A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) emitiu oficialmente a sua decisão favorável condicionada sobre o projecto de execução da futura Estação de Dessalinização de Água do Mar do Algarve, uma infra-estrutura que estará a cargo da Águas do Algarve e ficará localizada na Quinta da Ponte, na zona de Albufeira e Olhos de Água.
A luz verde condicionada da APA tinha sido anunciada pela ministra do Ambiente e Energia Maria da Graça Carvalho no início de Novembro, no Parlamento, durante o debate na especialidade sobre o Orçamento do Estado para 2026. Na altura, a ministra afirmava que a promotora do projecto “pode arrancar com a obra já amanhã” – mas sabe-se agora que não será bem assim.
Apesar da aprovação, a APA impõe um conjunto de medidas de mitigação e monitorização que terão de ser rigorosamente cumpridas. Estas exigências abrangem todas as fases da obra, desde a pré-construção até à operação e futura desactivação, impondo limites estritos, por exemplo, para as emissões sonoras e regras apertadas para a gestão de resíduos no local.
O projecto final, que agora recebe a decisão de conformidade ambiental condicionada, trazia ajustes técnicos importantes face ao Estudo de Impacto Ambiental (EIA) resultantes da análise da Comissão de Avaliação. Uma das principais alterações prende-se com a substituição da perfuração horizontal pela microtunelagem para a instalação das condutas de água e salmoura no troço costeiro. Esta mudança visa reduzir riscos técnicos e evitar impactos ambientais no meio marinho, como a libertação de bentonites (argilas).
Outra modificação no desenho da infra-estrutura considerada relevante foi o recuo da câmara de desgaseificação em cerca de 50 metros para norte, afastando-a da linha de costa. Esta alteração permitiu optimizar o projecto e eliminar a necessidade de abate de árvores de grande porte existentes na zona de intervenção.
APA confirma preocupações
O processo de Avaliação de Impacte Ambiental da dessalinizadora do Algarve tem sido alvo de grande contestação. Em Julho, a consulta pública sobre o RECAPE chegou a ser suspensa devido a uma providência cautelar, entretanto indeferida. A APA recebeu um total de 45 exposições durante o período da consulta pública, com várias associações ambientalistas a oporem-se ao avanço da obra.
“As mais de uma centena de exigências adicionais agora impostas são a prova de que o projecto, tal como apresentado, não oferecia todas as garantias ambientais”, afirma Sara Correia, analista de políticas públicas na área dos recursos hídricos da associação Zero, numa resposta ao Azul. “A decisão da APA confirma algumas das situações que a Zero identificou no seu parecer e às quais o RECAPE não respondia de forma satisfatória.”
Para a Zero, esta luz verde condicionada “confirma algumas das preocupações” que têm vindo a assinalar. A associação ambientalista garante que vai continuar a “acompanhar o processo de perto, garantindo que todas as exigências impostas pela APA são cumpridas”. “Continuamos a considerar que a EDAM do Algarve, tal como definida, apresenta riscos ambientais elevados, custos socioeconómicos insuficientemente avaliados e representa uma opção menos eficaz do que medidas de eficiência hídrica estrutural”, conclui Sara Correia.
Ajustes ao projecto
A resposta da APA ao Relatório de Conformidade Ambiental do Projecto de Execução (RECAPE), que esteve em consulta pública no Verão, oficializa o Título Único Ambiental e vem complementar a Declaração de Impacte Ambiental que tinha sido emitida em Abril de 2024. A aprovação tem validade até 24 de Novembro de 2029, o que significa que as obras terão de arrancar obrigatoriamente num prazo máximo de quatro anos, sob pena de o licenciamento caducar.
A construção da dessalinizadora, que deverá estar concluída até ao final de 2026, representa um investimento de cerca de 108 milhões de euros, enquadrado pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
A obra, que integra o Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve, será levada a cabo pelo Agrupamento Complementar de Empresas (ACE), formado pelas empresas portuguesas Luságua e Aquapor e a espanhola GS Inima Environment.
Contestação
Entidades como a Zero, a Almargem e a Seacliff, proprietária dos terrenos em Albufeira, pronunciaram-se desfavoravelmente em sede de consulta pública, alertando para potenciais impactos negativos na biodiversidade, na paisagem e nas actividades económicas locais, como a pesca e a agricultura.
O próprio Turismo de Portugal, apesar de reconhecer a importância estratégica da dessalinizadora para a resiliência hídrica da região, manifestou preocupação com o traçado das condutas e com o seu efeito na actividade turística.
Também o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) identificou omissões relevantes no dossier apresentado, segundo o relatório da consulta pública. O organismo técnico alertou para o facto de a zona de descarga estar prevista para uma área classificada como zona de produção de bivalves, o que levanta questões de conformidade legal que o promotor terá agora de acautelar através dos programas de monitorização exigidos.