Um dos temas quentes da transição energética que o mundo atravessa para abandonar os combustíveis fósseis é a concretização de projectos de energias renováveis, como as centrais hidroeléctricas, eólicas ou fotovoltaicas. Em conversa com o Azul durante a Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), em Belém do Pará, no Brasil, o presidente do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), Nuno Banza, abordou estes desafios globais da conservação.

“A esmagadora maioria do nosso trabalho é articulação”, explica Nuno Banza, a propósito do trabalho do ICNF. O instituto esteve representado na COP30 para apresentar, entre outras iniciativas, a Estratégia Nacional da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, que se encontra em fase de revisão.​

Em matéria de transição energética, um dos grandes temas da agenda climática global, o ICNF tem trabalhado, por exemplo, na criação das Zonas de Aceleração de Renováveis (ZAR), uma exigência da União Europeia que deverá estar concretizada até meados do próximo ano.

As ZAR virão complementar um trabalho que o ICNF já tem feito de disponibilizar informação de zonamento no país, indicando claramente, por exemplo, áreas de protecção de espécies. “Nós partilhamos informação hoje como nunca foi partilhada, e gratuitamente, o que é uma grande ajuda para os promotores.”

Informação pode evitar conflitos

Em Portugal, dezenas de projectos de renováveis, em particular grandes centrais fotovoltaicas, têm gerado conflitos com as populações e associações ambientalistas.

“Os leilões anteriores foram feitos única e exclusivamente tendo em conta os pontos de ligação”, começa por explicar Nuno Banza, notando que isto fez com que os promotores tivessem de fazer propostas para áreas circundantes onde, mais tarde, “não conseguem implementar” devido às restrições impostas pelos valores naturais.

Nuno Banza sublinha ainda que “a maioria dos projectos apresentados é alterada”, havendo também locais onde a presença de valores naturais relevantes impede a aprovação.

“Nós ponderamos sempre todas as propostas, mas há sítios onde há valores tão relevantes que é óbvio que nunca vamos dizer que sim”, reforça. “Ninguém quer a serra de Sintra forrada com painéis solares, ou a serra da Arrábida forrada com geradores eólicos, ou a Mata de Albergaria.”

Clima e biodiversidade de mãos dadas

Esta é a primeira COP do Clima onde há um ponto da agenda sobre as sinergias entre as três “convenções do Rio” – Biodiversidade, Clima e Desertificação.

O presidente do ICNF acredita que a separação das matérias ambientais em três convenções durante a Cimeira da Terra em 1992, vista como um “pecado original” por algumas vozes, foi na realidade uma oportunidade, permitindo desenvolver mais profundamente cada uma das componentes.

“Se tivéssemos tudo na mesma convenção, não sei se teríamos conseguido desenvolver da mesma forma”, afirma. Na Convenção sobre a Diversidade Biológica (CBD), descreve Nuno Banza, conseguiu-se “um compromisso com a solidariedade entre as gerações, e na solidariedade entre os povos e as regiões do mundo”.

Aquilo que durante algum tempo foi visto como um problema – a separação dos temas ambientais -, agora começa a mostrar resultados, sublinha ainda o presidente do ICNF. “Como estava compartimentado, conseguimos desenvolver mais essas diferentes componentes”, reforça. “Mais à frente, encontramo-nos outra vez. Agora conseguimos juntá-las e elas fazem sentido.”

O ICNF tem neste momento em curso a revisão da Estratégia Nacional de Conservação da Natureza (ENCN) para fazer a ligação não apenas com o compromisso de Kunming-Montreal, mas com o compromisso “sucessivamente reafirmado” nas COP do Clima sobre a importância da biodiversidade.

Nuno Banza sublinha que a discussão sobre as florestas não deve limitar-se a considerá-las “fábricas de carbono”, ou sumidouros, mas ligar a floresta – “como é a abordagem da CBD” – à biodiversidade e aos valores naturais, incluindo o carbono do solo e os serviços dos ecossistemas.

Só faz sentido discutir estas dimensões, afirma Banza, “quando estamos a falar em conjunto” das questões climáticas e dos valores da biodiversidade.