Faltava um minuto para o fim da segunda conversa em palco quando o moderador pergunta aos dois oradores convidados. Onde é que isto vai acabar? “Na capitulação do Ocidente”, responde o economista Philip Pilkington, com um ar de quem acaba de dizer uma banal evidência.

“Isto” é a guerra de taxas aduaneiras entre EUA e China. Um assunto que também entra na Web Summit, sobretudo no palco que nesta edição foi dedicado à China por algumas horas nesta terça-feira. A plateia da China Summit esteve repleta quase até ao fim, neste “mini-evento” dentro da Web Summit, inédito e com direito a intervenção de abertura do próprio fundador da conferência, Paddy Cosgrave.

“Isto vai acabar na capitulação de todo o Ocidente. A Europa e os EUA vão capitular nesta guerra de taxas aduaneiras”, vaticina Pilkington. “E a única coisa que todo o Ocidente vai conseguir é causar danos em si mesmo.”

O seu colega de palco, Einar Tangen, o investigador associado do Centro para a Inovação na Governança Internacional, afirma: “Não há vencedores numa guerra destas.” “A China também tem algo a perder. As suas pequenas e médias empresas estão a sofrer. Mas a China tem um plano. Os EUA não. E a Europa também não.” Concretizando o raciocínio, afirma: “A China procura o crescimento da sua economia através da conquista de novos mercados. E isso é algo que a Europa deveria estar a fazer.”

“As tarifas não fazem magia. Elas protegem. Não criam. Não constroem indústria”, frisa Pilkington, investigador no Instituto Húngaro de Assuntos Internacionais. “É exactamente isso o que estamos a ver [nos EUA]; por cada emprego salvo com as tarifas de Trump sobre aço e ferro, a economia está a perder 3,2 empregos a montante e todo o efeito económico”, acrescenta Tangen.

Antes de chegar às taxas aduaneiras e aos riscos globais do chamado “decoupling” entre as economias ocidentais e a da China (um termo em inglês que pode ser traduzido como dissociação), falou-se muito de inteligência artificial (IA).

Paddy Cosgrave – que tem em mira arrancar com uma Web Summit China em 2027 – deu o mote logo no início.

“Há 12 meses era impensável que pudesse haver modelos de IA chineses, de acesso aberto, a liderar esta corrida”, frisou o presidente da Web Summit, que ressurgirá na quarta-feira para uma conferência de imprensa a meio da edição 2025, que tem mais de 71 mil participantes e o maior número de investidores de todas as dez edições em Lisboa (nove presenciais e uma virtual, em 2020).

Qual é a receita chinesa? “Educação”, responde Joleen Ling, empresária de origem chinesa que passa um terço do ano nos EUA, mas tem a sua empresa de IA na China.

Ben Harburg, investidor com experiência no mercado chinês, por seu lado, considera que a China teve a vantagem dos que partem na segunda largada, a vantagem dos late movers.

“Para grande surpresa da China, quando começaram a conquista dos mercados internacionais, encontraram uma dinâmica concorrencial muito mais fraca do que imaginavam.”

Para Pilkington, “é tarde” para o decoupling dos três blocos.

“Isto assenta na premissa de que a globalização nunca aconteceu. É uma ingenuidade, não perceber como funcionam as cadeias de abastecimento. E vimos o que aconteceu. A Administração Trump tentou lançar uma guerra tarifária e os chineses restringiram a venda de matérias raras”, de que a indústria dos EUA necessita. “Aliás, nem foi preciso restringir. Puseram o nome dos materiais numa lista de potencial restrição. Bastou isso para todas as empresas relevantes irem ter com Trump e dizer-lhe que assim não sobreviveram. E por isso recuaram.”