Nathan Howard / EPA

Mohammed bin Salman e Donald Trump

Trump iliba príncipe saudita da morte de jornalista. “Há coisas que acontecem”. Palavras dirigidas a jornalista foram duras.

É um dos encontros mais mediáticos na Casa Branca nos últimos tempos. No actual mandato de Donald Trump, só deve ser superado pelo encontro com Volodymyr Zelenskyy, presidente da Ucrânia.

Não, não é Cristiano Ronaldo: é Mohammed bin Salman, príncipe herdeiro da Arábia Saudita, que esteve com o presidente dos EUA nesta terça-feira.

A sua presença na Casa Branca foi muito comentada – e contestada – porque os serviços secretos dos EUA, quando investigaram o homicídio de Jamal Khashoggi (jornalista crítico da liderança da Arábia Saudita), concluíram que Mohammed bin Salman aprovou a sua captura ou mesmo a sua morte.

“O príncipe herdeiro considerava Khashoggi uma ameaça ao Reino e apoiava amplamente o uso de medidas violentas, se fosse necessário, para o silenciar”, lê-se no comunicado publicado em 2021.

O príncipe negou envolvimento na operação, mas reconheceu que, enquanto governante, tinha responsabilidades.

Donald Trump foi questionado sobre esse assunto e assegurou que o príncipe herdeiro nada sabia: “Muita gente não gostava desse senhor de quem está a falar, quer gostasse ou não dele. As coisas acontecem, mas ele não sabia de nada, e podemos ficar por aqui”.

“És uma pessoa terrível”

Mas não foi esse o foco deste encontro com jornalistas, na Casa Branca.

O momento visivelmente mais tenso foi com Mary Bruce, a jornalista da ABC que fez as perguntas indesejadas.

Primeiro a Trump: “Será apropriado que a sua família tenha negócios na Arábia Saudita enquanto o senhor é presidente? Não será isso um conflito de interesses?”.

Logo a seguir a bin Salman: “Os serviços secretos dos EUA concluíram que o senhor orquestrou o brutal assassinato de um jornalista — as famílias das vítimas do 11 de Setembro estão furiosas porque o senhor está aqui na Sala Oval. Por que razão os americanos deveriam confiar no senhor? E o mesmo vale para o senhor, senhor presidente”.

Donald Trump não gostou do que ouviu. Perguntou à jornalista qual é o órgão de comunicação social para o qual trabalha. Quando ouviu que era ABC News: “Notícias falsas. ABC é só notícias falsas, uma das piores no negócio”.

Pelo meio, respondeu às perguntas: assegurou que nada tinha a ver com os negócios da sua família e, sobre o alegado envolvimento do príncipe na morte do jornalista, apontou: “Não precisa de deixar o nosso convidado constrangido, fazendo uma pergunta como essa. Este senhor (Mohammed bin Salman) fez um trabalho fenomenal”.

Mas a disputa a dois ainda não tinha terminado.

A jornalista Mary Bruce voltou a fazer uma pergunta: “Senhor presidente, porquê esperar que o Congresso divulgue os ficheiros Epstein? Porque não fazê-lo agora?”

Aí, Donald Trump ficou ainda mais irritado: “Não é a pergunta em si que me incomoda, mas sim a sua atitude. Acho que é uma péssima jornalista. É a forma como faz estas perguntas. Começa com um homem que é muito respeitado, fazendo-lhe uma pergunta horrível, insubordinada e simplesmente terrível. E você até poderia fazer exactamente a mesma pergunta, mas de uma forma educada. Está toda entusiasmada. Alguém lá na ABC influenciou. Vai continuar a entusiasmar-se. É uma pessoa terrível e uma jornalista terrível”.

Em relação a Jeffrey Epstein: “Não tenho nada a ver com isso. Expulsei-o do meu clube há muitos anos porque o considerava um doente pervertido. Mas acho que tinha razão. Mas sabem quem tem algo a ver com ele? Bill Clinton. Larry Summers, que dirigia Harvard, estava com ele todas as noites, todos os fins de semana. Viviam juntos. Foram à ilha dele muitas vezes. Nunca fui… Continuem a falar sobre os ficheiros de Epstein”.

E rapidamente voltaram os ataques à ABC: “E a ABC, a sua empresa, a sua empresa de caca, é uma das autoras desta farsa. Acho que a licença da ABC devia ser revogada porque as suas notícias são tão falsas e tão erradas”.

Já há quem defenda que Mary Bruce devia entrar na lista de heróis nacionais.

“Porquinha”

Estes insultos a jornalistas têm sido frequentes nos últimos dias.

Apenas dois dias antes, no domingo, o presidente dos EUA disse a um jornalista da Bloomberg: “É o pior. Nem sei porque a Bloomberg ainda conta consigo”.

E dois dias antes desse momento, na sexta-feira passada, e novamente no contexto dos ficheiros Epstein, a jornalista Catherine Lucey, também da Bloomberg, perguntou: “O que é que Jeffrey Epstein quis dizer nos seus e-mails quando afirmou ‘Sabia das raparigas’?”. Trump assegurou que nada sabia sobre isso, desviou as atenções para Bill Clinton e Larry Summers, criticou os democratas, mas a jornalista interrompeu: “Não há nada incriminatório nos ficheiros?” – e Trump disse à jornalista: “Silêncio, porquinha”.

A Casa Branca defendeu Trump neste assunto: “A jornalista em causa comportou-se de forma inadequada e pouco profissional com os seus colegas no avião. Quem critica tem de saber receber críticas”.

Esta mudança de limites no discurso começou há uns anos, quando Donald Trump disse que os jornalistas são “inimigos do povo” – algo que já ouvimos por cá, mais recentemente.


Nuno Teixeira da Silva, ZAP //


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