Avança o tempo, demora a avançar mais alguém no centro-esquerda e, entretanto, vai avançando António José Seguro nas sondagens das Presidenciais. O cenário dá um empurrão à candidatura do antigo líder socialista, que começou por deixar o PS muito hesitante e que agora começa a surgir internamente como uma inevitabilidade.
O quadro de candidaturas à esquerda resume-se, por agora, ao socialista António José Seguro e ao comunista António Filipe. O outro António esperado à esquerda, Sampaio da Nóvoa, não deu resposta final a quem ainda anseia por uma recandidatura e começa a fazer desesperar esse grupo onde já conta com apoios destacados. Aguarda-se uma conclusão para breve até porque “quanto mais tempo demora a posicionar-se pior“, diz um dos elementos que tem estado a acompanhar de perto o processo de decisão. “A janela de oportunidade é curta”, nota um socialista que aguarda por essa definição.
E a sondagem da Intercampus sobre as presidenciais, publicada pelo Correio da Manhã e o Jornal de Negócios, veio mostrar isso mesmo. O candidato presidencial que está, ate agora, sozinho instalado no espaço do centro-esquerda, António José Seguro, disparou nas intenções de voto, no primeiro estudo que foi feito depois da oficialização da sua candidatura — o trabalho de campo da sondagem publicada em junho foi anterior a esse momento.
Em julho, os três candidatos a Belém melhor posicionados surgem em empate técnico, nessa sondagem, com Henrique Gouveia e Melo a cair seis pontos percentuais, para os 20%, Luís Marques Mendes a ficar praticamente igual a junho, com 17% e Seguro a saltar de 11% para 16,5%. E na da Aximage, para a CNN, Seguro consegue 14%, ficando a uma distância de cinco pontos de Marques Mendes (em segundo lugar).
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A consolidação do socialista no terreno, antecipando-se na congregação de apoios, tem sido evidente com o passar dos tempos, ainda que seja um candidato presidencial que continua a não galvanizar o partido. “Há muita gente no PS que está órfã“, comenta um dos dirigentes do partido pouco rendido à opção Seguro. Mas ao mesmo tempo admite que, no final, “tudo” possa “depender das sondagens”. Uma posição que vai atravessando, nesta altura, mesmo os menos entusiasmados com o antigo líder.
O cenário, até aqui, vai favorecendo Seguro, quer seja pela multiplicação de candidatos à direita (e o número reduzido à esquerda), quer seja pela tendência demonstrada, até aqui, pelo almirante Gouveia e Melo de ocupar — também ele — o espaço do centro-direita. “É o melhor cenário para António José Seguro”, acredita a mesma fonte que antevê: “As pessoas tenderão a concentrar-se em volta de António José Seguro a um ritmo próprio”.
“Seguro está a ocupar o espaço que estava vazio”, comenta outro socialista que vê como inevitável o apoio socialista. Uma posição que começa a surgir de forma mais clara já publicamente por parte de figuras do partido que, no passado, se opuseram de forma vincada ao segurismo e que nunca foram próximas do antigo líder. É o caso de Duarte Cordeiro que, ainda esta semana no canal Now, disse que “começa a haver muito pouco espaço para qualquer outro candidato no espaço político do centro esquerda”. Cordeiro já tinha dito ver com dificuldade que o PS não apoiasse o seu ex-líder no atual cenário.
Também Fernando Medina já tinha dito no seu espaço de comentário no mesmo canal, mal António Vitorino e Augusto Santos Silva saíram de cena, que “não havendo disponibilidade de nenhum militante com peso e capital político dentro do partido e na sociedade portuguesa para avançar com uma candidatura, uma candidatura independente não vai responder a esse repto”. Não só arrumava o assunto Sampaio da Nóvoa, como considerava que o apoio do partido a Seguro seria “o caminho natural”.
Esta quarta-feira, um dos nomes fortes do pedronunismo, a deputada Marina Gonçalves, declarou apoio oficial de António José Seguro — um movimento que está a ser visto por alguns socialistas como o arranque de uma movimentação coordenada entre os mais próximos do ex-líder Pedro Nuno Santos.
Na sua página no Facebook, a ex-ministra da Habitação escreveu que “em momentos desafiantes, como o que vivemos atualmente, que exigem ponderação, objetividade e sobretudo a capacidade de pensar e agir conjuntamente em prol de um país melhor, é importante garantir que, em cada ato eleitoral, temos candidaturas que melhor representam os valores e princípios basilares do PS”.
No terreno vê “uma candidatura, que nasce de alguém que é militante do PS e foi secretário-geral do partido” e que diz representar “os valores do PS e sobretudo dá garantias de um alto desempenho cívico a um país com cada vez mais desafios urgentes e inevitáveis”. Remata a publicação de forma clara: “António José Seguro pode contar com o meu apoio!”
Antes dela já Pedro Vaz, antigo membro da direção de Pedro Nuno que é agora diretor de campanha de Alexandra Leitão em Lisboa, tinha dito à Antena 1 que “encararia com muita naturalidade que o PS acabasse por apoiar António José Seguro. Obviamente que Sampaio da Nóvoa já foi candidato e teve apoio de muitos dirigentes e militantes do PS, mas eu acho que, institucionalmente, o PS terá a coisa resolvida com o apoio de António José Seguro”.
O redirecionamento para Seguro começa a surgir de forma mais pronunciada no PS, depois de António Vitorino ter terminado a sua longa ponderação com a decisão de não se candidatar a Belém. O antigo ministro socialista ainda tentou acordos com Seguro para que apenas o socialista melhor posicionado ficasse na corrida — para evitar divisões internas e nos votos –, mas não foram aceites. Depois, Augusto Santos Silva também decidiu não avançar, embora lançando ao mesmo tempo a necessidade de uma candidatura independente e agregadora da esquerda. A pressão passou para Sampaio da Nóvoa.
Vitorino tentou compromisso com Seguro para candidatura presidencial única no centro-esquerda
O antigo reitor continuava, até esta quarta-feira, sem desfazer o seu tabu presidencial. Há uma semana foi questionado de diversas formas pelos jornalistas, depois de uma conferência internacional sobre Educação, na Universidade Lusófona, mas não quis fechar o jogo. A sua única preocupação foi sacudir dos ombros qualquer responsabilidade por deitar achas para a fogueira de Belém: “Não fiz nenhuma declaração sobre isso, não alimentei nenhuma expectativa.” Certo é que a esquerda (Bloco de Esquerda, Livre e algum PS) continua à espera que o antigo reitor da Universidade de Lisboa seja claro sobre a sua disponibilidade para uma candidatura, embora com cada vez menos esperança perante as “hesitações” que vão sendo notadas.
Um socialista atento a essas movimentações lembra que Nóvoa “teve 23% e muita gente da esquerda e do centro esquerda com ele. Agora representaria o espaço político do Livre, do BE e marginalmente do PS. Não sei se fica confortável um resultado e uma representatividade muito inferior ao que teve” em 2016. Mas entre os socialistas há também quem vá desvalorizando a sondagem desta semana, seja pelo universo reduzido ou pela distância face às eleições de janeiro. “Mesmo com o almirante a submergir a pique, Seguro não sobe assim tanto”, nota um desse elementos em conversa com o Observador.
Há um mês, enrolado em mais uma potencial divisão presidencial no partido, José Luís Carneiro sacudiu o tema das presidenciais para lá das autárquicas, sendo certo que o desejo seria que o problema de eventuais candidaturas sobrepostas na área socialista ficasse resolvido por si só até lá. E, com ele, a decisão sobre quem o PS deveria apoiar. “O meu dever é salvaguardar a unidade do PS”, disse aliviando quem no partido receava ver a sua eleição como líder uma via verde para o apoio a António José Seguro. Afinal, o próprio novo líder tem na sua fileira de apoiantes de sempre nomes que estão contra a candidatura de Seguro de forma audível, como é o caso de Augusto Santos Silva.
E na última Comissão Nacional, o presidente do PS (outro socialista que sempre esteve distante do segurismo) ainda tentou aligeirar mais a carga que esta decisão tem colocado em cima do partido, pelas eventuais divisões internas que potencia, ao dizer que “o PS poderá ter posição formal, mas não manda no voto dos seus militantes”. Mas Seguro já vai avançado com declarações de apoio de grande parte dos presidentes de federação do partido e também com a maioria dos autarcas eleitos pelo PS (segundo avançou o Diário de Notícias, são 102 dos 149 autarcas).