O debate desta terça-feira à noite, transmitido pela SIC, confirmou aquilo que já se antecipava: Luís Marques Mendes e António Filipe partilham pouco mais do que a condição de candidatos às eleições presidenciais de 18 de janeiro. Em quase todos os temas, as posições divergiram de forma vincada e, por vezes, com momentos de tensão visível entre ambos.

No pacote laboral, a discussão aqueceu logo na fase inicial. O antigo ministro social-democrata defendeu a necessidade de diálogo entre Governo, entidades patronais e UGT, sublinhando que “mexer em leis laborais tem a sua controvérsia” mas que é fundamental procurar pontos de encontro. António Filipe disse, por sua vez, que quer “impedir o pacote laboral” e acusou o adversário de estar “do lado do Governo e não do lado dos trabalhadores”. A troca de argumentos levaria Marques Mendes a lembrar que se tratava de um debate presidencial e não legislativo, insistindo na separação de papéis.

A polémica em torno das comemorações do 25 de Novembro também gerou confronto direto. António Filipe reiterou que não estará presente por considerar que essas celebrações “são contra o 25 de Abril”. A posição levou o ex-líder do PSD a acusá-lo de “falta de sentido de Estado” e de ser um candidato “de fação”. O comunista devolveu a crítica, garantindo: “Sou tão de fação como Marques Mendes, não vamos por aí.”


Foto: José Fernandes/SIC

Política externa e economia alimentam desencontros

As diferenças prolongaram-se para a política externa, em particular sobre a guerra na Ucrânia. Marques Mendes criticou a postura do rival, afirmando que “há um agressor e um agredido” e que não compreende a posição de António Filipe. O candidato apoiado pelo PCP reiterou que condenou “os desenvolvimentos de 2022”, defendendo que “a guerra podia e devia ter sido evitada” e que “a melhor forma de apoiar o povo ucraniano é fazer com que a guerra termine”.

No campo económico, o social-democrata reivindicou experiência política e destacou que Portugal “cresceu pouco economicamente”, defendendo outra ambição para o país. António Filipe concordou com a necessidade de aumentar a produção nacional, mas responsabilizou a saída de setores estratégicos para mãos estrangeiras. “Temos a banca nas mãos dos espanhóis, telecomunicações nas mãos de vários países e agora um caso escandaloso na TAP”, alertou, reafirmando que avisaria o Governo para os riscos da privatização da companhia aérea.

A estabilidade, apontada por ambos como um dos grandes desafios do país, revelou leituras muito distintas. Para Marques Mendes, trata-se de estabilidade política, evitando eleições frequentes. Já António Filipe referiu-se à “estabilidade da vida das pessoas”, insistindo que o presidente tem de compreender os problemas quotidianos dos portugueses.

Em sintonia democrática

Apesar das divergências, houve um ponto de convergência: a defesa da democracia e o compromisso de travar qualquer tentativa de deriva autoritária. Marques Mendes evocou os valores da sua candidatura (“democracia, liberdade e justiça social”), enquanto António Filipe lembrou que o presidente da República é “o último reduto da democracia”, podendo exercer o veto ou, em casos extremos, “dissolver a democracia”, caso um Governo ponha em causa as regras fundamentais.

O debate, moderado por Clara de Sousa, abriu com uma pergunta a Luís Marques Mendes, sorteado para iniciar a discussão, e encerrou com a intervenção final de António Filipe. Foi apenas o segundo dos 28 debates que irão marcar a corrida eleitoral, mas deixou claro que os dois candidatos caminham em trilhos muito diferentes rumo a Belém.