Um estudo da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) aponta que 54% dos brasileiros nunca foram ao dermatologista e que um em cada quatro inclusive desconhece que a dermatologia é uma especialidade médica.

Uma boa parcela dos brasileiros não sabe que dermatologista é médico Foto: LIGHTFIELD STUDIOS/Adobe Stock

O levantamento também mostrou que a renda é o principal preditor de acesso ao especialista, revelando disparidades importantes. Enquanto 69% e 66% das pessoas das classes A e B já consultaram um dermatologista, os percentuais caem para 46% e 32% nas classes C e D, respectivamente.

Além disso, o estudo evidencia uma desigualdade racial no acesso: 58% das pessoas brancas já foram ao dermatologista ao menos uma vez, ante 41% das pessoas negras. No último ano, somente 12% dos brasileiros passaram por consulta com um dermatologista, segundo o levantamento.

Para o dermatologista e presidente da SBD, Carlos Barcaui, esses dados são inaceitáveis e revelam um ponto crítico da saúde pública brasileira: a pele ainda não é tratada como parte essencial da saúde integral.

Segundo Barcaui, o fato de mais da metade dos brasileiros nunca ter tido acesso ao dermatologista resulta de uma combinação de fatores estruturais, da distribuição desigual de profissionais e de barreiras socioeconômicas. Ele explica que, embora o País tenha um número expressivo de especialistas, a maioria está concentrada nas capitais e regiões mais desenvolvidas, o que cria vazios assistenciais em áreas periféricas e no interior.

O especialista destaca ainda obstáculos socioeconômicos e culturais. Parte da população desconhece cuidados básicos com a saúde da pele, diz. Esse acesso limitado pode atrasar o diagnóstico de condições graves, como o câncer de pele, especialmente o melanoma. Barcaui ressalta que, quando o quadro é identificado no início, o tratamento tende a ser simples e mais efetivo.

Apesar de a acne ser uma das principais queixas em consultórios e de afetar majoritariamente jovens, essa população também busca menos o atendimento especializado. Entre pessoas de 16 a 24 anos, 70% nunca tiveram consulta dermatológica, mesmo sendo o grupo mais impactado tanto pela condição quanto por suas consequências emocionais.

Para o presidente da SBD, essa baixa procura pode estar relacionada à banalização da acne. Ele acrescenta que muitos jovens buscam soluções rápidas e recorrem primeiro às redes sociais e influenciadores, o que, em alguns casos, pode piorar o quadro.

A autoestima aparece como o principal motivo para jovens procurarem o dermatologista (23%), enquanto a prevenção de doenças ganha relevância entre faixas etárias mais elevadas, reflexo de uma maior atenção aos sinais de adoecimento em uma fase mais avançada da vida, segundo o especialista.

Outro dado relevante mostra que 86% dos entrevistados reconhecem que problemas dermatológicos devem ser tratados por um especialista, embora 43% raramente observem pele, cabelos e unhas em busca de sinais de doenças. O levantamento estima que cerca de 11,5 milhões de brasileiros tenham diagnóstico de alguma doença crônica da pele, como vitiligo ou psoríase.

A pesquisa também aponta disparidades de gênero porque, entre os homens, apenas 37% já passaram por uma consulta dermatológica, contra 55% das mulheres.

Para a SBD, os resultados reforçam a necessidade de ampliar o acesso à informação científica confiável e de fortalecer o papel do dermatologista na saúde pública, especialmente em um cenário em que mais da metade da população nunca teve atendimento na especialidade.

Em termos de políticas públicas, Barcaui defende a ampliação da presença de dermatologistas no Sistema Único de Saúde (SUS), com aumento dos postos de trabalho e melhoria dos fluxos de atendimento.

O estudo foi conduzido em 136 municípios de todas as regiões brasileiras pelo Instituto Datafolha a pedido da SBD e da divisão de Beleza Dermatológica do Grupo L’Oréal.

Crise da estética

O levantamento aponta que 19% dos entrevistados não souberam indicar nenhum profissional de referência para cuidados com a pele. O dado reforça o cenário de desinformação identificado pelo estudo, especialmente em um momento em que cresce o interesse por procedimentos estéticos invasivos com injetáveis, laser e tecnologias de alta energia.

Diante desse avanço, Barcaui ressalta a necessidade de formação médica adequada e afirma que apenas o profissional com formação integral está preparado para diagnosticar, indicar e manejar possíveis complicações. Segundo ele, muitos dos riscos associados a esses procedimentos decorrem justamente da atuação de pessoas sem qualificação técnica.

Infecções, necrose tecidual, aumento da resposta inflamatória e casos graves como queimaduras e comprometimento da visão pela falta de experiência ou uso inadequado de injetores e lasers estão entre as principais complicações observadas quando o procedimento não é realizado por um especialista, de acordo com Barcaui.

O local onde os procedimentos são realizados também exige atenção. Clínicas sem responsável técnico, salões de beleza e spas são apontados pelo especialista como ambientes inseguros para qualquer procedimento estético invasivo.