“Tu, menino, ficas cá”, disse-lhe Eusébio outrora. 44 anos depois disso, os benfiquistas disseram o mesmo: Rui Costa reeleito presidente do Benfica

No início desta época chegou a haver forte contestação, chegou a pedir-se até eleições antecipadas, mas o reeleito é mesmo aquele que foi maestro dentro de campo. Fora dele, Rui Costa bateu Noronha Lopes na segunda volta e foi reeleito nas eleições com mais afluência de sempre num clube de futebol em todo o mundo – recorde batido logo na primeira volta.

Mas o passado recente do Benfica vai continuar a atormentar Rui Costa. Em maio, o clube fechou a época apenas com mais um troféu novo no museu Cosme Damião: a Taça da Liga. Entretanto, no início da época 2025-26, o Benfica conquistou a Supertaça ao Sporting, mas a escassez de conquistas é uma tendência que marca o primeiro mandato de Rui Costa.

Na época 2023/24 houve a conquista de uma Supertaça, na época 2022/23 foi melhor: o Benfica venceu o campeonato. Até ao momento, e feitas as contas, cada um dos quatro troféus vencidos pelo Benfica de Rui Costa necessitou de um investimento médio de 105 milhões de euros só em passes de jogadores.

Analisando as primeiras quatro épocas completas já cumpridas com Rui Costa a presidente, a situação parece ainda mais delicada quando se compara as conquistas do Benfica com as dos dois rivais diretos. No mesmo período, um FC Porto em enormes dificuldades financeiras conquistou sete títulos – um campeonato, três Taças de Portugal, duas Supertaças e uma Taça da Liga -, já o Sporting conquistou o bicampeonato, uma Taça de Portugal, uma Supertaça e uma Taça da Liga. De 2021/22 a 2024/35, o FC Porto gastou um total de 203,3 milhões de euros, o que dá 29 milhões por cada troféu. Em Alvalade, a compra de passes nestas quatro temporadas totalizou 217,3 milhões de euros, o que resulta em 43,4 milhões por cada troféu.

Em contrapartida, o Benfica vendeu como ninguém: foram quase 600 milhões de euros movimentados em saídas durante o primeiro mandato de Rui Costa. Mas vender bem tem sempre os dois lados: vender bem é bom, não ter de vender seria melhor para construir um plantel para outros sonhos. Mas Rui Costa argumentou várias vezes em várias entrevistas durante a campanha que em Portugal não dá para não se vender porque quando vem um grande de fora os jogadores querem ir – e vão.

Made with Flourish

 

No capítulo das vendas, os valores movimentados pelos rivais ficam abaixo dos resultados do Benfica de Rui Costa. O Sporting não vai além dos 322,4 milhões em vendas, o FC Porto chega aos 404,3 milhões.

É preciso ter-se em conta que estes são valores que não entram na totalidade nos cofres dos clubes, porque parte destes montantes acaba por ficar diluído em comissões aos próprios jogadores, aos agentes, contrapartidas ou apoios aos clubes formadores. De qualquer maneira: nas quatro épocas de Rui Costa na presidência, o balanço financeiro entre compras e vendas é positivo, cerca de 282,5 milhões de euros.

Nos mesmos anos, o bicampeão Sporting tem um balanço positivo de 105,1 milhões de euros e o FC Porto de 201 milhões. 

Made with Flourish

Se olharmos somente para época 2024/25, a que consagrou o Sporting bicampeão, o Benfica investiu 74,6 milhões de euros, o Sporting 59,8 milhões e o FC Porto 56,7 milhões. O Benfica é quem gasta mais mas também é, em regra geral, o emblema que mais lucra durante os mercados de transferências. Na época 2024/25, por exemplo, o Benfica recebeu das vendas 160,9 milhões de euros, o Sporting 42,3 milhões e o FC Porto 171,45 milhões. 

Olhando para as maiores vendas do Benfica destacam-se as de Enzo Fernández para o Chelsea, por 121 milhões de euros no mercado de inverno de 2022/23, a ida de Darwin Núñez para o Liverpool, na mesma época, a troco de 85 milhões, e as vendas de Gonçalo Ramos, João Neves e Marcos Leonardo por 65, 60 e 40 milhões de euros, respetivamente.

Made with Flourish

Made with Flourish

“Tu, menino, ficas cá”, disse-lhe Eusébio

A história recente do Benfica não se conta sem o nome de Rui Costa e a história de Rui Costa não é possível e contar sem Benfica. O maestro deslumbrou na Fiorentina e no AC Milan, por exemplo, mas começou tudo nos escalões do Benfica.

Aos cinco anos, Rui Costa começou a jogar no Damaia Ginásio Clube e aos nove foi aos treinos da captação do Benfica. Chegou, Eusébio viu-o e Rui Costa ficou, como contou o próprio presidente do Benfica na cerimónia de trasladação do Pantera Negra para o Panteão Nacional – Eusébio disse “tu, menino, ficas cá”, o menino ficou até se tornar homem, depois foi para além-fronteiras e entretanto voltou transformada em homem consagrado.


Rui Costa chegou ao Benfica com apenas nove anos fotos DR

Voltando à história com Eusébio – Rui Costa diz assim: “Recordo-me particularmente, quase de forma egoísta mas acaba por ser uma realidade, lembro-me de ele me chamar e dizer ‘tu, menino, ficas cá’. Esse é o momento que mais guardo dele e, como devem calcular, vou morrer com essa frase”. A presença de Eusébio “quase que assustava, Só a imagem dele parecia algo gigantesco ao pé de nós”.

Eusébio identificou um prodígio e, anos mais tarde, 1991 é provavelmente o ano da afirmação de Rui Costa – aconteceu aquele histórico Mundial sub-20 em Lisboa, Rui Costa marcou o penálti decisivo que deu a conquista à equipa portuguesa em pleno Estádio da Luz.

Em 1990 ainda chegou a ser emprestado ao Fafe por uma época, mas acaba por regressar a casa para as primeiras conquistas: uma Taça de Portugal em 1992/93 e o campeonato na temporada seguinte.

Num momento de aperto financeiro, o Benfica vendeu o então jovem maestro à Fiorentina a troco de 5,5 milhões de euros (era outro tempo, outros valores). Após seis temporadas na La Viola, onde conquistou duas Taças de Itália e uma Supertaça, o camisola 10 ruma a Milão por 41 milhões de euros (era um tempo mais caro, de novos valores).

Nos cinco anos em que esteve em San Siro venceu tudo o que podia: uma Champions, uma Supertaça Europeia, um campeonato, uma Taça de Itália e uma Supertaça. 


Marco Materazzi e Rui Costa no dia 12 de abril de 2005, durante o Derby della Madonnina – os jogos entre o AC Milan e a Inter de Milão – válido para os quartos de final da Champions. O jogo foi interrompido ao minuto 73 devido a objetos arremessados pelas bancadas, incluindo tochas que atingiram o guarda-redes Dida, do AC Milan foto Getty

O regresso ao Benfica ocorreu em 2006. Rui Costa acordou a rescisão por mútuo acordo com o Milan e chegou mesmo a oferecer-se para jogar de graça na Luz.

Luís Filipe Vieira recusou essa intenção de Rui Costa, mas ainda assim aceitou que jogasse por um salário simbólico, o mais baixo do plantel sénior na época. O momento financeiro do Benfica não era positivo.

O ciclo coo futebolista fechou-se, foi na Luz que começou e foi na Luz na terminou a carreira, na época de 2007/08.


O adeus de Rui Costa aos relvados a 11 de maio de 2008, no Estádio da Luz, depois de um 3-0 frente ao Vitória de Setúbal foto AP

A 14 de maio, dias após o fim do campeonato, Rui Costa assume funções de diretor desportivo do Benfica e torna-se também administrador da Sport Lisboa e Benfica – Futebol, SAD. Em outubro de 2020, Rui Costa foi eleito vice-presidente, passando a ser o braço direito de Luís Filipe Vieira na estrutura das águias.

Operação Cartão Vermelho e a chegada do maestro à presidência

O ponto de viragem como dirigente foi o verão quente de 2021, mais precisamente o dia 7 de julho. A Operação Cartão Vermelho coloca o Benfica no radar da Polícia Judiciária e a investigação conduz à detenção do então presidente Luís Filipe Vieira. Dois dias depois, Vieira suspende todas as funções no clube e o vice, Rui Costa, assume as funções de presidente interino, tal como preveem os estatutos do clube.

A 15 de julho, Vieira acaba por se afastar de vez da presidência, são convocadas eleições e, no dia 9 de outubro de 2021, Rui Costa vence com uns esmagadores 84,4% dos votos, nas eleições com maior participação de sempre da história do clube (até àquela altura) – cerca de 40 mil sócios foram às urnas. Rui Costa tornou-se o 34.º presidente do Benfica. Conquistou quatro títulos: o campeonato de 2022/23, a Supertaça de 2023 e de 2025, uma Taça da Liga em 2023/24; o FC Porto conquistou sete troféus e o Sporting cinco (nomeadamente o bi).

foto AP