A indústria automóvel está a passar por uma “transformação darwiniana” e poderá vir a ser afectada por uma onda de despedimentos, sobretudo na Europa. O alerta, um dos vários que têm sido feitos pelos representantes deste sector nos últimos meses, é agora deixado por Christophe Périllat, presidente da Valeo, uma das maiores fornecedoras europeias de componentes para o sector automóvel, que considera que a Comissão Europeia deve avançar com medidas para proteger o sector da concorrência que este enfrenta da parte da China.
O responsável falou ao Financial Times e afirmo que a actividade neste sector exige “uma optimização e adaptação permanentes”. A empresa que lidera, admite, ainda deverá vir a fazer mais reestruturações nos próximos tempos, depois de já ter fechado 38 fábricas entre 2022 e 2025, período durante o qual abriu apenas quatro.
Fundada em França, a Valeo está presente em mais de 150 países, incluindo Portugal. Esta não é a primeira vez que o presidente deste grupo francês deixa alertas sobre as dificuldades que o sector atravessa, numa altura em que as principais marcas europeias têm sido afectadas pelas concorrentes chinesas, que produzem carros mais baratos e que têm visto as vendas a crescer a ritmo acelerado, embora ainda representem uma fatia pouco significativa do mercado.
Em Setembro, Christophe Périllat já tinha afirmado que a indústria automóvel europeia enfrenta três grandes desafios: a transformação tecnológica, a diminuição dos volumes de produção na Europa e a concorrência chinesa. Na altura, defendeu que a União Europeia introduzisse uma quota mínima de componentes automóveis fabricadas na Europa para os automóveis produzidos na região, de forma a “proteger a concorrência justa”.
É neste contexto que o responsável considera ser necessário “ressuscitar” o mercado. “Não podemos deixar a indústria automóvel europeia afundar-se e acredito que é possível mudar as coisas”, disse ao Financial Times.
Para já, a Comissão Europeia prepara-se para anunciar, em Dezembro, a criação de uma nova categoria de carros eléctricos de pequenas dimensões e a preços acessíveis, numa tentativa de fazer face à concorrência chinesa. De acordo com a Reuters, estes veículos deverão enquadrar-se, em termos regulatórios, entre os quadriciclos e os automóveis ligeiros de passageiros, ficando dispensados da obrigatoriedade de alguns equipamentos tecnológicos e de segurança, o que permitirá uma produção mais barata e, consequentemente, preços de venda finais mais baixos.
A Christophe Périllat, juntam-se outras vozes do sector, que também têm vindo a alertar para um cenário de despedimentos nesta indústria. Recentemente, a associação europeia que representa os fornecedores de componentes automóveis (CLEPA, na sigla original) divulgou os resultados de um estudo encomendado à consultora Roland Berger, que concluía que, sem um plano de acção “urgente” da União Europeia, o sector automóvel europeu poderá perder até 350 mil empregos até 2030.
“A Europa está numa batalha decisiva pela sua soberania industrial. Os fornecedores estão comprometidos com o investimento e a inovação, mas não podem fazer isso em condições de concorrência desiguais. Manter um ecossistema automóvel competitivo e resiliente na União Europeia requer acções urgentes por parte da indústria e políticas direccionadas, de forma a fortalecer a atractividade da Europa enquanto localização para produção, pesquisa e desenvolvimento e investimento. Isto inclui tratar de questões chave como os preços da electricidade ou o peso da regulação, para além da necessidade de se considerarem políticas que garantam que há componentes automóveis europeias nos veículos”, disse o presidente da CLEPA, Benjamin Krieger, aquando da apresentação do estudo.