O grupo que foi visado em maio pela Polícia Judiciá­ria (PJ) na sequência da Operação Gambérria empregava um sofisticado sistema informático para legalizar de forma fraudulenta milhares de imigrantes em situação ilegal, cobrando-lhes vários milhares de euros e deixando-os endividados.

Segundo adianta o semanário Expresso, esta rede cobrava entre 15 mil e 20 mil euros por um “pack de legalização” a imigrantes que viessem do Nepal ou do Bangladesh. A sua compra garantia assim contratos de trabalho, número de identificação fiscal (NIF), número de identificação de Segurança Social (NISS), número nacional de utente do SNS (Serviço Nacional de Saúde) e Cartão Europeu de Saúde, entre outras benesses com a abertura de contas bancárias.

Estes valores cobrados a cidadãos oriundos destes países orientais divergiam daqueles praticados junto de imigrantes do Brasil ou de países africanos, a quem era cobrado muito menos dinheiro. Em causa, adiantou a PJ ao jornal, estavam “riscos migratórios associados a alguns países, sendo mais difícil um cidadão do Nepal conseguir um visto de turismo do que um brasileiro, para além da distância e das barreiras culturais”.

A PJ suspeita que o grupo, que incluía empresários, advogados e contabilistas, começava por aliciar imigrantes nos seus países natais, a quem cobravam valores avultados para convencê-los a vir para Portugal. Chegando a Portugal, não tinham grande hipótese senão pagarem por esse “pack”, ficando de tal forma endividados que tinham de pagar aos angariadores através dos salários que recebiam pelo seu trabalho.

A mesma notícia do Expresso dá conta de que a PJ descobriu na casa do líder deste grupo — além de uma arma, coletes à prova de bala e detetores de metais —, um nível de aparato tecnológico cuja sofisticação possibilitava um esquema criminoso desta magnitude.

Recorde-se que este grupo foi desmantelado em maio na sequência de uma operação da Diretoria do Centro da PJ, tendo sido detidas 13 pessoas, sete homens e seis mulheres, entre os quais sete empresários, uma advogada e uma funcionária da Direção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Desde então, outras três foram detidas: um homem estrangeiro de 37 anos no início de outubro e duas funcionárias de uma Unidade de Saúde Familiar de Cortegaça, em Ovar, esta quarta-feira, ambas suspeitas de ter inscrito 10 mil imigrantes no SNS ao conceder-lhes números nacionais de utente fraudulentos. Ambas saíram em liberdade, sujeitas a medidas de coação, pendendo sobre si a acusação de crimes de corrupção passiva, associação de auxílio à imigração ilegal e falsidade informática.

Funcionárias de USF de Cortegaça detidas por suspeita de inscrição fraudulenta de 10 mil imigrantes no SNS saem em liberdade

Neste momento, as autoridades estão a tentar apurar qual o número total de imigrantes que este grupo terá ajudado a regularizar e quanto dinheiro conseguiu angariar neste processo fraudulento. Por exemplo, uma célula do grupo a operar a partir de Coimbra terá conseguido legalizar 18 mil imigrantes através da atribuição fraudulenta de NIF ao longo de três anos. No entanto, falta cruzar esse número com o dos 10 mil a quem foi atribuído o NNU pelas funcionárias para compreender são em parte o mesmo processo ou não.

Quanto ao dinheiro, nas buscas entretanto efetuadas durante as diferentes fases da Operação Gambérria, a PJ já apreendeu mais de um milhão de euros em dinheiro, tendo também sido congeladas dezenas de contas bancárias. Uma fonte da PJ ligada ao processo disse ao Expresso que se estima este grupo tenha lucrado “muitas dezenas de milhões de euros” com este esquema.