Responsável pelos incríveis “Nada de Novo no Front” e “Conclave”, o diretor Edward Berger demonstra de vez sua versatilidade, em uma temática completamente diferente de seus filmes anteriores em “Balada de um  Jogador”. As cores vibrantes, a montagem ágil e os enquadramentos incomuns já nos atraem nos  primeiros minutos do filme, mostrando a suntuosidade que rodeia o protagonista vivido por Colin Farrell, um homem viciado em jogos de azar e que está devendo Deus e o mundo. Tal qual Adam Sandler em “Joias Brutas” (2019), ele tenta a sorte repetidas vezes para acumular o que precisa. O objetivo? Pagar credores, obviamente sempre correndo o risco de perder tudo no processo. 

Porém, ao contrário do brilhantismo do roteiro do filme dos Irmãos Safdie, a obra de Berger se perde em uma sequência superficial de apostas que apenas se apoiam no carisma de Colin Farrell e na montagem ágil que revela sempre os maravilhosos cenários de Macau, uma espécie de Las Vegas asiática. Tudo em um tom quase neon de luzes urbanas que dão um ar quase lúdico aos apartamentos, ruas e cassinos. A própria trilha sonora de Volker Bertelmann se destaca com um senso constante de tensão que ajuda a embalar essas sequências até mais do que exatamente o que acontece em tela. 

Também ao contrário do protagonista do filme dos Irmãos Safdie, sempre marcado pela inquietude e tagarelice que revelam a ansiedade em seus próprios trejeitos, o Lorde Doyle não encontra muitas nuances em sua composição que realmente nos faça acreditar e sentir seu vício em apostas. Muito é dito sobre ele e as  cobranças de suas dívidas do passado acontecem, mas pouco se é explorado dentro  disso. A máxima narrativa “não fale, mostre” não é seguida aqui. Colin Farrell alterna entre expressões de melancolia e coitadismo que implora para que simpatizemos por ele, mesmo apesar de ele ser um farsante, como se houvesse algo de nobre em suas motivações, para além da mera cobiça e fome de poder. A composição afetada do astro irlandês não lembra o grande ator que ele já demonstrou ser em outras produções. 

Ao conhecer a personagem Dao Ming, vivida por Fala Chen, Doyle tem seus conflitos amenizados pela ajuda dela, e desenvolvendo uma relação amistosa que logo de cara se revela como algo que proporcionará alguma redenção. A cumplicidade no olhar entre ambos exala esta sensação e, ainda que ele diga que não há muita esperança para si, sabemos que aquilo não é verdade. Não à toa é exatamente o que acontece no final. 

Agora, como, onde e por quê, obviamente não revelarei, mas isso ocorre em uma trajetória em que o real e o imaginário começam a se confundir, quase no terço final do longa. Ali, Berger se perde, afinal, tudo soa estranho, já que o Balada de um Jogador em nenhum momento tinha flertado com este tipo de abordagem. Além disso, o longa chega a ter brevíssimas cenas de terror de forma repentina e aleatória apenas para enfatizar a obsessão do protagonista por apostas, sem propor nada de novo ou conflituoso a partir disso. 

A dinâmica entre Doyle e Cynthia Blithe, personagem de Tilda Swinton, tem bons momentos (a primeira cena deles que envolve uma pequena perseguição é hilária), mas também peca por uma condescendência ao protagonista, que não convence. 

É bem verdade que a conclusão mostra de forma bela a redenção da personagem, apesar do meio insatisfatório, mas a sensação de que falta solidez na trama é sempre presente.  Nem mesmo a interessante questão sobrenatural acaba sendo bem explorada, sendo apenas pincelada por um breve momento, e que, apesar de dar algum sentido intrigante às vitórias sucessivas que o protagonista passa a ter milagrosamente, por outro lado não dialoga com a suposta competência que o protagonista teria e que o levou até aquele momento, para início de conversa. 

Em suma, Balada de um Jogador termina realmente nos fazendo acreditar que havia algo a mais no livro que originou o longa escrito por Lawrence Osborne.

  • Formado em Design pela Universidade Federal do Amazonas. Designer Gráfico e ilustrador, encontrou nas animações de cinema e TV que via na infância o amor pelo Audiovisual. Roteirista, editor, artista de storyboard e diretor, trabalhou em curtas e médias-metragens locais. Também já deu as caras como coralista e ator de teatro musical.

    Quando não está produzindo filmes, ama falar sobre eles. Escrevia sobre cinema em blogs pessoais e eventualmente produz vídeos para o YouTube através de seu canal de cultura pop, o Nerdtown, onde expressa sua nerdice e cinefilia, analisando e teorizando filmes, séries e animações preferidas, além de quadrinhos. Fã árduo da saga Star Wars.


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