O diretor-geral da BBC dirigiu-se esta terça-feira aos funcionários da emissora britânica pela primeira vez desde que anunciou a demissão, depois de ser noticiado pelo Telegraph que um discurso do Presidente dos EUA foi manipulado num documentário da BBC Panorama. Tim Davie reconheceu que foram cometidos erros, mas focou a sua mensagem na capacidade de superação da estação.
Numa vídeochamada com os funcionários, o diretor-geral demissionário começou por reconhecer o período “muito difícil” que a empresa atravessa, criticando os que procuram “instrumentalizar” a situação. “Estes tempos são difíceis para a BBC, mas vamos ultrapassá-los. Vamos ultrapassá-los e vamos prosperar. Esta narrativa não será só imposta pelos nossos inimigos. É a nossa narrativa. Nós assumimos as coisas”, sublinhou, citado pelo jornal Guardian.
Sobre o vídeo de Presidente Donald Trump, Tim Davie reconheceu: “Nós cometemos um erro e houve uma falha editorial, e acho que alguma responsabilidade teve que ser assumida”. Acrescentou que essa foi uma das razões para ter apresentado a demissão, a par da iminente renovação da Carta Real, que estabelece a base legal da BBC e define objetivos, missão, propósitos públicos, governança e ainda o acordo sobre a taxa de licença. Afirmou, no entanto, que nesse assunto a BBC está bem posicionada. “O Governo do dia apoia muito as instituições públicas”.
O diretor-geral disse ainda que a “imprensa livre está sob ataque”. “Vejo a instrumentalização. Temos de lutar pelo nosso jornalismo. Cometemos alguns erros que nos custaram, mas temos de lutar por isso”, defendeu.
“Podem perguntar ‘Para onde é que a BBC está a ir? Estamos sem leme? O que vai acontecer no futuro?’ E são [questões] stressantes, são difíceis … Uma das minhas grandes emoções neste momento é que me preocupo desesperadamente com esta organização, as milhares de pessoas que trabalham para ela”, admitiu.
Tim Davie assegurou que “os factos falam por si”. “Não deixem que ninguém vos impeça de acreditar que estamos a fazer um trabalho fantástico. Na verdade, fizemos a confiança crescer, então vamos divulgar esta mensagem. Tenho muito orgulho nesta organização. Ela atravessa momentos difíceis, mas continua a fazer um ótimo trabalho. E isso fala mais alto do que qualquer jornal, qualquer tentativa de instrumentalização da informação”, destacou.
Davie e Deborah Turness, CEO da BBC News, demitiram-se no domingo. O anúncio surgiu depois de um artigo do Telegraph que citava um memorando interno da estação a sugerir que o programa editou duas partes do discurso de Trump, juntando-as como se tivessem sido proferidas nessa mesma sequência, para que Trump parecesse estar a incentivar de forma explícita à ação dos populares.
O memorando foi assinado por Michael Prescott, um conselheiro externo do comité de normas e diretrizes editoriais da BBC que abandonou o cargo no verão. “Foi completamente enganador editar o excerto da forma como o Panorama o transmitiu. O facto de Trump não ter exortado explicitamente os seus apoiantes a ir até ao Capitólio e a lutar é uma das razões porque não houve acusações federais de incitamento aos motins”, referia no documento, que foi enviado ao conselho de administração da BBC.
Durante a intervenção desta terça-feira, Davie mencionou algumas vezes a “transição” de direção, mas não adiantou um calendário para a mudança. O chairman da BBC, Samir Shah, que também esteve presente na chamada, disse apenas que estavam em “modo sucessão”.