O Chega e o PSD chegaram a um entendimento sobre a lei da nacionalidade e há luz verde para aprovar o documento que tem vindo a ser adiado por vários pedidos dos partidos. Ao que o Observador apurou, depois de um ultimato a um dia da votação, os dois partidos cederam: o Chega aceita a perda de nacionalidade proposta pelos sociais-democratas, como pena acessória, a decidir e aplicar por um juiz; e o PSD aceita incluir uma exceção para as situações em que a obtenção de nacionalidade ocorreu de forma manifestamente fraudulenta.

A lei da nacionalidade vai ser votada em plenário esta terça-feira e André Ventura, praticamente ao cair do pano, insistiu em dois pontos que o PSD havia rejeitado. Por um lado, prever a perda automática da nacionalidade para quem for naturalizado e cometer certos crimes (pena de prisão efetiva de três anos por qualquer crime, penas por terrorismo, por crimes contra a segurança do Estado, ofensas “de forma ostensiva, pública e reiterada” aos “valores e símbolos da nação”, obtenção da nacionalidade através de falsas declarações ou documentos) exceto se não tiver outra nacionalidade e ficar apátrida (uma “válvula de escape” para tentar eliminar um risco de problemas constitucionais, explicou Ventura no Parlamento).

Por outro, na norma do PSD sobre a nacionalidade adquirida ficar consolidada após um período de dez anos, “ainda que o ato que esteve na origem da sua atribuição ou aquisição seja passível de declaração administrativa ou judicial de nulidade”, o Chega quer incluir uma exceção para as situações em que “a obtenção de nacionalidade tenha ocorrido de forma manifestamente fraudulenta”.

Perante os obstáculos que surgiram na negociação, e depois de Eurico Brilhante Dias, líder parlamentar do PS, ter lamentado a falta de acordo, o PSD ficou apenas com a possibilidade de se sentar à mesa com o Chega. Após uma noite de negociações que se antecipava longa, o Observador sabe que foi possível chegar a acordo. Ventura recuou na questão da perda automática da nacionalidade e vai aprovar a proposta do PSD, em que esta existe, mas como pena acessória, a decidir e aplicar por um juiz. Isto porque o modelo da perda automática, acreditam os sociais-democratas, levaria a riscos de inconstitucionalidade muito consideráveis e foi por isso que o PSD se preveniu, separando essa proposta do corpo da lei e colocando-a numa alteração ao Código Penal, de forma a não contaminar o resto da lei.

O PSD acaba por aceitar a outra linha vermelha que tinha sido imposta pelo Chega, na norma do PSD sobre a nacionalidade adquirida ficar consolidada após um período de dez anos, “ainda que o ato que esteve na origem da sua atribuição ou aquisição seja passível de declaração administrativa ou judicial de nulidade”. Apesar de se manter, a pedido do Chega passa a incluir uma exceção (de reversão da atribuição da nacionalidade) para as situações em que “a obtenção de nacionalidade tenha ocorrido de forma manifestamente fraudulenta”. Tal como o Observador escreveu, do lado do PSD considerava-se que os casos em que existe uma fraude já são considerados nulos, pelo que a proposta do Chega poderia não trazer uma grande novidade ao ordenamento jurídico, o que pode ter facilitado a negociação.

Durante a fase de especialidade, em que os partidos negoceiam alínea a alínea, o PSD tinha conseguido fazer aprovar o grosso da sua proposta — pendendo mais para a direita, mas também com abstenções do PS — e tinha feito uma cedência relevante para o Chega, proibindo que pessoas sem “meios de subsistência” no momento do pedido possam obter a nacionalidade portuguesa.

Último esforço. Chega dramatiza até ao fim na lei da nacionalidade e recupera duas linhas vermelhas para tentar acordo com PSD

[Chegou o histórico debate entre Soares e Freitas. E o socialista já conseguiu o voto dos comunistas sem “olhar para o retrato” dele“Eleição Mais Louca de Sempre” é o novo Podcast Plus do Observador sobre as Presidenciais de 1986. Uma série narrada pelo ator Gonçalo Waddington, com banda sonora original de Samuel Úria. Pode ouvir aqui, no Observador, e também na Apple Podcasts, no Spotify e no Youtube Music. E pode ouvir o primeiro episódio aqui, o segundo aqui, o terceiro aqui e o quarto aqui]

Tem um minuto?
O Observador está a realizar junto dos seus leitores um curto estudo de apenas quatro perguntas. Responda aqui.