Imobiliário e parques solares são alguns dos investimentos afetados pelos agravamentos fiscais a que se junta uma lista negra onde constam Emirados Árabes Unidos ou Omã. Promotores avisam: pode tornar “economicamente inviável e perigoso” qualquer investimento no país.
Portugal está a afugentar os investimentos com origem nos países do Golfo Pérsico. A responsabilidade é do agravamento em 7,5% do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) e de 10% no Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (IMT).
A medida foi introduzida no Orçamento do Estado para 2021 (OE2021), através de uma proposta do partido ‘Os Verdes’, que com CDU e Bloco de Esquerda suportavam a chamada ‘geringonça’ do governo do Partido Socialista (PS).
A proposta de lei do OE2021 introduziu novas disposições legais no código do IMI e do IMT.
Estas mudanças aplicam-se a entidades que tenham em Portugal imóveis que sejam controlados, direta ou indiretamente, “por uma entidade com domicílio fiscal em país, território ou região sujeito a um regime fiscal mais favorável”.
A identificação destes estados foi concretizada numa lista aprovada pelo Ministério das Finança, que os designou como “paraísos fiscais”. A lista tem 79 países, sete vezes mais do que a lista negra da União Europeia, onde constam apenas 11 jurisdições. Significativo é também o facto de Portugal ter celebrado convenções para evitar a dupla tributação internacional e ter ainda acordos de troca de informações em matéria fiscal com 20 destes países (ver caixa).
Este enquadramento tributário mais gravoso está a impossibilitar o investimento em Portugal de países do Golfo. É o caso de países ricos como o Bahrain, Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Qatar ou Omã, entre outros, alguns deles com poderosos fundos soberanos que investem em toda a Europa.
Toda esta situação foi exposta numa carta enviada em 2021 pela Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII), em conjunto com a consultora EY, a que o Jornal Económico teve acesso.
O agravamento fiscal é aplicado sobre bens imóveis situados no território nacional, armazéns, fábricas, parques eólicos ou solares, imóveis para exploração, rendimento ou venda.
No mesmo documento, APPII e EY demonstram “concordar parcialmente” com a proposta do partido, mas não com a versão que acabou por abarcar quase oito dezenas de países.
A consultora e a associação julgam que “não terá sido a intenção do legislador” aplicar as taxas agravadas a entidades portuguesas que sejam controladas, direta ou indiretamente, por entidades residentes em todas as jurisdições incluídas na lista de paraísos fiscais.
A intenção inicial seria aplicar a sobrecarga de impostos apenas a jurisdições com as quais Portugal não tivesse um acordo para evitar a dupla tributação e que também previsse a troca de informações tributárias.
Como é possível existirem estes acordos e, ainda assim, um estado aparecer na lista negra – interrogam-se os fiscalistas.
“As referidas alterações têm tido um impacto significativo no investimento estrangeiro em Portugal, ocorrendo manifestações por parte de investidores da sua intenção de recuar na decisão de investimento em Portugal ou mesmo do desinvestimento total no mercado português optando por mercados mais estáveis tais como Espanha, Itália, Grécia”, lê-se no documento.
Como tal, a APPII e EY alertam nesta carta, que passou pelos ministérios das Finanças e Economia, pela secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais do PS e Ministério dos Negócios Estrangeiros, que o simples facto de os Emirados Árabes Unidos, Qatar ou Omã estarem na lista de paraísos fiscais tem como consequência que “qualquer fundo soberano ou investidor privado com domicílio fiscal numa destas jurisdições passe a ver como economicamente inviável e perigoso qualquer investimento em Portugal”.
Perante este quadro, os promotores imobiliários pedem uma reflexão sobre o mérito, extensão e consequências das normas aprovadas no OE2021, para encontrar um compromisso entre os objetivos finais das mesmas e os resultados alcançados.
“Caso contrário, é expectável um retrocesso no investimento estrangeiro em Portugal, que acabará por ser desviado para outras jurisdições europeias, com regimes fiscais mais estáveis e que não preveem esta discriminação e penalização fiscais para as jurisdições que nos referimos em maior detalhe nesta exposição”.
Apesar deste cenário, Portugal tem-se esforçado para captar investimento através de visitas internacionais a países do Golfo Pérsico, como foram os casos da missão empresarial aos Emirados Árabes Unidos em 2024 pela Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa e, em fevereiro de 2025, da Câmara de Comércio e Indústria Árabe-Portuguesa ao Qatar e Kuwait.
“É claramente contraditório com as medidas que foram adotadas no OE2021”, salienta a APPII.