Splash: Você costuma compartilhar as primeiras páginas de livros no Instagram, e fala sobre isso no seu livro. Cite algumas das primeiras páginas que você mais gosta.
Pedro Pacífico:
A ideia de postar essas primeiras páginas veio para despertar a curiosidade das pessoas, que muitas vezes não leriam o livro que estou indicando porque acha que não é para ela. Às vezes é um clássico, um autor tido como mais difícil, uma literatura russa. E aí a pessoa lê a primeira página e percebe que, primeiro, o livro não é tão difícil como parece. Na verdade, nem é difícil. E, segundo, ela quer continuar lendo. Recentemente, uma primeira página que me marcou bastante foi a do novo livro do francês Édouard Louis, que é ‘O Desabamento’.

Não senti nada quando soube que meu irmão tinha morrido. Nem tristeza, nem desespero, nem alegria, nem prazer. Recebi a notícia como se ouvisse a previsão do tempo ou como se escutasse alguém contando sobre sua tarde no supermercado.
O Desabamento, de Édouard Louis

Alguém que não sente nada pela morte do irmão. E aí me lembrou muito o início, que para mim é um início muito impactante, de ‘O Estrangeiro’, do Albert Camus, que ele fala também sobre a morte da mãe. Ele começa a receber a notícia e aí aquilo já vai para outro assunto, como se aquilo não tivesse gerado qualquer tipo de emoção mais forte nele. Também, recentemente, um que me marcou foi o ‘Carta ao Pai’, do Franz Kafka.

Querido pai, você me perguntou recentemente por que eu afirmo ter medo de você. Como de costume, eu não soube responder. Em parte, justamente por causa do medo que tenho de você. Em parte, porque na motivação desse medo intervém tantos pormenores que mal poderia reuni-los numa fala.
Carta ao Pai, de Franz Kafka

Você sente que a literatura tem um papel diferente hoje, numa época de estímulo de redes sociais? O que os livros conseguem oferecer que nenhum outro formato entrega?
Ela tem um papel importante como um desafio. Se a gente está vivendo esse momento de tanto estímulo, a leitura vai totalmente na contramão disso. É um momento que você precisa do quê? Do silêncio, do tempo, da paciência. E as pessoas, hoje em dia, não sabem mais lidar com isso.

A leitura vem como se fosse quase uma contracorrente de que você precisa parar, focar em uma atividade por um tempo de alguns minutos, numa época em que tudo é de segundos. É desafiador e eu acho muito importante. A gente precisa relembrar como é que é ficar nesse silêncio, ficar nesse tempo, e atualmente poucas atividades conseguem oferecer isso para gente.