Dois dos mais importantes prémios literários franceses foram entregues esta terça-feira e, como manda a sua tradição, um logo a seguir ao outro: primeiro, o Goncourt que distinguiu Laurent Mauvignier por La Maison Vide e, depois, o Renaudot para Adélaïde de Clermont-Tonnerre por Je Voulais Vivre. Se Mauvignier não tem obra traduzida em Portugal, De Clermont-Tonnerre editou em 2017 O Último dos Nossos pela Clube do Autor.
Laurent Mauvignier, que por uma vez esteve na longlist de finalistas dos candidatos ao Booker Internacional, ultrapassou nas votações do júri outros favoritos como Nathacha Appanah – a escritora era finalista do Goncourt, o mais cobiçado prémio literário francês e um dos mais respeitados internacionalmente, mas não teve uma má semana. Segunda-feira, recebeu o Prémio Femina por La Nuit au Cœur, obra que versa sobre vítimas da violência cometida por homens.
O Goncourt de 2025 tem 58 anos e já viu a sua obra Des Hommes (2009) adaptada ao cinema pelo realizador belga Lucas Belvaux no filme Coisas de Homens, com Gérard Depardieu no principal papel. Despontara bem mais cedo para a visibilidade literária logo com o seu romance de estreia, Loin d’Eux (1999), influenciado por Marguerite Duras, Claude Simon ou Thomas Bernhard, e foi já galardoado em França por outras instituições, especialmente por Dans la Foule (2006), outro dos seus livros mais conhecidos.
La Maison Vide é descrito pelo diário Le Monde como um “romance monumental, reinvenção da história da sua família ao longo de quatro gerações, numa casa de campo francesa”. Mais, escreve Raphaëlle Leyris, “é um corolário da sua obra”. O Monde já lhe tinha dado o seu prémio literário homónimo este ano e Leyris considera mesmo que era “uma injustiça” que Mauvignier andasse esquecido pelos grandes premiadores franceses.
Noutro diário francês, Le Figaro, concordam dizendo dele que é “o cume da sua arte narrativa” e chamam-lhe um livro “copioso e ambicioso”. Este é o décimo romance de Mauvignier, monumental não só pelo escopo temporal que tem, mas pelas suas 750 páginas e pelo facto de registar, aos olhos do escritor tornado sujeito parcial (muito, já que as protagonistas são duas mulheres), acontecimentos como as duas guerras mundiais.
Logo após a revelação do Goncourt 2025, o restaurante parisiense Drouant foi lugar do anúncio subsequente, o do prémio Renaudot, que homenageia o jornalista Théophraste Renaudot, fundador do primeiro jornal francês (La Gazette), em 1631.
Adélaïde de Clermont-Tonnerre, editora da revista cor-de-rosa Points de Vue e escritora, foi premiada pelo seu quarto romance, Je Voulais Vivre, nada menos do que sobre a Milady de Os Três Mosqueteiros de Alexandre Dumas. A sua perspectiva é porém alternativa, criando uma personagem independente, traumatizada pela morte da mãe e da sua ama na infância, num livro com cariz “épico” em que esta é mais do que uma mulher pérfida e bela.
Adélaïde de Clermont-Tonnerre recebera já o Grande Prémio da Academia de Letras francesa em 2016, precisamente por O Último dos Nossos, sobre mulheres forçadas a ser escravas sexuais dos nazis. A autora, que é jornalista além de romancista, tem 49 anos e com o seu primeiro romance foi finalista do Goncourt para primeiras obras.
Segunda-feira, Nathacha Appanah, natural das ilhas Maurícias, e a sua história sobre três mulheres vítimas de violência masculina, duas das quais acabam por morrer de femicídio, recebia o Femina enquanto esperava para saber se passaria de finalista a vencedora do Goncourt. Não foi assim, mas o Femina, criado há 120 anos para combater a dominância masculina nos prémios literários franceses, não lhe escapou.
Atribuído por um júri de 12 mulheres, os Femina distinguiram ainda Marc Weitzmann com o prémio de Ensaio por La Part Sauvage (Grasset) e John Boyne, autor de O Rapaz do Pijama às Riscas, foi galardoado com o Femina de Melhor Romance Estrangeiro por The Elements (ainda sem tradução em português).