O sector da construção em Portugal vive um clima de grande incerteza, impulsionado por dúvidas sobre a aplicação do IVA, o que já está a travar projectos e investimentos. Empresários e promotores alertam que, na ausência de regras claras, muitos empreendimentos ficam “em suspenso”, gerando prudência no mercado e risco de paralisia.

 

«Enquanto não houver regras claras, muitos projectos estão em suspenso. Ninguém quer avançar e correr o risco de problemas fiscais futuros», afirma Pedro Castro, head de Operações e Crédito Habitação no ComparaJá, reflectindo a inquietação de construtoras que dependem de previsibilidade para planeamento financeiro e licenciamento.

No quadro do Orçamento do Estado para 2026 (OE 2026), o Governo prevê uma redução do IVA na construção para 6%, especialmente direccionada à habitação de preços controlados, como parte de uma estratégia para aumentar a oferta de imóveis acessíveis. A proposta contempla casas para venda até 648 mil euros e alojamentos para arrendamento com renda até 2300 euros por mês, limites definidos para estimular promotores e investidores. Para além do IVA reduzido, incluem-se também incentivos fiscais em IRS, IMI e IMT para projectos enquadrados nesta modalidade.

O ministro das Infraestruturas e Habitação, Miguel Pinto Luz, disse acreditar que a taxa de 6% esteja em vigor até ao primeiro trimestre de 2026, após a aprovação das propostas orçamentais. No entanto, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, advertiu que o “grande efeito” desta redução só será sentido a partir de 2027, em parte porque existe um desfasamento entre a aprovação dos projectos nas câmaras municipais e o início das obras. Segundo Sarmento, os projectos sujeitos à taxa de 6% serão aqueles novos que entrarem nas câmaras após a entrada em vigor desta medida.

Este novo regime fiscal, que integra o programa “Construir Portugal – Arrendamento e Simplificação”, visa ser uma “política de choque” para dinamizar a habitação acessível, segundo o primeiro-ministro Luís Montenegro. Os benefícios para os investidores vão além do IVA: para senhorios que pratiquem rendas moderadas, o IRS sobre esses rendimentos poderá descer de 25% para 10%, há isenção de IMI nos primeiros oito anos, e os fundos de investimento terão tributação reduzida sobre os rendimentos distribuídos.  Por outro lado, há também previsão de isenção ou adiamento de mais-valias para quem venda imóveis e reinvista num projecto de arrendamento acessível.

Apesar das promessas, o sector permanece cauteloso. A expectativa de que o IVA de 6% só se traduza em efeito real a partir de 2027 agrava a falta de urgência nos investimentos a curto prazo. Para muitas construtoras, a desconfiança reside no fato de que os custos ainda possam não baixar imediatamente, e há dúvidas sobre se todos os projectos serão efectivamente elegíveis para a taxa reduzida, dado o teto de preços definido. Além disso, parte do setor teme que os lucros gerados com a redução acabem por não ser repassados ao consumidor final, diminuindo o impacto na acessibilidade da habitação.

Se o Governo não conseguir clarificar rapidamente os critérios de elegibilidade, os requisitos exatos, e garantir estabilidade jurídica para os promotores, muitos projectos poderão continuar bloqueados. A indefinição fiscal, alertam os empresários, pode comprometer não só a construção de novas habitações, mas também a meta de combater a crise habitacional em Portugal através de uma política habitacional mais ambiciosa.