O Governo de Benjamin Netanyahu aprovou, esta segunda-feira, o afastamento da procuradora-geral, Gali Baharav-Miara, numa acção que o diário israelita Times of Israel considerou “um terramoto” para o sistema de Governo de Israel.
Ainda que a decisão não tenha efeito imediato, já que ainda será sujeita a revisão pelo Supremo Tribunal, vários ministros anunciaram já que, na sequência da votação, irão ignorar a procuradora-geral, não a convidando para reuniões de Governo nem seguindo as suas orientações legais, diz o diário Jerusalem Post.
O jornal norte-americano The Washington Post comenta que esta acção é uma das mais significativas do executivo de Benjamin Netanyahu no seu esforço para alterar a relação de poderes entre o executivo e o judicial (o que os críticos do Governo chamam o “golpe judicial”), tendo o potencial de provocar uma crise constitucional.
Ainda antes da votação, centenas de pessoas juntaram-se perto da residência oficial do primeiro-ministro, em Jerusalém, para protestar contra a decisão que já se previa.
Numa carta enviada aos ministros, Baharav-Miara escreveu que o Governo está, na prática, a afastar a maior figura da acusação no julgamento do primeiro-ministro, a responder em tribunal por corrupção, “através de novas regras feitas para assegurar o resultado desejado”.
Baharav-Miara alertou que, “a partir de agora, o Governo poderá demitir qualquer procurador-geral — o principal procurador do Estado — sem quaisquer mecanismos de supervisão e mesmo por motivos indevidos”, dando como exemplos “alertar contra acções ilegais, ordenar uma investigação a um ministro, recusar-se a suspender um processo criminal contra um membro do Governo”.
Isto é, acrescentou, citada pelo Haaretz, “profundamente preocupante em geral, e especialmente porque a demissão do procurador-geral e a nomeação de um substituto podem influenciar o julgamento criminal do primeiro-ministro e as investigações em curso envolvendo outros ministros e associados”.
O processo actual para o afastamento da procuradora-geral obrigaria a uma opinião da comissão profissional que recomendou a sua nomeação. Os mandatos de dois dos representantes dessa comissão expiraram e, na impossibilidade de encontrar substitutos que apoiassem a demissão da procuradora-geral, o Governo simplesmente criou outra comissão para gerir o caso, explica o Haaretz.
Na reunião que antecedeu a votação, a procuradora foi acusada por Netanyahu de “normalizar incitamento e ameaças de morte” contra si. No mês passado, uma activista foi detida por alegadamente ter um plano para assassinar Netanyahu.
O primeiro-ministro está a responder actualmente a acusações que incluem corrupção, mas apesar disso não se demitiu. A lei israelita não permite que ministros se mantenham no cargo após acusações desta gravidade, com a excepção do primeiro-ministro. Quando foi formalmente acusado, Netanyahu teve de deixar as pastas que tutelava, e manter apenas a chefia do Governo.
Os seus críticos acusam-no de prolongar indefinidamente a guerra em Gaza por razões políticas, incluindo o facto de estar a responder em tribunal.
A procuradora-geral tem dado opiniões contra várias acções do Governo incluindo, recentemente, o afastamento do chefe da secreta interna (Shin Bet), Ronen Bar, ou a tentativa de aprovar uma excepção para o serviço militar dos ultra-ortodoxos, numa questão que tem ameaçado a coligação de Netanyahu (ainda esta segunda-feira, foi afastado o responsável pela lei que regula o fim da excepção).
A procuradora-geral já declarou antes, numa opinião legal, que Netanyahu se devia abster de levar a cabo quaisquer interferências ou mudanças no sistema judicial, já que o seu processo o põe numa situação de conflito de interesses.