Num cenário de regresso da pressão inflacionista, o comprador português está a responder com uma assinalável racionalidade na gestão do seu orçamento, tornando-se mais seletivo, menos leal às lojas e eficaz na procura de promoções. Esta é a principal conclusão da mais recente análise da Worldpanel by Numerator, divulgada em parceria com a Centromarca – Associação Portuguesa de Empresas de Produtos de Marca.

O estudo revela uma tensão clara no mercado: enquanto os preços dos bens de grande consumo voltaram a acelerar em meados de 2025, a disposição do comprador para absorver esses aumentos diminuiu drasticamente, daí apenas 31% das categorias que aumentaram de preço em 2025 conseguiram crescer em volume, um valor muito inferior aos 46% registados em 2023.

“Esta sensibilidade ao preço alimenta um comportamento de compra mais pragmático e fragmentado. A lealdade a uma única insígnia está em declínio, com os portugueses a visitarem, em média, cinco lojas diferentes por ano. A rotina de compra transformou-se: mais visitas, mas com cestas de menor dimensão, indicando uma gestão mais rigorosa do orçamento familiar. Neste contexto, as promoções tornam-se uma ferramenta-chave: uma em cada quatro categorias que aumentaram as suas vendas em promoção conseguiu ganhar valor, um rácio de eficiência superior ao de 2023 (uma em cada cinco)”, revela o estudo.

O documento chama ainda a atenção para o facto de esta reconfiguração do comportamento de compra ter um reflexo direto na dinâmica entre marcas de fabricante (MDF) e marcas de distribuição (MDD). “Embora as MDD continuem a deter uma quota de mercado relevante, atingindo 48,1% em valor, o seu ritmo de crescimento abrandou. Este abrandamento sugere que, na sua busca por valor, o comprador não se limita a escolher a opção de preço mais baixo. A decisão é mais complexa, ponderando a qualidade, a inovação e a confiança associadas às marcas de fabricante, que mantêm a liderança com 51,9% do mercado”, salienta.

De acordo com o mesmo estudo, na base destas mudanças comportamentais estão profundas transformações demográficas que redesenham o perfil do consumidor nacional. Por um lado, assiste-se a uma consolidação de uma população mais envelhecida e com lares de menor dimensão – os agregados com mais de 50 anos representam já 68% do total e os lares de uma a duas pessoas são quase 60% do universo –, o que cria novas necessidades de conveniência e formatos de produto. Por outro lado, a imigração afirma-se como o principal motor do crescimento populacional, introduzindo uma maior diversidade cultural e novos padrões de consumo. “Esta dupla realidade resulta num mercado menos homogéneo e mais complexo, que desafia as marcas a desenvolverem ofertas flexíveis e segmentadas”, acrescenta.

“Os nossos dados mostram que o tempo do ‘consumidor padrão’ terminou. Hoje, deparamo-nos com um consumidor multifacetado, que navega o mercado com uma agilidade notável, respondendo ao contexto económico, mas também a motivações pessoais de bem-estar e conveniência”, afirma Marta Santos, Country Manager da Worldpanel by Numerator. “Compreender esta dualidade, através de uma escuta ativa e de uma análise rigorosa, é o primeiro passo para qualquer marca que queira construir e manter a sua relevância no futuro.”

O futuro, segundo o mesmo estudo, passará pela capacidade das marcas de criarem “ofertas híbridas” que conciliem valores aparentemente opostos, como saúde e prazer. “O comprador já não corresponde a  um perfil fixo e o seu comportamento reflete uma sequência de momentos e motivações ao longo do dia, exigindo das marcas agilidade para se manterem relevantes”, conclui.