O Governo quer fazer alterações à Lei do Trabalho e já apresentou algumas medidas — que estão a ser discutidas com os sindicatos. Entre a duração de contratos ao período experimental, há mudanças a ter em conta para quem está a entrar no mercado de trabalho e pode estar mais sujeito a este tipo de vínculos contratuais.

Paulo Marques, professor associado no Departamento de Economia Política (ECSH)​ e coordenador do Observatório do Emprego Jovem, defende que estas mudanças, a concretizarem-se, “são nocivas para os trabalhadores e muito nocivas para os jovens”: “É uma reforma que favorece apenas um lado da relação laboral.”

Em reacção, a CGTP já entregou o pré-aviso de greve geral — à qual a UGT também se associou — para o dia 11 de Dezembro. Para as duas centrais sindicais, o novo pacote laboral é “profundamente negativo para o mundo do trabalho”. Esta quarta-feira, o Governo cedeu em 27 dos mais de 100 artigos que compõem a legislação para tentar responder a algumas das exigências da UGT. Mas a maioria mantém-se.

Contratos de trabalho a termo certo e incerto

Actualmente, os contratos a termo certo têm uma duração inicial mínima de seis meses. Com a nova proposta do Governo, passarão a uma duração mínima de um ano, podendo ser renovados até três vezes. A duração máxima também poderá alterar: podem passar de dois para três anos nos contratos a termo certo e de quatro para cinco nos contratos a termo incerto.

Estas propostas podem “fazer com que a possibilidade de conversão dos contratos seja menor”, explica Paulo Marques. “O empregador não tem de tomar uma decisão ao fim de dois anos. O argumento que existe quando o desemprego é alto, de que é preciso criar formas contratuais para que os empregadores não tenham medo de contratar, [não se enquadra] quando temos uma taxa de desemprego relativamente baixa (actualmente fixa-se nos 5,8%, a mais baixa desde 2020)”, continua.

Para o professor, a medida poderá aumentar a precariedade, depois de “uma trajectória de diminuição”: “Temos muitos sectores, ligados ao turismo e restauração, por exemplo, onde há muita rotatividade e onde os empregadores tendem a usar muito estas formas de contratação. Se a legislação abre muito a porta, a utilização [destes mecanismos] é ainda maior.”

Trabalhadores independentes

Um trabalhador independente é considerado economicamente dependente de uma empresa quando 50% dos seus rendimentos advêm da mesma empresa ou cliente. A existência de uma percentagem visa proteger os trabalhadores daquilo a que comummente chamamos “falsos recibos verdes” — quando o trabalhador é na verdade dependente de uma empresa, apesar de não ter um vínculo contratual com ela.

Com a nova lei, o Governo quer aumentar essa percentagem para os 80%, o que, considera Paulo Marques, “vai fazer com que se utilizem mais os recibos verdes, porque só quando se atingem os 80% é que o empregador vai ter de fazer um contrato — que é o que vai dar direitos e protecção [ao trabalhador]”.

Fim do período experimental de 180 dias no primeiro emprego

Outra das mudanças propostas é o fim do período experimental. Actualmente, a lei diz que, nos contratos de trabalho por tempo indeterminado, é obrigatório um período experimental de 180 dias para os trabalhadores que “estejam à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração”.

Paulo Marques acredita que esta medida é uma “moeda de troca”, à semelhança do que já aconteceu no passado: “O Governo anterior deu um aumento de período experimental como compensação de uma redução da duração dos contratos a termo, a termo incerto, à utilização dos recibos verdes, combate ao outsourcing, tudo isso. A reforma anterior diminuiu muito a flexibilidade nas formas de contratação temporária e deu um bocadinho aos empregadores; agora, acontece o contrário: o que se está a fazer é a aumentar a flexibilidade e dar um bocadinho aos trabalhadores.”

Em 2019, o PS, PSD e CDS viabilizaram o aumento de 90 para 180 dias do período de experiência exigido aos trabalhadores à procura de primeiro emprego e aos desempregados de longa duração. O PCP e o BE votaram contra.

Outras medidas

  • A nova proposta poderá tornar mais fácil rejeitar o teletrabalho, já que revoga a obrigação de o empregador ter de fundamentar a recusa.
  • Acabam também as restrições à contratação externa (outsourcing) durante um ano após despedimentos e uma autodeclaração de doença fraudulenta pode dar direito a despedimento por justa causa.
  • Os trabalhadores vão poder pedir que os subsídios de férias e Natal sejam pagos em duodécimos e poderão voltar os três dias de férias adicionais ligados à assiduidade que tinham sido eliminados durante a intervenção da troika.