A criação de contas-poupança isentas de impostos estava entre as intenções do Governo, mas a proposta de Orçamento do Estado deixa cair essa medida. Estratégia incide, por agora, no aumento do rendimento disponível para as famílias.
Os incentivos à poupança e a literacia financeira figuram entre os temas estratégicos do programa do Governo, mas a proposta do Orçamento do Estado (OE2026) para o próximo ano conta outra história. Estímulos como contas-poupança isentas de impostos ficaram, por agora, de fora da agenda governativa, que manteve uma estratégia de continuidade, como o IMT Jovem e a garantia pública para habitação, privilegiando o aumento do rendimento disponível para as famílias.
A “Agenda Transformadora” do Executivo de Luís Montenegro, dada a conhecer em junho, propunha-se a “estimular a poupança, evoluindo para um sistema de tributação limitada da poupança e dos rendimentos reinvestidos”, alinhando-se com as ambições de Bruxelas em matéria de reforço dos mecanismos de poupança. E a visão do Governo prolongava-se até à criação de um “sistema produtos financeiros específicos para trabalhadores, associados a planos de poupança de longo prazo”, nomeadamente contas-poupança isentas de impostos.
Na proposta do OE2026, apresentada no dia 9 de outubro e aprovada na generalidade duas semanas e meia mais tarde, o assunto recebe outra importância. Contudo, menciona uma sintonia com a visão de Bruxelas, na matéria, com o Governo a reiterar que o país “manterá um contributo ativo na execução das estratégias europeias nas áreas do mercado interno, digital e de segurança económica, na construção tempestiva da União de Poupanças e Investimentos e, bem assim, na política de simplificação administrativa e da regulamentação europeias”.
É um “orçamento de equilíbrio”, sublinha Bárbara Barroso, fundadora e CEO do Money Lab, em declarações ao Jornal Económico (JE). Mas um orçamento sem “estímulos específicos para poupança e investimento das famílias”, que coloca “mais dinheiro no bolso” das famílias.
“O Governo está a privilegiar o equilíbrio das contas; a redução da dívida. Em termos de poupança, é no sentido de haver mais rendimento disponível”, continuou.
A estratégia do Governo passa, apesar das intenções deixadas no seu programa, por aumentar o rendimento disponível das famílias, sem esquecer os estímulos para jovens no dossier da habitação, seja no arrendamento, seja na compra de casa. Olhando para o documento, que entra agora na fase da especialidade, no capítulo da política para a juventude sobressaem o IRS Jovem, o IMT Jovem e a garantia pública para habitação. Medidas que o Executivo assegura continuidade e que visam aumentar “o rendimento disponível e facilitam a autonomização dos jovens”, justifica o Governo na proposta do OE2026.
Isenção do IMT Jovem nos 2%
O valor de imóvel isento de imposto para cidadãos até 35 anos, através do IMT Jovem, em vigor desde o ano passado, é atualizado para 2% no OE2026, correspondendo a cerca de 6.500 euros, para cerca de 330,5 mil euros. O documento do Governo prevê, ainda, que as casas até aos 106.346 euros fiquem isentas.
Para a especialista em finanças pessoais, “ainda há muito a fazer por via do orçamento”. “Cabe ao Governo implementar e propor mais medidas que visem o estímulo à poupança e um maior incentivo na literacia financeira”, diz Bárbara Barroso.
Ainda fora da agenda do Governo está “o investimento para as famílias”, que “continua a ser ignorado”, assinala. A ausência das contas-poupança isentas na proposta do OE, conforme a vontade declarada no programa governamental, surpreendeu a responsável do MoneyLab, sobretudo dada a “sinalização por parte da Maria Luís Albuquerque” nesse sentido. “Já existem em alguns países. Será uma questão de modelarmos e importarmos boas práticas já feitas e adotadas noutros países. De facto, esta era a medida que eu estava a contar que aparecesse”, continuou.
“Cultura de investimento” na UE
Em Bruxelas, dois dias antes da apresentação da proposta orçamental, Maria Luís Alburquerque defendia a criação de contas para investimento como “boa alternativa” aos depósitos a prazo tradicionais, exortando também Portugal a avançar nesse sentido. Isto, justificou a comissária portuguesa responsável pelos Serviços Financeiros e União da Poupança e dos Investimentos, para “dar às pessoas a possibilidade de poupar para um prazo mais longo, com um aumento do seu conhecimento e da sua capacidade de entendimento do que é correr um risco, para ter um retorno mais elevado”. De acordo com a Comissão Europeia, em torno de 70% das poupanças das famílias europeias (no valor de 10 biliões de euros) correspondem a depósitos bancários.