votação europeia, marcada para 17 de novembro.
O que está em causa é que quando o PSOE e o Junts assinaram o “acordo de Bruxelas”, em 2023, um dos compromissos assumidos por Pedro Sánchez foi promover o reconhecimento do catalão, do basco e do galego como línguas oficiais da UE. Essa medida tinha grande valor simbólico e político para os independentistas, pois representava o reconhecimento europeu da identidade catalã — algo que o Junts considera essencial para dar legitimidade internacional à causa.
Contudo, um ano depois, quase nada parece ter mudado. A proposta espanhola foi apresentada em Bruxelas, mas enfrentou resistência de vários países, nomeadamente Alemanha, França e Suécia, que consideram o processo complexo e dispendioso. O governo alemão, por exemplo, desmentiu recentemente qualquer avanço concreto, contrariando o que Moncloa [o Governo central espanhol] sugerira.
Para Puigdemont e o seu círculo, essa estagnação é vista como uma promessa não cumprida e um sinal de falta de vontade política por parte do governo de Sánchez. O Junts esperava que o Executivo espanhol conseguisse, pelo menos, garantir um compromisso formal de algum Estado-membro antes da próxima votação no Conselho da UE, o que ainda não aconteceu.
Outros pontos do pacto, como o saldo orçamental e a lei da amnistia, também estão no centro de um impasse. O Junts acusa a ministra das Finanças, María Jesús Montero, de “gozar com o partido”, ao minimizar o défice fiscal catalão e recusar divulgar dados detalhados. Mesmo com promessas adicionais do PSOE, como tentar convencer o Podemos a apoiar a transferência de competências em matéria de imigração, os dirigentes do Junts acreditam que Sánchez só age sob pressão.
Enquanto isso, cresce a pressão interna sobre Puigdemont, com o avanço da formação independentista Aliança Catalã, liderada por Sílvia Orriols, nas sondagens. E a tão esperada foto entre Sánchez e Puigdemont — prometida há mais de um ano — parece agora ainda mais distante: “É ele quem já não a quer”, dizem fontes próximas do ex-presidente catalão.
A confirmar-se a quebra do apoio do Junts, o governo de Sánchez pode ficar com a maioria muito frágil no Congresso dos Deputados em risco. O chefe do Governo só conseguiu ser reeleito graças ao apoio de partidos nacionalistas e independentistas, entre os quais o Junts per Catalunya (os sete deputados de Puigdemont).
Se o Junts retirar esse apoio, o PSOE e o Sumar (a coligação governante) perdem a maioria absoluta e deixam de conseguir aprovar leis-chave, como o Orçamento do Estado ou reformas legislativas.
Sem os votos do Junts, cada votação passaria a depender de acordos pontuais com partidos de direita ou com outros grupos regionais — algo muito difícil num clima político tão polarizado. O que poderá criar um bloqueio parlamentar, dificultando a governação e travando a execução de políticas públicas.
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