Cuba enfrenta uma epidemia de arboviroses que, até o momento, já afetou mais de um terço da população, com doenças como dengue, chikungunya e o vírus Oropouche nos últimos meses. De acordo com informações divulgadas nesta quarta-feira (19) pelas autoridades sanitárias do país, mais de 47.100 pessoas seguem internadas em decorrência dessas enfermidades.
Diante da gravidade da situação, as autoridades começaram a implementar um protocolo de ação semelhante ao utilizado durante a pandemia de COVID-19. Diariamente, o diretor nacional de Epidemiologia do Ministério da Saúde Pública atualiza, nos meios de comunicação, a curva de contágio no país e a ocupação hospitalar.
Também foi ativado um comitê científico formado por equipes multidisciplinares para aplicar e monitorar as medidas sanitárias, além de pesquisar e testar tratamentos. A população foi dividida em faixas etárias para uma eventual aplicação de vacinas ou medicamentos.
Em uma recente intervenção televisiva de caráter urgente, o diretor nacional de Epidemiologia, Francisco Durán, classificou a situação como “uma epidemia” e detalhou que, segundo projeções do Ministério da Saúde Pública (Minsap), mais de 30% da população cubana foi exposta a algum tipo de arbovirose — número que pode ser ainda maior devido aos casos de pessoas que não procuram atendimento médico. Durán afirmou que este é o “principal problema de saúde” da ilha.
Os contágios se espalharam por praticamente todo o país. Treze das quinze províncias apresentam atualmente “alta concentração de dengue”, segundo o Minsap. Havana, Matanzas e Cienfuegos são as províncias com o maior número de casos e maior risco de contágio.
A quantidade de casos de chikungunya e do vírus Oropouche faz com que Cuba seja o país com mais registros por 100 mil habitantes em todo o continente, segundo dados da Organização Pan-Americana da Saúde.
A complexidade da situação é agravada pela grave crise econômica que o país enfrenta, o que limita seriamente sua capacidade de resposta. Isso se tornou ainda pior após a passagem do furacão Melissa, no final de outubro, que destruiu mais de 90 mil casas e cerca de 100 mil hectares de plantações. Nesse cenário, as enchentes — que ainda persistem no leste do país — e a destruição de prédios facilitam a proliferação de mosquitos e dificultam o controle sanitário.
O primeiro surto ocorreu em julho passado, na província de Matanzas, no oeste da ilha. Desde então, expandiu-se por praticamente todo o território.
As autoridades sanitárias informaram que os equipamentos usados nas campanhas de fumacê estão em “estado de deterioração”, o que tem dificultado as ações de prevenção. Segundo explicaram, a maioria desses equipamentos não pôde ser importada, ou enfrentou dificuldades para isso, devido ao bloqueio imposto pelos Estados Unidos.
Apesar disso, o Estado cubano anunciou diferentes estratégias para conter a expansão das doenças. O governo comunicou o início da produção nacional de um repelente natural feito à base de extratos de nim e capim-limão. Paralelamente, a população foi mobilizada por meio das chamadas organizações de massa — sindicatos, entidades estudantis, juvenis e comunitárias — para realizar mutirões de coleta de lixo e operações de fumacê, com o objetivo de reduzir os criadouros de mosquitos nos bairros mais afetados.
O que são arboviroses?
Arboviroses é o termo usado para “vírus transmitidos por artrópodes”. Trata-se de um conjunto de doenças infecciosas causadas principalmente pela picada de mosquitos infectados. Algumas delas incluem dengue, chikungunya, zika e febre amarela. São enfermidades que apresentam sintomas muito semelhantes — como febre, dor de cabeça e dores articulares e musculares —, o que frequentemente dificulta o diagnóstico diferencial.
Devido ao calor e às chuvas, os climas tropicais e subtropicais favorecem a expansão dos mosquitos transmissores. Nos últimos anos, as mudanças climáticas têm se consolidado como um “motor de expansão” crítico para essas doenças. O aumento das temperaturas médias permite que os vetores, especialmente o Aedes aegypti, sobrevivam e formem colônias em épocas ou regiões antes hostis por causa do frio.
Ao mesmo tempo, o calor acelera o ciclo reprodutivo do mosquito e encurta o período de incubação extrínseco (PIE) do vírus dentro do inseto. Isso significa que o mosquito adquire o vírus e se torna infeccioso em menos tempo, aumentando sua capacidade de transmissão e ampliando a janela anual de circulação.
Fenômenos climáticos extremos — como furacões, cada vez mais frequentes — também geram enchentes e destruição que favorecem a expansão desses mosquitos e, consequentemente, das doenças.
A disseminação dessas enfermidades na América Latina e no Caribe é um desafio persistente. No final de agosto deste ano, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) emitiu um alerta epidemiológico sobre surtos localizados de chikungunya e a circulação sustentada do vírus Oropouche em vários países das Américas. A entidade destacou que a circulação simultânea de múltiplas arboviroses — fenômeno conhecido como cocirculação — aumenta significativamente o risco de complicações e mortalidade, especialmente entre crianças, idosos e pessoas com comorbidades.