Astrônomos do radiotelescópio MeerKAT, na África do Sul, registraram pela primeira vez uma emissão de rádio proveniente do objeto interestelar 3I/ATLAS, um cometa que atravessa o Sistema Solar em trajetória de escape. A detecção ocorreu em 24 de outubro, quando o cometa estava a apenas 3,76° do Sol, após duas tentativas sem sucesso em 20 e 28 de setembro.
O 3I/ATLAS foi descoberto no dia 1º de julho de 2025 pelo Sistema de Alerta Final de Impacto Terrestre de Asteroides (ASTLS). Logo se confirmou que ele era o terceiro objeto interestelar já observado — depois de 1I/‘Oumuamua e 2I/Borisov. Desde então, astrônomos do mundo todo acompanham seu trajeto. O comportamento clássico de cometa (liberação de gases e formação de coma) revelou tratar-se de um corpo gelado interestelar, possivelmente viajando sozinho há 10 bilhões de anos.
O cometa chegou ao periélio (ponto de maior aproximação do Sol) em 29 de outubro, período em que os astrônomos esperavam observar sua composição com mais clareza. No entanto, ele ficou temporariamente fora do campo de visão, oculto atrás do Sol. Agora, com sua reaparição, telescópios voltaram a observar como essa passagem próxima afetou o objeto — possivelmente a primeira em bilhões de anos.
Detecção de rádio
A radioastronomia permite identificar a composição química de corpos celestes por meio das emissões e absorções de ondas de rádio. No caso do 3I/ATLAS, o MeerKAT detectou absorção de moléculas de hidroxila (OH), resultado da liberação de gelo de água conforme o cometa é aquecido pelo Sol.
“As características de absorção são consistentes com a população esperada de níveis de OH devido à velocidade heliocêntrica do cometa”, relatou a equipe na publicação do estudo. As observações de setembro, que não haviam registrado o sinal, apresentaram apenas ruído, que indica que a detecção de outubro reflete uma intensificação natural da atividade cometária.
O astrofísico Avi Loeb, de Harvard, que já havia proposto hipóteses sobre possíveis naves alienígenas, comentou o achado em seu blog. Segundo ele, quando o 3I/ATLAS estava a 1,38 vezes a distância entre a Terra e o Sol, sua temperatura superficial era cerca de 230 K (-43 °C). Essa condição gerou largura térmica de linhas de OH em torno de 0,8 km/s, o que está em plena concordância com as observações do MeerKAT.
Apesar das especulações, as evidências reforçam que o 3I/ATLAS é um cometa natural, e não uma nave alienígena. As ondas de rádio detectadas são compatíveis com a desgaseificação típica de cometas: moléculas de água que, ao serem expostas à radiação solar, se decompõem em radicais hidroxila.
Estudos citados pelo Live Science destacam que esse processo é um sinal inequívoco de atividade cometária. Em observações anteriores, astrônomos já haviam visto jatos de água sendo expelidos do objeto “como uma mangueira de incêndio”, e agora a radiação solar está decompondo parte dessa água.
Mesmo assim, Loeb levantou novamente a hipótese de que o tamanho incomum — estimado em 9,6 km de diâmetro e cerca de 50 bilhões de toneladas — poderia ser explicado por uma origem não natural. “Por que tivemos tanta sorte de receber um objeto tão gigante como o terceiro da lista, antes de testemunharmos milhões de outros do tamanho de ‘Oumuamua?”, questionou.
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A maioria dos cientistas, porém, considera essa hipótese desnecessária, já que todas as observações feitas até agora são coerentes com o comportamento de um cometa interestelar antigo, provavelmente ejetado de um sistema estelar distante, na borda da Via Láctea, há até sete bilhões de anos.
Atualmente, o 3I/ATLAS está a cerca de 327 milhões de quilômetros da Terra e deve atingir seu ponto de maior proximidade com o planeta em 19 de dezembro de 2025. Entre 2 e 25 de dezembro, a sonda Jupiter Icy Moons Explorer (JUICE), da Agência Espacial Europeia (ESA), realizará uma série de observações detalhadas do objeto.
Jornalista pelo Centro Universitário de Brasília, apaixonada por literatura e questões sociais. Passou pela editoria de Cultura e agora escreve para o CB On-line, onde assina o Blog Daquilo.