É uma sensação turística há milhares de anos, muito antes das redes sociais, no que começou como uma veneração a algo que era conhecido como um portão para o inferno
À distância, Pamukkale parece em tudo uma estância de esqui, com uma cascata de encostas de um branco brilhante e um grupo de turistas no topo, aparentemente prestes a fazer slalom até ao vale abaixo.
Então, porque não derrete, mesmo quando as temperaturas a meio do verão se aproximam dos 37 graus Celsius e o calor paira no ar?
Porque esta maravilha invulgar e bela, situada nas colinas banhadas pelo sol do sudoeste da Turquia, não é neve. Na verdade, a água de que é formada chega a jorrar do solo em ponto de ebulição.
E os visitantes que vagueiam pelas zonas mais altas não têm pressa. A maioria está ali para admirar o espetáculo extraordinário, e para molhar os pés ou mergulhar em algumas das piscinas mais fotogénicas do planeta.
Hoje, as encostas e piscinas de calcário travertino de Pamukkale, cheias de água mineral azul, são perfeitas para momentos de Instagram, especialmente quando a luz mágica do entardecer pinta as suas superfícies onduladas em tons de rosa.
O Portão do Inferno
Mas este local já era uma sensação turística milhares de anos antes das redes sociais, quando primeiro os gregos e depois os romanos aqui acorriam pelas águas termais, e para prestar homenagem ao que era venerado como um portão para o Inferno.
Hoje, Pamukkale e a antiga cidade de Hierápolis, que se estende pelo planalto acima dos terraços brancos, fazem parte de um sítio classificado como Património Mundial da UNESCO, que atrai autocarros cheios de visitantes. Normalmente, muitos ficam apenas algumas horas, mas vale a pena passar pelo menos um dia neste parque geológico e histórico.
A entrada faz-se pelo Portão Sul, os bilhetes custam 30 euros, e é fácil sentir-se inicialmente desiludido. À primeira vista, há pouco para ver além de algumas colunas antigas tombadas, uma visão frequente nesta parte da Turquia.
Na verdade, o o sítio arqueológico de Hierápolis e Pamukkale é enorme, por isso demora algum tempo até se chegar ao mais interessante (podem alugar-se carrinhos de golfe para quem tem pouco tempo ou dificuldades em percorrer as distâncias). Mas isso também faz com que o grande momento de revelação, quando chega, seja ainda melhor.
Mary Huang, de visita de Cantão, na China, posa para uma foto. (Barry Neild/CNN)
Após 10 minutos de caminhada por caminhos pavimentados desde o portão, a linha de árvores que marca o limite do planalto surge à vista. Mesmo sabendo o que está para vir, o impacto visual quando se chega é inevitável, e o espetáculo da paisagem branca é arrebatador.
Ao longo de milénios, o calcite depositado pela água termal que jorra do solo remodelou esta encosta, criando os terraços brancos que dão nome à área, Pamukkale significa “castelo de algodão” em turco.
Esses terraços outrora continham inúmeras piscinas naturais de cor azul. A maioria está agora sem água e interditada, o que leva alguns visitantes a queixarem-se de que o local já não corresponde às fotografias de outros tempos.
“É bonito, mas não há tanta água como eu esperava”, diz Mary Huang, uma turista de Cantão, no sul da China, enquanto posa para uma fotografia à beira de uma das piscinas. “Mas a vista é deslumbrante”.
Piscinas serenas
Ainda assim, há uma impressionante sucessão de piscinas serenas, que descem em cascata pela colina. É um local divertido para chapinhar ou deitar-se nas águas rasas e na lama, que se diz ter propriedades terapêuticas.
Para explorar os terraços, os visitantes devem descalçar-se. A rocha é desconfortável e escorregadia em alguns pontos, mas não demora muito até chegar à primeira série de piscinas, onde os dedos dos pés se afundam num sedimento macio.
Os terraços superiores são os mais concorridos, mas quem se aventurar mais abaixo tem boas hipóteses de encontrar uma piscina só para si.
O visitante sul-coreano DJ Tiz espalha lama enquanto Fre Naz e um cão local observam. (Barry Neild/CNN)
DJ Tiz, um produtor musical sul-coreano em viagem de carro pela Turquia com a companheira, a cantora Fre Naz, é um dos que se cobre de lama. Depois de já ter conhecido muitas das paisagens deslumbrantes do país, afirma: “Adoro Pamukkale acima de todos os outros lugares”.
Para uma experiência termal mais completa, há a Piscina Antiga, a cerca de cinco minutos a pé do topo dos terraços. Aqui, mediante uma pequena taxa adicional, os visitantes podem usar balneários e nadar em águas termais cristalinas sobre as ruínas tombadas de um antigo templo dedicado a Apolo.
Melhor ainda: perto da nascente, num dos cantos da piscina, a água enche-se de pequenas bolhas efervescentes. É como nadar em champanhe ou refrigerante quente. Diz-se que a água alivia problemas de pele, cardiovasculares e reumáticos. Beber da bomba de água também é apontado como benéfico para o sistema digestivo.
Fumos tóxicos
Hierápolis tem um Plutónio, que era reverenciado nos tempos antigos romanos e gregos como uma porta de entrada para o Inferno. (Barry Neild/CNN)
Pode-se passar horas a vaguear pelos vestígios de Hierápolis – destaques incluem a ampla ágora do século II, o magnífico teatro romano e os túmulos da necrópole.
A dimensão do local revela o poder e a popularidade que a cidade teve noutros tempos (é até mencionada na Bíblia, juntamente com outra cidade em ruínas próxima, Laodiceia, também digna de visita). Grande parte do estatuto de Hierápolis derivava das forças geotérmicas sob o seu solo.
Embora muitos dos romanos e gregos que vinham à cidade o fizessem pelas águas quentes, o local tinha também enorme importância religiosa, por ser o sítio de uma caverna de Plutónio, ou entrada para o Inferno.

Aqui, animais sacrificiais como touros morriam depois de inalarem os fumos tóxicos de dióxido de carbono que subiam das profundezas. Os sacerdotes, que os conduziam para dentro, emergiam ilesos, por terem aprendido a suster a respiração.
Hoje, o Plutónio, situado entre a Piscina Antiga e o teatro romano, é outro ponto alto da visita a Hierápolis, e um dos muitos locais da cidade que vale a pena ver nas noites frescas de verão, quando algumas atrações ficam dramaticamente iluminadas.
Embora Pamukkale goze de uma fama mais moderna graças ao seu aspeto fotogénico nas redes sociais, alguns locais lamentam a transformação do turismo na região.
Ali Durmuş, que dirige a empresa de turismo Turkey Magic Travel, com sede em Pamukkale, diz que o isolamento de grande parte dos travertinos e o desvio de água desde que se tornou Património Mundial da UNESCO privaram os visitantes de uma experiência vivida durante milénios. Diz que isso os desmotiva a permanecer mais tempo.
A classificação da UNESCO levou à demolição de hotéis no local, à construção de novas piscinas, ao redirecionamento da água para canais artificiais, a uma melhor gestão do local e ao encerramento das encostas para reverter a degradação que as tinha tornado cinzentas em vez de brancas.
“Se não podem desfrutar da água, então não ficam muito tempo. Talvez uma noite, ou apenas uma tarde”, diz Durmuş.
Em Karahayit, uma cidade termal perto de Pamukkale, as fontes geotérmicas deixam depósitos vermelhos no seu rasto. (Anja Koeberle/iStock Editorial/Getty Images)
Teme que a experiência reduzida leve as pessoas a perder o interesse em explorar a área envolvente, que possui outras atrações geotérmicas. As vilas que se estendem a noroeste de Pamukkale ao longo de uma falha geológica aproveitam reservas cada vez mais quentes de vapor e água que sobem do subsolo.
A cerca de 20 minutos de carro a noroeste, na bacia de Denizli, a cidade de Karahayit tem spas e sistemas de aquecimento baseados em águas ricas em ferro, de tom avermelhado, que emergem a cerca de 50 graus Celsius. A cidade tem também um agradável mercado coberto, com vendedores de rua que servem deliciosos sumos de amora.
Mais longe, em Buharkent, cujo nome significa “cidade do vapor”, a água em ponto de ebulição alimenta a primeira central geotérmica da Turquia.
No inverno, sabe-se que às vezes fica frio o suficiente para nevar em Pamukkale, mas graças às forças primitivas que emergem dos seus portais subterrâneos infernais e pintam as encostas de branco, este é sempre um destino quente.