Confira o trailer de ‘Jay Kelly’
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‘Jay Kelly’ estreia em 5 de dezembro na Netflix. Crédito: Netflix Brasil via YouTube/Reprodução
Ao longo de sua brilhante carreira, George Clooney interpretou um ladrão de cassino, um Batman, um condenado de uma cadeia de trabalho, um assassino e um ‘demitidor’ profissional. Agora, ele está indo além, interpretando um astro de cinema absolutamente encantador e deslumbrante. Brincadeira! Realidade e ficção se entrelaçam lindamente em Jay Kelly, a carta de amor de Noah Baumbach para Hollywood que, nas mãos de outro, poderia facilmente ter se tornado apenas uma carta de amor para Clooney.
O roteiro de Baumbach e Emily Mortimer mostra Clooney — desculpe, Jay Kelly — em uma espécie de crise de meia-idade. Aos 60 anos, ele é um galã de cinema universalmente amado e profundamente sincero que trabalhou duro para chegar ao topo e encontrou, bem, artificialidade.
“Minha vida não parece realmente real”, ele diz em um momento, um ator treinado em fingir meta-interpretando um ator treinado em fingir. Em outra cena ele reflete: “Todas as minhas memórias são filmes.”
Um encontro casual com um antigo parceiro de atuação — um brilhante Billy Crudup, cujo personagem foi traído por Kelly anos atrás — revela algumas verdades desagradáveis. “Existe uma pessoa aí dentro? Talvez você na verdade não exista”, ele pergunta ao astro, enviando Kelly em uma jornada de autodescoberta que por acaso o leva a um dos lugares favoritos de Clooney, a Itália.
A cuidadosa fachada de Kelly — as histórias que ele conta sobre si mesmo — logo começa a se desfazer. Em sua subida pelas colinas de Hollywood, ele aparentemente deixou um rastro pessoal de destruição. Jay Kelly é sobre aqueles que se sacrificaram para colocá-lo lá.
George Clooney em cena de ‘Jay Kelly’; ator está cotado ao Oscar por seu trabalho no filme Foto: Peter Mountain/Netflix/Divulgação
Adam Sandler e Laura Dern interpretam, respectivamente, o empesário e a relações-públicas de longa data de Kelly, enquanto suas filhas adultas ressentidas são representadas por Grace Edwards e Riley Keough. Aprendemos que Kelly colocava a carreira em primeiro lugar e isso significava se afastar de coisas como as apresentações escolares de suas filhas e fazer com que sua equipe perdesse coisas – como as apresentações escolares de suas filhas. “Ele não é nossa família ou nosso amigo”, a personagem de Dern grita em desespero. “Não somos para ele o que ele é para nós.”
Você esperaria que Clooney não precisasse sair da segunda marcha para isso, mas ele entrega uma atuação cheia de alma, encantadora o suficiente para que seu Kelly seduza um trem cheio de estranhos na Itália com seu carisma à moda antiga e ainda se irrite quando sua filha mais velha o faz confrontar seus problemas de abandono.
“Você sabe como eu soube que você não queria passar tempo comigo?”, sua filha pergunta, antes de responder em uma linha que atinge qualquer pai como um soco no estômago: “Porque você não passou tempo comigo.” Outra frase impactante: “Eu queria que você fosse o homem que eu pensei que você fosse.”
Sendo um filme sobre um astro de cinema, Baumbach e Mortimer naturalmente cercam seu herói com referências a filmes clássicos, de Alfred Hitchcock a Federico Fellini, cujas visuais se tornam um ponto de referência, como a visão de um padre lambendo dois sorvetes. Há piadas sobre o método de atuação e ser um embaixador da Dior, mas, no final, trata-se de mortalidade e escolhas de vida, com uma cena terminando, um tanto quanto explicitamente, em um cemitério.
Em Jay Kelly, o astro de cinema homônimo (George Clooney, à direita) confronta suas escolhas de vida; na imagem, ele aparece com seu empresário, vivido por Adam Sandler (à esquerda) Foto: Peter Mountain/Netflix/Divulgação
Kelly se dissolve em vinhetas passadas, como assistir à sua primeira audição dramática e a momentos de alegria com seus filhos. Busca o surreal em uma floresta nebulosa e encontra redenção, claro, em um cinema. Uma montagem retrospectiva usa papéis reais de Clooney como Academia de Combate (1986) e Amor Sem Escalas (2009), borrando ainda mais a linha entre realidade e ficção.
Clooney coloca seu ego em jogo aqui, até mesmo zombando de sua vibe heroica quando persegue um ladrão de bolsas, ecoando seus papéis de ação. Até isso se mostra menos que heroico. Surge uma toque desagradável e egocêntrico de Jay Gatsby nele, aludido pelo seu primeiro nome e o nome de uma de suas filhas, Daisy. Vemos sua falta de noção de perto quando ele realmente não escuta seus assistentes ou descarta sem pensar um lenço de presente do filho de um colega falecido. Ele revela sua vaidade ao tentar esconder sua idade com um lápis preto em suas sobrancelhas.
O filme poderia ter sido mais duro com as estrelas egocêntricas que muitas vezes idolatramos? Claro. Mas o que o torna poderoso não é o drama de Hollywood. Este é um filme para qualquer um de nós que perdeu uma apresentação escolar dos filhos, pediu a um assistente para trabalhar até tarde ou pulou um jantar em família porque um cliente estava atrasado. É sobre tempo. É sobre onde escolhemos gastar nosso tempo. Primeira parada: Jay Kelly.