O Banco Central Europeu (BCE) divulgou nesta terça-feira os resultados agregados do mais recente Processo de Revisão e Avaliação da Supervisão (SREP), que incidiu sobre 105 das 113 instituições diretamente supervisionadas por aquela autoridade, revelando ainda as prioridades de supervisão para o período 2026-2028.

Segundo o BCE, os bancos da zona euro devem preparar-se para choques sem precedentes que poderão causar perturbações graves, com consequências de longo alcance para os sistemas financeiros. No documento que define as prioridades de supervisão para os próximos dois anos, o BCE lança um alerta claro: “os bancos precisam de estar preparados para gerir os desafios que se avizinham. As incertezas globais atingiram níveis excecionais, criando um ambiente de fragilidade acentuada, onde riscos antes considerados remotos estão a tornar-se mais prováveis.”

A instituição liderada por Christine Lagarde enumera os riscos que as instituições irão enfrentar até 2028: “tensões geopolíticas e mudanças nas políticas comerciais, crises climáticas e ambientais, alterações demográficas e disrupções tecnológicas estão a exacerbar vulnerabilidades estruturais, tornando a probabilidade de eventos extremos de baixa probabilidade (riscos extremos) sem precedentes.”

“A incerteza está elevada. Esta combinação de fatores aumenta o risco de ruturas repentinas e graves, com consequências de longo alcance para as economias, os mercados financeiros e os bancos. Isso reforça o apelo feito aos bancos nos últimos anos para que permaneçam vigilantes e evitem a complacência”, acrescenta o BCE.

Para já, o grau de robustez financeira das instituições europeias permanece elevado. O rácio de capital total das instituições significativas atingiu 20,1% no final de 2024, subindo ligeiramente para 20,2% no segundo trimestre de 2025. O rácio de Capital Principal de Nível 1 (CET1) situou-se em 16,1% no segundo trimestre de 2025. O rácio de alavancagem médio ponderado fixou-se em 5,9%, também no segundo trimestre de 2025.

As reservas de liquidez continuam confortáveis, com o índice de cobertura de liquidez agregado em 158% no segundo trimestre de 2025, substancialmente acima dos requisitos mínimos e dos níveis pré-pandemia. O rácio de financiamento estável líquido agregado manteve-se em 127%, e as entidades supervisionadas continuam a dispor de bom acesso a financiamento.

No entanto, o Processo de Revisão e Avaliação da Supervisão (SREP) identificou algumas fragilidades no universo das 105 instituições analisadas. Dessa avaliação resultou a emissão de medidas qualitativas para 100 bancos. A maioria dessas medidas incidiu sobre o risco de crédito (40%), seguido da governação interna (17%) e da adequação de capital (11%).

O BCE não divulga banco a banco as classificações atribuídas durante o SREP. A avaliação é resumida numa pontuação global, que varia entre 1 (baixo risco) e 4 (alto risco). De acordo com as diretrizes da Autoridade Bancária Europeia (EBA) relativas ao SREP, essa pontuação reflete a avaliação global da viabilidade da instituição: pontuações mais altas significam maiores riscos para a viabilidade, decorrentes de uma ou mais características do seu perfil de risco.

No que se refere aos riscos de crédito (que representam 40% das medidas emitidas), os supervisores assinalam uma boa qualidade dos ativos e melhorias nos quadros de gestão do risco de crédito. No entanto, constataram igualmente uma deterioração no setor imobiliário comercial e deficiências persistentes no controlo de riscos, nomeadamente na concessão de empréstimos, na classificação e acompanhamento de riscos, bem como na qualidade dos dados comunicados pelas instituições financeiras.

Embora tenham sido observadas melhorias na governação interna (responsável por 17% das recomendações) em vários bancos, o BCE refere que “persistem problemas nas áreas da composição do conselho de administração e da cultura de risco. A falta de conhecimento especializado em certas áreas, como TI, continua a ser uma preocupação e, embora os bancos tenham avançado na promoção da diversidade, esta continua a revelar fragilidades. Estes problemas manifestaram-se, por vezes, em decisões deficientes.”

Os rácios de adequação de capital (11% das recomendações) melhoraram ligeiramente, mas subsistem preocupações quanto à qualidade do planeamento de capital e ao rigor das projeções realizadas por algumas instituições.

Face a este diagnóstico, as prioridades de supervisão para o período de 2026-2028 irão centrar-se, em primeiro lugar, na exigência de “que os bancos se mantenham resilientes aos riscos geopolíticos e às incertezas macrofinanceiras. Isto inclui garantir que os bancos mantenham padrões de crédito sólidos, níveis adequados de capitalização através da implementação consistente do Regulamento de Requisitos de Capital (CRR3) e que façam uma gestão prudente dos riscos climáticos e ambientais.”

A segunda prioridade consiste em garantir uma forte resiliência operacional e capacidades de TIC, através de estruturas robustas de gestão de riscos operacionais, de modo a corrigir deficiências na comunicação de riscos e na agregação de dados, assegurando assim sistemas de informação fiáveis.

“Os resultados do ciclo SREP de 2025 continuaram a demonstrar a forte resiliência do setor bancário europeu, apesar do ambiente global cada vez mais desafiador e dos riscos geopolíticos multidimensionais”, afirma o BCE, acrescentando que “isso se deveu à forte regulamentação e à supervisão mais eficiente, bem como à resposta extraordinária das políticas fiscal e monetária aos choques recentes. Olhando para o futuro, essa resiliência precisa de ser preservada para garantir um apoio sólido à economia real da Europa e à sua resiliência financeira e operacional.”

Pelo lado positivo, as melhorias mais notáveis foram observadas na rentabilidade, no declínio contínuo dos NPLs (crédito malparado) e no progresso alcançado no aperfeiçoamento das práticas de governação interna. Pelo lado negativo, os principais fatores que contribuíram para as pontuações mais baixas do SREP incluíram a desaceleração da margem financeira (NII) e os desafios estruturais de custos em certos modelos de negócio, as vulnerabilidades persistentes na qualidade dos ativos em alguns portfólios e regiões, as deficiências prolongadas nas estruturas de gestão do risco de crédito e a necessidade de mais reformas estruturais em áreas como a composição do conselho de administração, a cultura de risco, as funções de controlo interno e o RDARR (Requisitos de Agregação de Dados de Risco).