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Fonte Brabo na Grote Markt (Praça Principal) de Antuérpia, Bélgica

O tráfico de droga está a transformar a Bélgica num narco-Estado, e o Estado de direito está ameaçado, denuncia um juiz de Antuérpia numa carta anónima. Corrupção infiltrou as instituições; ataques à bomba, armas de guerra ou raptos são facilmente encomendados pela internet, diz o magistrado.

Quando pensamos num “narco-Estado”, o primeiro que nos vem à cabeça é a Colômbia, terra de Pablo Escobar e frequentemente associada aos cartéis de droga — ou, mais recentemente, a Venezuela, que Donald Trump acusa de ser um país “narcoterrorista”.

Dificilmente nos viria à mente a Bélgica, até há pouco tempo de brandos costumes, um dos países membros do Benelux, embrião do que seria a União Europeia — e cuja capital, Bruxelas, é a sede de facto da UE.

Pois segundo denuncia um juiz de Antuérpia, numa carta anónima publicada na segunda-feira, o tráfico de droga está a transformar a Bélgica num narco-Estado, e o Estado de direito está ameaçado.

Estruturas extensas semelhantes à máfia criaram raízes“, escreve o juiz na carta, que expõe como a criminalidade se infiltra em todas as partes da sociedade belga, e na qual pede ajuda urgente ao governo federal.

“O que está a acontecer hoje no nosso distrito e não só já não é uma questão de criminalidade clássica. Estamos perante uma ameaça organizada que mina as nossas instituições”, escreveu o juiz de instrução na chocante missiva, publicada no site oficial do sistema judicial belga.

As estruturas mafiosas “tornaram-se num poder paralelo que desafia não só a polícia mas também o sistema judicial. As consequências são graves: estaremos a evoluir para um narco-Estado? De maneira nenhuma, pensam? Exagerado? Segundo o nosso comissário para a droga, esta evolução já está em curso. Os meus colegas e eu partilhamos essa preocupação”, acrescentou o juiz.

O enorme Porto de Antuérpia funciona como porta de entrada para estupefacientes ilegais na Bélgica e na Europa em geral, nota o Politico. Bruxelas tem sido assolada por uma vaga de tiroteios relacionados com droga, com mais de 60 incidentes só este ano, 20 dos quais ocorreram apenas neste verão.

Em resposta a este banho de sangue, o ministro do Interior belga, Bernard Quintin, afirmou querer destacar militares nas ruas de Bruxelas. No início deste ano, o governo belga aprovou a fusão das seis zonas policiais de Bruxelas numa única unidade, prevista para entrar em vigor no início de 2027, para combater o flagelo da violência.

Na carta anónima, o juiz prossegue observando que um narco-Estado se caracteriza por uma economia ilegal, corrupção e violência — condições que, na opinião do juiz, a Bélgica já preenche.

“Esta corrupção infiltra-se nas nossas instituições. Os processos que conduzi nos últimos anos — e sou apenas um de 17 juízes de instrução em Antuérpia — resultaram em detenções de funcionários em posições-chave no porto, funcionários alfandegários, agentes da polícia, funcionários municipais e, lamentavelmente, até pessoal do sistema judicial, tanto dentro das prisões como aqui mesmo neste edifício”, lê-se na carta do juiz.

“O Estado de Direito não é um conceito abstrato. É constituído por pessoas — magistrados, polícias, guardas prisionais — que trabalham com convicção, mas que têm direito a um governo que as apoie”, diz o magistrado.

O magistrado nota que as redes de branqueamento de capitais fazem disparar os custos imobiliários, a corrupção penetra nas instituições estatais e podem encomendar-se raptos através do Snapchat.

“Um ataque a uma residência com uma bomba ou armas de guerra, uma invasão domiciliária ou um rapto são facilmente encomendados pela internet. Nem sequer é preciso ir à darkweb; basta uma conta de Snapchat”, acrescenta o juiz.

“A questão é: como é que o nosso estado se irá defender?“, assim termina o magistrado a sua carta anónima.


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